típica tem de ser anterior à prática do facto e de que é proibido o recurso à analogia no momento da incriminação.
Dir-se-ia, assim, ser dispensável o acrescento introduzido pela proposta governamental, se não mesmo inconveniente, por manchar a pureza do principio com detalhes regulamentares que só à lei. ordinária pertenciam.
A consideração seria inexacta. Já entre nós se notou, com razão, que o texto constitucional vigente não dá expressão segura à necessária conexão dos princípios "nullum crimen" e "nulla poena sine praevia lege penali" (v. as Actas da Comissão Revisora do Projecto do Código Penal, vol. I, no respeitante ao artigo 1.º). Conexão tanto mais difícil de estabelecer num texto claro, quanto a existência de anterioridade da fixação da pena não deverá valer no caso de uma lei posterior cominar uma pena concretamente menos grave para o facto cometido.
É essa conexão que vem exigir a parte final do texto proposto. Através dela torna-se claro que também a pena tem de ser fixada em lei anterior, ao mesmo tempo que se consagra o princípio da aplicação da sanção penal mais favorável ao delinquente. E, afinal, a consagração, através de uma fórmula mais simples e feliz, do critério exarado no artigo 7.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, pelo modo seguinte:
Ninguém pode ser condenado por uma acção ou omissão que no momento em que foi cometida não constituía crime, segundo o direito interno ou o direito internacional. De igual modo, não pode ser infligida qualquer pena superior a que era aplicável no momento em que o crime foi cometido.
Deste modo, a redacção proposta pelo Governo é inteiramente de aceitar e aplaudir.
E absolutamente segura a ideia de que paia a medida de segurança velem, como paro a pena, as exigências da "reserva da lei" e da "proibição da analogia" inscritas no princípio da legalidade. A diferença, de não pequeno relevo, concerne ao principio da irretroactividade, que, aceite para a pena nos termos preditos, se considera inaplicável os medidas de segurança e em virtude do seu carácter e da sua função próprias: se tom carácter terapêutico e se, por outro lado, devem aplicar-se a quem seja, no momento da aplicação, criminalmente perigoso, tudo parece impor a sua aplicação "retroactiva", mesmo que esta se faça à custa de razoáveis exigências de garantia.
Mesmo a ser assim, parece que não deveria perder-se a oportunidade de, no n.º 9.º do artigo 8.º, consignar a extensão admissível e desejável do princípio da legalidade às medidas de segurança, acrescentando-se ao texto proposto para este n.º 9.º do artigo 8.º: sou medida de segurança fora dos casos previstos na lei".
Não se deixará, porém, de notar ainda o seguinte: admitir incondicionalmente que o legislador ordinário possa fixar retroactivamente as medidas de segurança, mesmo em homenagem a sua natureza e à sua função, não deixa de importar uma drástica redução de garantia que, em matéria criminal, o princípio da legalidade visa atribuir aos cidadãos; deve ser assegurada, pelo menos, a anterioridade da lei que fixa os pressupostos da aplicação da medida de segurança e, portanto, os Índices da perigosidade. Pode dizer-se, como em Itália, que a conclusão já resultará de uma interpretação restritiva, que tudo parece aconselhar, de um texto com o acrescentamento proposto. Melhor, porém, ser á adoptar uma fórmula que, não excluindo a aplicação da concreta medida de segurança prevista pela lei em vigor ao tempo da decisão, consagre a exigência de anterioridade da previsão legal do caso a que vai aplicar-se: essa fórmula pode ser a seguinte: "nem medida de segurança fora dos casos previsto s em lei anterior".
Não ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare puníveis o acto ou omissão, bem como não sofrer pena mais grave do que a fixada ao tempo da prática do crime nem medida de segurança fora dos casos previstos em lei anterior.
Verifica-se que a proposta, a exemplo do que sucede no texto actual, não especifica "as necessárias garantias de defesa" a que se refere e que tom de existir tanto para antes como para depois da formação da culpa. Dificilmente, para aquela primeira fase, se pode pensar em mais do que na assistência de advogado constituído ou, na sua falta, de defensor oficioso, e na admissibilidade de memoriais e requerimentos a receber obrigatoriamente. Na regulamentação desta matéria, o legislador ordinário deve inspirar-se naquela directriz constitucional, tendo em conta, naturalmente, que não devem ser consagradas soluções que ponham em grave risco a finalidade a prosseguir no processo criminal. Tem de se atentar, na verdade, em que é, em principio, prejudicial à investigação o conhecimento por terceiros dos resultados a que se vai chegando na investigação. Tudo o que em homenagem ao direito de defesa se prescreva na lei ordinária tem de conciliar-se com a finalidade do processo criminal.
É certo que, especialmente quando e na medida em que a instrução preparatória seja confiada a autoridades policiais, são possíveis abusos, traduzidos em atropelos ou violações de qualquer dos direitos, liberdades e garantias individuais e em especial das garantias de defesa. Esses abusos devem estar, sob as formas adequadas, sujeitos a controle jurisdicional.
Não se deve, portanto, razoavelmente, ir além do que o texto da proposta prescreve nestes domínios.