E depois de narrar vários factos sucedidos nesta vã procura de habitação para quem pretender constituir família e não encontro "fogo" economicamente compatível com o seu magro orçamento, pergunta-me - e infelizmente não consigo encontrar resposta válida - "como é que eu posso pagar 1 500$ por uma casa se eu só ganho 70$ por dia [...]; isto é muito triste, um senhorio levar-me 80 por cento do nosso ordenado". Há algo de errado nisto tudo.

E termina: "Era bom V. Ex.ª pedir na Assembleia Nacional que pedisse ao nosso Governo para que não descurasse este problema, que é muito grave."

É-o, na realidade, grave, em face do que para aí se vê em termos de rendas pedidas pelas novas habitações ou pelas antigas vagadas.

Toda a família precisa de lar, toda a casa assenta seus pés na terra.

Do desequilíbrio entre a oferta e a procura de habitações surge o compreensível encarecimento dos terrenos, a especulação com a apropriação da terra, o desvio de poupanças de uma aplicação directamente reprodutiva para imobilização ou entesouramento em terrenos urbanizados ou supostamente urbanizáveis no futuro, a falta de disponibilidade de solo para intervenções dos sectores público e privado, o aproveitamento de zonas impróprias ou excessivamente afastadas, a sobreocupação por excesso de aproveitamento do solo disponível, a redução da superfície das habitações sem condições para a instalação das famílias médias, a não previsão de infra-estruturas urbanísticas e equipamentos sociais ou a sua desordenada implantação, o encarecimento constante dos rendas nas zonas periféricas ou das novas construções citadinas, a sublocação e os "bairros de lata" - apenas alguns dos males que decorrem deste desajustamento entre a oferta e a procura de habitações.

Em termos de custo de vida, a habitação é dos encargos que mais têm vindo a sobrecarregar os orçamentos familiares, as despesas domésticas.

Segundo o Anuário Estatístico de 1969, os "índices de preços no consumidor" registaram para a habitação em várias cidades do continente os seguintes valores:

índices de preços no consumidor

[... ver tabela na imagem]

A taxa (não acumulada) de progressão oscila normalmente entre 5,5 e 9 por cento ao ano, registando Faro, com a descoberta turística do Algarve, uma taxa da ordem dos 15,8 por cento. Mais do que duplicaram as rendas de habitação em Faro em apenas sete anos.

Ela contribui, mais do que qualquer outra, para o processo inflacionista em curso em Portugal.

A administração pública não podia ficar insensível e desarmada face a este surgimento de problemas e à expansão espectacular das populações urbanas e arrabaldinas e das suas exigências habitacionais.

As questões residenciais de hoje são de algum modo diversas, ou ganharam invulgar amplitude e gravidade para poderem ser resolvidas pelos meios de intervenção tradicionais.

A isso procura obviar a publicação do Decreto-Lei n.º 576/70, de 24 de Novembro último, que, como mandatário da população do distrito de Lisboa, me apraz reconhecer e sublinhar.

Bem haja o Governo pela sua iniciativa, e que da definição de "uma política dos solos tendente a diminuir o custo dos terrenos" possa resultar a melhoria das condições de habitação da população portuguesa.

Mas importa que, para além de uma "política de solo tendente a diminuir o custo dos terrenos", se prossiga a política de valorização de toda a terra portuguesa e intensifique uma "política de construção de habitações" capaz de responder as necessidades e aspirações da população.

Só assim se dará conteúdo AO consenso geral de que "a família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito u protecção da sociedade e do Estado" (n.º 3 do artigo 16.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem) e de que "toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para a garantia ida saúde e do seu bem-estar e da respectiva família", nele se compreendendo, nomeadamente, a habitação (n.º l do artigo 2õ.º da mesma Declaração).

Também por essa forma "o Estado (Português) assegura(ria) a constituição e defesa do- família, como fonte de conservação e desenvolvimento do povo português, como base primaria da educação, da disciplina e harmonia social e como fundamento da ordem política e administrativa [...]" (artigo 12.º da Constituição Política da República Portuguesa).

Formula-se, pois, o desejo de que o Fundo de Fomento da Habitação, a Direcção-Geral das Previdência e Habitações Económicas, a Federação das Caixas de Previdência, no que respeita às mesmas habitações, a Fundação Salazar, que ora inicia suas sinais actividades, e todos os demais entes públicos e privados com interferência na matéria se dêem as mãos e juntos se tornem promotores dêem soluções para este magno problema da sociedade portuguesa: o direito à habitação.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos passar à

Continuação da discussão na especialidade e votação da proposta, de lei de protecção ao cinema nacional.