Aceitaria mesmo que o texto ficasse nas afirmações iniciais, sem expressa menção da presença empresarial do Estado. Não que tenha algo a objectar a essa presença: se por alguma coisa se tem pecado, nos últimos anos, será por ausência mais que por excessiva participação do Estado no lançamento de novos empreendimentos. Apenas se afigura que, sendo instrumento político de inatacável licitude constitucional, a iniciativa empresarial do Estado nem exigiria especial referência e sanção do poder legislativo, logo aqui, no terreno dos princípios gerais.

Pois não entende a Câmara que a assunção de posições empresariais pelo Estado constitua, na nossa prática económica, a primeira ou mais temerosa ameaça à iniciativa privada, que alguns nela querem ver e se afadigam a denunciar oportuno et importune. Bem mais infensos ao espírito de livre empresa suo outros modos de intervenção que parecem não causar tantos engulhes: é-o, por certo, um condicionamento industrial com a extensão e as formas que entre nós tem revestido.

Que a penetração do Poder no terreno empresarial não tem assumido proporções de invasão, deixa-o ver a simples consulta do rol das "empresas do Estado" (designação usada no Orçamento Geral, onde vêm enumeradas), praticamente imodificado entre 1960 e 1970. Por sua vez, o elenco das sociedades de economia mista, que pode obter-se da mesma fonte, aparece numericamente acrescido de três empresas, nesse intervalo. Acrescente-se que a discriminação desse elenco não viria exactamente corroborar a imagem de um Estado ávido e prepotente, avezado a açambarcar oportunidades lucrativas em detrimento da iniciativa privada. O parecer subsidiário da secção de Indústria sugere que ao texto desta base se acrescente a fórmula "ouvidas as corporações interessadas". O que daria a seguinte redacção: O Governo, ouvidas as Corporações interessadas, promoverá, quando o interesse da economia nacional o aconselhe, a criação, o desenvolvimento, a reorganização e reconversão de indústrias .... etc.

Seria nítido o resultado da alteração sugerida: vincular o Governo à audição das Corporações sempre que haja de promover ou orientar seja o que for, de fortalecer ou suprir a iniciativa privada. Em suma, sempre que se disponha a qualquer actividade no terreno da política industrial - pois o que no resto da base se contém não é mais que o enunciado genérico das actuações do Estado em que se desdobra uma política industrial.

Naturalmente se duvida se tão ampla vinculação - e não bem outro sentido a fórmula em causa - exactamente corresponde às intenções da secção. E afoita-se a Câmara a pensar que não.

Mas porque o problema assim levantado se prende com matéria já abordada na generalidade - a participação da indústria ao estudo, elaboração e execução da política industrial (cf. n.º 30 e 31 supra) - e que interessa à análise de outras sugestões do parecer subsidiário, é este o momento de o repor em termos gerais. Dificilmente se foge, desde o princípio, à incómoda sensação de que a participação das actividades privadas, no que tange a política industrial, mais precisa de ser acautelada e afirmada nos "costumes" - e nas suas genuínas condições de efectivação - que nos simples textos legais. Pois que aí anda ela superabundantemente prevista, e autorizada, e institucionalizada.

Desde logo pela presença da indústria corporativamente organizada nas várias esferas do Estado. A começar pela própria representação nacional: nesta Câmara, por onde transitam os dispositivos legais de maior dignidade e alcance, tem a indústria numerosa e qualificada representação electiva. E a continuar nas várias zonas da Administração e dos serviços parapúblicos que a prolongam, onde os representantes da Corporação dia Indústria têm voz deliberativa ou consultiva. Acresce que, nalguns deles (v. g. mo Conselho Técnico da Indústria e mo Conselho Nacional de Estatística), têm ainda assento os representantes das associações económicas, privadas.

Passando ao domínio das atribuições legais, logo a Lei n.° 2086, de 22 de Agosto de 1956 (base v), nesta parte reproduzida pelo Decreto n.° 41875, de 23 de Setembro de 1958, fixa à Corporação uma série de atribuições com óbvia incidência no terreno da política industrial: é nomeadamente o caso das enunciadas nas alíneas c), f), h) e i) daquela base. E bastará acrescentar que o Decreto-Lei n.° 43 559, de 25 de Março de 1961, veio a precisar a competência consultiva da Corporação, formalmente a legitimando para estudar, se pronunciar e propor, de sua iniciativa ou a solicitação da Secretaria de Estado da Indústria, em qualquer matéria que praticamente respeite a política industrial.

Parece assim suficientemente consagrada, DO genérico plano legal, aquela participação da iniciativa privada no estudo e elaboração dessa política, que atrás se apontou como uma das condições maiores da sua eficácia. Mas que de modo algum requer a universal vinculação dos actos do Governo à prévia audiência das Corporações. E porque outra coisa não significaria o sugerido aditamento a esta base, entende a Câmara não o perfilhar, recomendando que se mantenha, na íntegra, a redacção do projecto.

§ 2.° - Objectivos da política industrial Trata este título, na única base que contém, dos "objectivos da política industrial". E alvitra a Câmara, liminarmente, que se modifique a sua (própria designação, pois se Lhe afigura que grande parte das metas aqui fixadas

E sem embargo de os dois termos serem frequentemente usados em prática sinonímia, parece preferível que no articulado legal se utilize o que tem menores conotações técnicas; e que genericamente se aluda a "finalidades", categoria mais ampla que a dos objectivos e que aceitavelmente engloba todos os desígnios enunciados na base IV.

Logo, porém, se descortina que entre os benefícios a atribuir e os objectivos a que essa atribuição está genericamente subordinada se interpõe uma "relação das indústrias prioritárias", cuja elaboração naturalmente cabe ao Governo (base XVII, n.° 2). Ora isso claramente dilui a relevância- directa que a formulação adoptada para os objectivos poderia assumir no tocante a execução da política; e na