Quero crer que, na maior parte dos casos, se apresentam às entidades responsáveis meras cópias dactilografadas, outras transmitidas telegràficamente, portanto sujeitas a qualquer erro. E vejam VV. Ex.ªs quanto seria desagradável transcrever um texto errado ou deturpado. Quer dizer, isto funciona, a meu ver, em defesa do próprio orador ou autor do discurso. Permita-me a Câmara um desabafo. Eu suponho que impaciências nesta matéria são com as vagas do mar: ou causam dados ou são apenas espuma.

O Sr. Barreto de Lara: - V. Ex.ª dá-me licença para uma observação?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Barreto de Lara: - É que, numa conferência ou reunião que tive em Luanda, há dias, com os órgãos da informação, fui inteirado de que, segundo se vem entendendo, as determinações do Sr. Presidente do Conselho, no tocante à censura de escritos dos Srs. Deputados, não tinham aplicação no ultramar, e que, exactamente por isso, haviam sido censurados textos enviados, que não eram cópias mais ou menos erradas, ou gralhadas, mas o próprio Diário das Sessões.

E se faço este apontamento, é apenas, não para confirmar ou criticar o que V. Ex.ª acaba de dizer, mas sim para ressaltar que há um desvio ou uma deturpação das ordens de S. Ex.ª o Presidente do Conselho, o que considero verdadeiramente inadmissível perante a clareza daquelas afirmações que foram produzidas nesta Casa pela voz autorizada de V. Ex.ª, interpretando exactamente o pensamento do Sr. Presidente do Conselho.

É que não sei o que haja de especial no ultramar para que textos que constam do Diário das Sessões sejam (eu queria usar uma expressão, mas o Sr. Presidente não me autorizaria, com certeza, a usá-la), sejam, repito, usando uma expressão mais suave, mutilados. E por quem? Pela Censura, onde existem vários indivíduos a quem não reconheço maturidade intelectual para censurar os meus escritos, que se contêm no Diário das Sessões, e produzidos à luz do mandato que a Nação de outorgou.

O Orador: - Eu queria esclarecer o Sr. Deputado Almeida Cotta que foi enviada para a Beira uma fotocópia das palavras que aqui proferi. Se foi esse texto ou não que foi submetido à censura, confesso que não sei, mas saberei então, de futuro, proceder, como devo.

O Sr. Sá Carneiro: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Sá Carneiro: - Era só para pedir um esclarecimento. V. Ex.ª teve a sua prosa suspensa, até averiguarem a autenticidade dela, ou pura e simplesmente cortada?

O Orador: - Eu creio que não foi suspensa. Não foi toda cortada, foi só em parte, mas creio que não esteve suspensa.

O Sr. Sá Carneiro: - Não esteve, portanto, suspensa; foi cortada.

O Orador: - Julgo ser fundamental, tanto para governantes como para governados, que o enunciado dos problemas seja posto com clareza e em toda a extensão da

verdade; só assim, creio, se poderá adquirir a consciência desses problemas e exortar ao esforço colectivo que eles exigem.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à

Continuação do debate acerca do aviso prévio do Sr. Deputado Correia da Cunha sobre o ordenamento do território.

Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida e Sousa.

O Sr. Almeida e Sousa: - A apresentação tão serena, tão realista, mas ao mesmo tempo tão confiante, deste aviso prévio calou profundamente no meu sentir e determinou que, querendo, na medida do meu poder, contribuir para o êxito da iniciativa, resolvesse refundir o trabalho que tencionava apresentar na ideia de que, tornando-o complementar dos que aqui ouvi, pudesse vir a ser mais útil. Oxalá o consiga.

Penso que, em teima com a importância vital que este tem paira toda a Nação Portuguesa, só de um trabalho de equipa, aturado e profundo, podem resultar as directrizes verdadeiramente válidas que o País quer e pode esperar desta Assembleia.

Porque me coube ser dos últimos oradores inscritos neste debate, tive ocasião de observar, sem surpresa, aliás, que, pelo menos aqueles cujos interesses estão mais perto dos meus, se aproximaram muito do trabalho que, sem prevenção, aqui viria apresentar. Embora admita que o repetir possa frisar, que possa dar mais força, sinto que o pouco tempo de que dispomos deve ser aproveitado preferentemente paira trazer aqui novas ideias, pôr novos problemas, propor novas soluções.

O ordenamento do território é assunto tão vasto que, por muito que seja explorado, algo de novo haverá sempre que dizer. E sem me querer substituir, de forma nenhuma, as conclusões que o ilustre apresentante por certo irá tirar, gostaria, na medida do possível, de falar daquilo de que ainda não ouvi falar, de dizer do que me ocorre para completar o que aqui foi dito.

Com certeza que o não conseguirei, mas penso que a intenção é boa e que vale a pena tentar. Pedirei a indulgência de V. Ex.ª para o que não conseguir.

Em primeiro lugar, queria salientar a urgência com que me aparece este problema. Não pode ser para amanhã, tem de ser para hoje. Não o permitem nem a injustiça flagrante que todos os duas consentimos, nem o constante agravar de uma situação que nos não honra e nos empobrece hora a hora.

Se persistirmos nos métodos lentos com que temos atacado este problema -se é que alguma vez já decidimos atacá-lo -, arriscamo-nos a ser tarde de mais quando o quisermos resolver. Portugal, todos estamos de acordo, não pode continuar a ser apenas uma reserva de mão-de-obra não qualificada para as indústrias europeias, mão-de-obra que se vá desnacionalizando pouco a pouco até se fixar definitavamente noutras terras, deixando atrás de si um deserto de pedras erodidas onde oxalá as árvores ainda possam, crescer.

Este pensamento, melhor do que nenhum outro, marca a urgência da solução.