Em nenhum outro campo a educação, manifesta o seu poder, de controle social como no da Universidade, o mesmo Á dizer que esta pende mais a travar o progresso do que a apressá-lo.

O Sr. Axila de Azevedo: - Muito bem!

O Orador: - Mas a vida exerce sobre ã Universidade pressões cada vez maiores. As razões disso são conhecidas, mas também se conhecem os modos de as neutralizar ou, pelo menos, de lhes impedir o efeito dinamizador. Tem-se logrado, com prejuízo para a cultura, conter o ímpeto das aspirações e forças reformadoras. Os órgãos de governo da Universidade formam um grupo de pressão muito influente nas decisões e iniciativas das instâncias superiores dá Administração. É verdade haver docentes com alma de reformador, mas podem pouco perante a dinâmica- do processo geral. Muitos tornam-se a breve trecho dissidentes ou desiludidos, refugiando-se na sua cátedra ou no serviço hospitalar.

Os mecanismos de defesa de que o sistema universitário dispõe e utiliza paralisam ou retardam as tentativas de reforma profunda e imediata. Só quando as disfunções atingem gravidade excepcional, ameaçando a vida da própria organização, é que a rigidez cede, aceitando-se a mudança e os seus riscos. Até lá, só um poder externo forte, pertinaz e bem dirigido, com o concurso da energia da gente moça, vencerá as resistências conservadoras. Mas isso é improvável. .

A crise das Faculdades de Medicina provém decerto das mesmas causas da crise da Universidade, possuindo características especificas que influenciam a atitude do Estado perante a premência das 'necessidades, e expectativas que dia a dia aumentem a procura de médicos e dê serviços.

Note-se que, contrariamente ã uma noção comum, a influência do factor económico no consumo médico é menor que a do factor cultural, pois importa mais o grau de conhecimento que a capacidade económica.

Tudo isto se reflecte nas Faculdades e nos hospitais escolares e, por conseguinte, na educação médica.

Não insisto neste ponto já tratado pelo Sr. Deputado avisante, que desenvolveu proficientes considerações sobre o currículo dos estudantes.

Passo a um assunto reputado de primacial importância, que é, de certo modo, condição e base de qualquer reforma & valer. Refiro-me às novas Faculdades que é necessário criar sem demora.

O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!

O Orador: - Falei de propósito em novas Faculdades para afastar ia ideia de que é possível com ampliações, retoques e emendas transformar as Faculdades existentes em centros da ensino à altura das circunstâncias e das necessidades. Tenho a convicção bem radicada de que a reforma só é profícua instituindo novos Faculdades, obedecendo a três requisitos. O primeiro é serem, logo de principio, completamente independentes das actuais ...

O Sr. Pinto Machado: - Muito bem!

O Orador: - ... não podem constituir prolongamentos nem extensões directas nem indirectas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Designadamente a concepção e os planos têm de ser gizados ao abrigo de tutelas e influências do modelo antigo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, o corpo docente deve ser formado por pessoas no vias, no duplo sentido: novas nas ideias e ma idade. Não basta a juventude do espírito (de que banto se fala), é preciso também a dos anos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sem querer menoscabar os predicados e as ideias de alguns indivíduos maduros ou encanecidos, a verdade é que uma Faculdade leva muitos anos a dar os primeiros frutos e o avanço da idade é inexorável.

Em terceiro lugar, a Faculdade não deve ser entendida como um edifício com um corpo docente e discente aí encerrado hermeticamente. O conceito de instituições deste tipo, que é o histórico, já se mostrou incapaz de responder às solicitações do mundo contemporâneo. O ensino dos graduados e pós-graduados cabe a todos os serviços hospitalares gerais e especiais e aos departamentos da saúde pública, em condições de o ministrar, mediante contrato com a Universidade.

endo assim, devem aproveitar-se os meios consideráveis dê ensino e aprendizagem dos hospitais não universitários, onde existem médicos de elevada categoria profissional que assumiriam de bom grado funções pedagógicas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Orador: - Insisto nestes pontos, porque me parecem a condição sine qua non da reforma.

Deve esperar-se pouco da mudança da mentalidade de quem nasceu, viveu e, às vezes, entrou em declínio, à sombra de ideias e conceitos diferentes dos actuais e, principalmente, dos que nos traz o futuro. As acções reformatrizes resultam muito menos da adaptação do que da iniciativa de novos agentes humanos.

A nova Faculdade requer outras pessoas, com noções, ideais, entusiasmo e capacidade para romperem com o passado, dando forma e orientação novas à educação e à cultura médica e universitária.

Permita-me, Sr. Presidente, que retome a ideia aqui desenvolvida quando há perto de dois anos tive a honra de apresentar o diviso prévio sobre "As Universidades tradicionais e a sociedade moderna".

Defendi então a mesma ideia de hoje, que o tempo decorrido vincou mais no meu espírito: sas Universidades não se auto-reformam".

É preciso fundar Faculdades independentes das antigas, para lograrmos ainda ver nos nossos dias a Universidade moderna e - esperemo-lo - uma sociedade também moderna.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vou encerrar a sessão. Peço a atenção dos Srs. Deputados que são membros da Comissão de Economia, e que estavam convocados para as 18 horas e 30 minutos, hora a que se presumia que acabasse esta sessão, para o facto de que o encerramento mais cedo da sessão do plenário permita iniciar também mais cedo os trabalhos da Comissão e, portanto, sou solicitado a rogar A sua comparência imediata na respectiva sala.

Amanhã haverá sessão à hora regimental, tendo como ordem do dia a continuação do debate do aviso prévio sobre educação médica. Está encerrada a sessão.

ram 17 horas e 30 minutos.