dinâmica, ou seja, por outras palavras, que aqui se requer um forte e corajoso sopro de renovação.

Somos, na verdade, um povo singular. Dizemo-nos um país pobre e desperdiçamos com enorme prodigalidade e a maior despreocupação a nossa maior riqueza - o capital humano.

Desperdiçamo-lo pela emigração, exportando mão-de-obra, e considerando-nos compensados ao receber em troca modestas economias, arrancadas com sacrifícios e privações, economias estas que, evidentemente, representam apenas uma parcela do acréscimo de riqueza que esses trabalhadores portugueses produziram em benefício dos países estranhos que os acolhem e nem sempre os acarinham.

O Sr. Camilo de Mendonça: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Eu creio ter ouvido V. Ex.ª dizer que desperdiçamos mão-de-obra - o que é um facto -, mas o que eu não percebi bem era se no entender de V. Ex.ª nós a deixamos partir por gosto ou por ainda não termos sido capazes de o evitar?

E como me preocupa muito a forma de evitar a emigração, gostaria muito de ver um contributo de V. Ex.ª para isso.

O Orador: - A resposta às suas palavras está dada na segunda disjuntiva de V. Ex.ª

O Sr. Camilo de Mendonça: - É que eu estou de acordo, e creio que levantei aqui o (problema em termos perfeitamente claros: a emigração constitui um drama, drama para o País num futuro próximo, drama para as regiões, drama para os emigrantes, que bem conheço, até porque tenho convivido intimamente com eles.

O que para mim é mais grave ou mais difícil é saber como vamos resolver o problema em tempo e por outro lado que não fique a ideia de que nos conformamos com isso. Ainda não vi ninguém conformado com isso. Vejo que as coisas acontecem, anãs que ninguém desejava que acontecessem.

Se em algum momento se pensou que a emigração era uma solução para o problema da balança de pagamentos, não creio que seja essa a opinião dominante no momento, felizmente.

O Orador: - Nem minha.

A resposta às minhas perguntas deu V. Ex.ª com a segunda (disjuntiva. Nas considerações que irão seguir-se creio mostrar - não era ocasião agora para abordar o problema da emigração, nem estou preparado com dados para isso - que as nossas dificuldades provêm do nosso atraso económico, que se traduz essencialmente numa baixa produtividade em todos os sectores, como adiante referirei.

Portanto, não nos era possível absorver nas devidas condições de dignidade humana essa mão-de-obra que sai do País.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Com certeza, a minha nota era só para este aspecto; nós conformamo-nos de facto, mas não em espírito nem como desejo com. a emigração, que respeitamos como direito natural. Tudo devemos fazer para nas suas causas a desnecessitar.

O Orador: - Muito obrigado.

Desperdiçamo-lo abundantemente em actividades económicas que teimam em não compreender os novos tempos, como é o caso de grande parte da nossa agricultura e de tanta ainda da nossa indústria, com unidades sem dimensão, sem técnica, sem adequada gestão, verdadeiras «subempresas», que naturalmente só podem facultar «subempregos».

Desperdiçamo-lo, sem porventura medirmos bem todo o seu montante, nos vários serviços públicos.

Vejamos, por exemplo, o caso das forças armadas.

Não será difícil apontar vários factores desse desperdício: a carência de meios materiais que permitam tirar todo o rendimento dos seus homens; não se haver ainda conseguido uma efectiva coordenação que evite a dispersão de serviços afins, não só entre os próprios sectores militares, como também entre estes e os correspondentes serviços civis; não havermos ainda vencido velhas e enraizadas rotinas, como é o caso de se não haver ainda dado à mulher o papel que el a poderia e mereceria ter no gigantesco esforço que está a ser exigido para defesa da Nação, e como é o caso, também, de continuarmos dedicando apreciável parte do contingente anual e do pessoal dos respectivos quadros permanentes a tarefas em que poderiam grandemente ser aliviadas as forças armadas.

Não seria lógico, por exemplo, pretender que todas as populações civis, não só as das aldeias, mas também as das vilas e cidades, toda a gente, em suma. das áreas onde se pretenda infiltrar a subversão, prestasse mais activo contributo para a sua autodefesa?

Seria absurdo meditar os ensinamentos de Israel, que, no interesse da- sua economia e na linha dos seus conceitos de segurança, concluiu dever levar a coordenação dos seus serviços militares ao máximo possível de centralização entre si e de integração com os serviços civis?

Os hospitais militares israelitas, por exemplo, passaram na quase totalidade para o respectivo Ministério da Saúde, ficando a cargo das tropas unicamente os hospitais de campanha. Nós, pelo contrário, persistimos em manter serviços distintos, e em grande parte paralelos, em cada um dos três ramos das forças armadas.

Que desoladora diferença!

A recente nomeação, para Angola, do respectivo secretário provincial deixa, todavia, supor que as ideias anteriores estilo ganhando algum terreno, que já não são tidas por heréticas, ao menos nos domínios da saúde.

Oxalá se caminhe rápida e decididamente neste sentido, neste como noutros domínios, e que as forças armadas sirvam uma vez mais de exemplo, promovendo, o mais prontamente possível, a efectiva integração entre tantos sectores que lhe são comuns.

Seria, afinal, uma forma mais de pôr cobro a este perdulário desperdiçar de energias que tanto entrava o nosso progresso económico e mais pesada torna a nossa defesa.

Procurarei esclarecer a situação com a ajuda de algumas cifras.

Foram atribuídas à defesa nacional verbas que, em 1969, se aproximaram de 10 por cento do nosso P. N. B. Todavia, estes dispêndios, que são grandes para nós sem a menor dúvida, em si mesmos são inferiores aos da generalidade dos nossos companheiros na N. A. T. O.

Na verdade, embora sejamos, entre todos, o único país com operações militares activas no seu território, as nossas despesas militares sómente são superiores às do Luxemburgo. Mesmo em relação aos pequenos países da Europa de Leste, apesar do seu mais baixo nível de vida, tão pouco são excessivas, pois apenas a Bulgária as tem ligeiramente menores.

Não deverá ser, por conseguinte, neste ponto que reside a verdadeira razão dos nossos males.