Nesse sentido, logo em 12 de Fevereiro de 1935 foi apresentado à Assembleia Nacional, por iniciativa do Deputado Dr. João Garcia Pereira, um projecto de lei (n.º 31) acerca das "concentrações económicas" 29.

O projecto autorizava o Governo a "dissolver as concentrações económicas de qualquer espécie ou ramo de actividade quando lhes reconheça uma acção confraria aos objectivos da mesma actividade" (arbigo 1.º).

No parecer desta Câmara sobre o mesmo projecto, de que foi relator o Prof. Doutor Fezas Vital 40, considerou-se que os abusos deviam ser leprimidos, mas não se condenou, em si mesmo, o fenómeno da concentração. Lê-se no citado parecer:

A Câmara Corporativa não condena, em princípio, as coligações, generalizadas na economia actual e impostas tonta vez pela necessidade de corrigir os inconvenientes de uma concorrência desregrada, etc., e antes se convence de que a colaboração, em certos domínios económicos, e a formação de grandes empresas, noutros, representam um progresso da economia capitalista ...

Supomos não error escrevendo que é na tendência de certos complexos económicos, particularmente dos cartéis, para o monopólio, que se encontra a mais perigosa das suas actuações e que deve ser, portanto, contra os seus abusos de índole monopolista que o Estado, intérprete e supremo defensor do interesse geral, deve sobretudo precaver-se 41.

Na conclusão do parecer, a Câmara deu a sua aprovação ao artigo 1.º do projecto, com nova redacção, tendo, 'nomeadamente, substituído a expressão "concentrações económicas" por "coligações económicas", de modo u abranger todos os agrupamentos (trusts, grupos, cartéis) que "não destruindo a individualidade económica ou, pelo menos, a individualidade jurídica dos empresas coligadas ... podem por isso ser dissolvidos sem a concomitante dissolução destas" 42.

Da discussão do projecto e do parecer na Assembleia Nacional resultou a apresentação de uma "proposta de substituição" pelo Deputado Dr. Garcia Pereira, e de um "contraprojecto" pelo Deputado Doutor Artur Águedo de Oliveira.

A proposta de substituição acrescentava à faculdade de o Estado dissolver as coligações ainda a de "estabelecer uma fiscalização temporária ou permanente sobre os actividades económicas particulares - cartéis, sociedades anónimas, frusta, etc. - com o fim de evitar os abusos do seu poder económico".

Por seu turno, o contraprojecto não falava em dissolução de coligações, mas considerava "ilegais todos os acordos, combinações e coligações de empresas que tenham por finalidade restringir abusivamente, sob a forma de monopólio, açambarcamento ou especulação fraudulenta, a produção, o transporte e o comércio dos bens de consumo". Noutra disposição sujeitava são mesmo regime e sanções os industriais, agricultores e comerciantes que, por meio de acordo, combinação ou coligação, provoquem um aumento exagerado nos preços dos bens de consumo essenciais a vida humana ou uma diminuição fraudulenta na qualidade dos mesmos bens".

Em novo parecer 42 com o mesmo relator, esta Câmara deu a sua aprovação, com emendas, à proposta e ao contrnaprojecto, os quais, depois de nova apreciação pela Assembleia Nacional, vieram a converter-se na Lei n.º 1938, de 18 de Março de 1936 44.

Organização do regime de publicidade e fiscalização da actividade das coligações (base II);

Dissolução dos coligações que actuem por forma contrária aos objectivos da economia corporativa (base III);

Ilegalidade dos acordos, combinações e coligações que tenham por fim restringir abusivamente a produção, o transporte ou o comércio dos bens de consumo, elevar ou baixar exagerodamente os preços ou diminuir fraudulentamente a qualidade dos mesmos bens, sendo os promotores e contraentes punidos com multa e, em certos casos, também com prisão correccional (bases IV e V).

Destas bases depreende-se que o diploma se inclinou para um sistema de proibição ou de "dano potencial", embora mitigado pela referência expressa a determinados tipos de condutas ilegais.

Seguidamente, a base VI declara que "os crimes punidos nas bases m e IV serão julgados por tribunais especiais ou por tribunais ordinários determinados, conforme em decreto-lei for estabelecido, mas sempre, no segundo caso, com a intervenção de peritos competentes".

As disposições das bases acima referidas só entrarão em vigor após a publicação do mencionado de-creto-lei.

É manifesto o lapso da referência à base III, pois nesta não se prevê nem pune nenhum crime. A remissão devia ser para as bases IV e V, e, consequentemente, só a vigência destas deveria ter ficado dependente da publicação do decreto-lei ali referido, que viria definir quais os tribunais competentes para o julgamento desses crimes I.

Cumpre, assim, concluir que as bases II e III da Lei n.º 1936 devem considerar-se como estando em pleno vigor, independentemente da publicação de diploma regulamentar, embora se reconheçam as dificuldades que, sem este diploma, teria a efectiva aplicação daqueles preceitos. E também é certo que nunca chegou a ser publicado o decreto-lei previsto na base VI. A Lei n.º 2 005, de 14 de Março de 1945, ao promulgar as bases a que deveria obedecer o fomento e a reorganização industrial do País, definiu como objectivo fundamental o de se obterem dimensões das empresas que assegurassem a respectiva viabilidade técnica e económica. Para tanto, consignou como modalidades de reorganização, entre outras, a da "concentração de fábricas e oficinas em unidades fabris de maior rendimento económico e per-

44 Diário do Governo, 1.ª série, n.º 64, de 18 de Março de 1936.

45 Sobre esta questão, veja-se o bem elaborado estudo do Dr. Pedro Geraldes Cardoso, "Da actualidade da lei sobre coligações económicas:", em Estudos Saciai" e Corporativos, ano IV, Dezembro de 1065, n.º 16, pp. 65 e segs.