concelhos do distrito. For seu lado, a Junta Central das Casas dos Pescadores, animada de bom espírito de colaboração, criou o lugar de médico privativo da Casa dos Pescadores do Corvo, a preencher, cumulativamente, pelo delegado de Saúde.

Os atractivos representados por tais medidas revelaram-se, todavia, ineficazes: o Corvo continua sem médico desde há muitos anos, como disse.

Será necessário, portanto, descobrir outras soluções, diferentes das que normalmente asseguram o provimento de cargos públicos, mas sem demora, porque não é justo consentir que a vida e a saúde de toda a população de uma ilha continuem desamparadas de assistência clinica.

O Sr. Alberto de Meireles: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Alberto de Meireles: - Eu estou a ouvir, enlevado, V. Ex.ª, porque de tantos e tão ilustres Deputados, até os que falaram, penso eu que terei sido dos poucos que visitei a ilha do Corvo. Isso está arquivado nalgumas páginas perdidas dos livros que publico raramente.

O Orador: - E que eu li com muito prazer.

O Sr. Alberto de Meireles: - Pois esta evocação do Corvo comoveu-me. É a terra mais ocidental de Portugal.

O Orador: - Da Europa.

O Sr. Alberto de Meireles: - Da Europa e de Portugal. É encantadoramente primitiva, é extraordinariamente bela. Quando por lá andei, foi por mera visita de curiosidade, de satisfação pessoal, não outro fim, e lembro-me de que todo aquele povo, as seiscentas ou setecentas pessoas que lá vivem e que eu conheci uma a uma - o que não é difícil -, dizia em resposta à pergunta "mas como é que vivem sem médico?": "O problema é muito sério", diziam-me os responsáveis da terra, "mas a senhora professora tem um pequeno arsenal farmacêutico, é muito devotada, aplica as injecções; mas", pormenor que me lembro, curiosíssimo, "há sobretudo uma pessoa que vela por mós: é Nossa Senhora." Está naquela igrejinha linda, de Nossa Senhora dos Milagres; e Ela foz o milagre de morrer pouquíssima gente, como eu pude ver naquele cemitério curiosíssimo que até tem este ressaibo poético: na parede do cemitério está uma legenda que podia, com ironia, ser cruel: "Sejam bem-vindos no Corvo." (Risos.)

E eu tive a curiosidade, porque recebi para mim essa mensagem, de ir ver o pequeno cemitério que V. Ex.ª conhece, debruçado sobre o porto. É pequenino, muito simpático e quase deserto. Havia mais de um ano que não era lá enterrado ninguém. As pessoas gozam de saúde, não têm os problemas que nós todos temos, vive-se pacatamente, não circula dinheiro, as fechaduras são desconhecidas - lembro-me que havia uma única. A porta da igreja está sempre aberta, todas as casas estuo abertos.

Mas, realisticamente, e ao contrário das doutíssimas e autorizadas opiniões que aqui apareceram, parece-me que, dado o condicionalismo da terra que eu conheci e que penso que permanece a mesma, porque estas coisas permanecem milénios, dificilmente será possível fixar um médico. O que será possível, penso eu é utilizar essa bane assistência das Flores, assistência médica, agora melhorada, que eu conheci também, porque das Flores ao Corvo vai muito pouca distancia. Mas o mar dos Açores não é para brincar. A acostagem é muito difícil. Lembro-me de me terem contado lá que foi necessário evacuar um ferido grave e foi preciso um dos nossos oficiais da aviação naval arriscar o seu avião e tentar uma amaragem dificílima. Só assim conseguiu evacuar o doente, levando-o para a Horta, onde foi operado pelo actual governador civil. Hoje há outros meios. As Flores tem uma base estratégica.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Alberto de Meireles: tenho imensa pena, mas V. Ex.ª está infringindo o preceito regimental que requer a inscrição prévia para discursos no período de antes da ordem do dia. E agradecia ao Sr. Deputado Linhares de Andrade o obséquio de não consentir mais interrupções.

A hora está muito adiantada.

Eu estou-me vendo na necessidade, sempre dolorosa, de não conceder a palavra a alguns Srs. Deputados que estão inscritos e, apesar de tudo, muitíssimo instam comigo para ainda usarem dela. Há mais inscrições para o período de antes da ordem do dia, que já vai mais longo do que o Regimento prevê. De maneira que, com imenso desgosto, com muitíssima contrariedade, tenho de começar por pedir aos Srs. Deputados que nem sequer ratão inscritos para não discursarem.

O Sr. Alberto de Meireles: - Eu peço desculpa a V. Ex.ª - As considerações que fiz talvez fossem, de facto, mais longas do que pensava. Não foram, certamente, da profundeza das dos Srs. Ilustres Deputados que me antecederam, ainda que mais breves no tamanho. Peço, pois, desculpa a V. Ex.ª de ter perturbado. E com isto termino, dizendo que realmente, para mim, já há anos a solução de um pequeno heliporto poderia resolvei- a assistência médica, satisfatória e humanamente.

O Orador: - Muito obrigado pela preciosa ajuda de V. Ex.ª e muito obrigado também em nome da população do Corvo pelas simpáticas palavras que lhe dirigiu, população que tudo merece, população que teve a honra de um dia merecer de um grande político que foi Mouzinho da Silveira o desejo, expresso em testamento, de querer ser sepultado entre aquela gente, porque teve a coragem de um dia lhe ser grata.

Se me dão licença, prossigo e prometo concluir dentro de breves minutos.

Se compreensivelmente não é possível encontrar um médico que aceite fixar-se com carácter permanente numa ilha minúscula, distante, isolada, de umas escassas centenas de habitantes apenas, penso que não haverá dificuldade em recrutar voluntários, civis ou militares, se as funções a desempenhar o forem em regime de comissão, por períodos curtos, de um ano no máximo, e se, a par de uma remuneração condigna, a comissão lhes proporcionar outras vantagens nas respectivas carreiras profissionais.

A consideração do Governo, particularmente à do Sr. Ministro cia Saúde e Assistência, deixo esta mal esboçada sugestão, com um respeitoso apelo, em nome da boa e sacrificada gente do Corvo, para que, por via dela ou de outra mais consentânea, o problema exposto venha a merecer pronta solução.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Montanha Pinto: - Sr. Presidente: Apenas meia dúzia de palavras para um apelo ao Governo.