Mas ainda mais grave é que nesta campanha o que se tem discutido é uma homilia sobre a paz. A igreja católica tem uma. doutrina própria sobre a paz, que ela define como da ordem fundada na verdade, constituída segundo n justiça, alimentada e consumada na caridade e realizada sob os auspícios da liberdade" (João XXIII, pacem in Terris). Nessa linha de igreja tinha o bispo do Porto o direito de afirmar, como afirmou, na homilia em questão: Se queres a paz, trabalha pela justiça. Tal expressão foi aqui censurada como algo de extraordinário. Ora, a Igreja não podo admitir que a teologia lhe seja ditada pelo Exército ou pelo Parlamento. Não se pode atribuir ao catolicismo, sob pena de o desuniversalizar e desvirtuar, uma dimensão política específica, vinculada a determinado conceito de pátria. O Evangelho também serve para os Portugueses, mas não é português.

Se a sombra da religião alguém - eclesiástico ou leigo- cometer algum crime, as autoridades judkjinis não deixarão de intervir em defesa da sociedade.

E era só isto, Sr. Presidente, o que eu queria dizer. Para terminar, gostaria de declarar a minha convicção de que, como portugueses que todos somos, poderemos respeitar-nos e compreender-nos e, apesar das divergências, darmos as mãos para as tarefas em que estejam em jogo os grandes interesses nacionais.

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Robotedo e Silva: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:- V. Ex.ª pediu a palavra para explicações?

O Sr. Roboredo e Silva: -Peço a palavra de harmonia com o n.º 5 do artigo 46.º do Regimento.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra para explicações.

O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Começo por render homenagem a lealdade e a correcção do Sr. Deputado Dr. José da Silva, que teve a amabilidade de me dizer, há alguns dias, que iria falai- sobre o tema que acaba de versar.

Necessariamente, não me deu pormenores, e nem seria curial dá-los, daquilo que iria dizer, mas o seu aviso permitiu-me reler e relembrar alguns pontos, porventura úteis, daquilo que se tinha dito ou escrito sobre a matéria. E como o Sr. Deputado Dr. José da Silva nitidamente se referiu a minha intervenção, aqui na Assembleia, tenho, por consequência, uns pequenos esclarecimentos a prestar.

Na minha intervenção do dia 7 do corrente não usei da palavra para acusar, mas sim para defender as forças armadas, que, no entendimento que resultou da leitura cuidada, repito, cuidado, que fiz do texto produzido no jornal que aqui tenho, e de que mantenho ura exemplar, tinham sido injustamente desconsideradas.

Se de alguma forma essa minha intervenção contribuiu para o comunicado do Sr. Bispo do Porto, que, aliás, não tinha individualizado, e foi publicado nos jornais do dia 14 do corrente, Salvo erro, só tenho ide me congratular por S. Exa. Rev.ma ter declarado que na sua homilia de 1 de Janeiro passado não aludia às forças armados, e por se referir agora ao que tem dito e escrito, quando é ocasião disso - palavras textuais, sobre o dever militar, de que reproduzo tos frases seguintes: "[...] acentuando até a altura religiosa a que pode elevar-se o cumprimento do dever militar por parte dos combatentes", e mais adiante "[...] o qual pode atingir o uivei religioso do martírio canonizável".

Interpreto estas afirmações, designadamente aquela de que não se referia às forças armadas, como uma espécie ,de moa culpa, que só valoriza os homens bem formados, pois todos erramos ou pecamos.

O Sr. José da Silva: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Só tenho cinco minutos, Sr. Deputado. Se me ficar tempo dou-lhe todos os autorizações e mais alguma. De resto, já tenho dito aqui na Assembleia que, quando falo, estou sempre disposto a todas as interrupções.

Mas o Regimento só me permite cinco minutos, não é verdade, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Não há dúvida de que o Sr. Deputado Boboredo e Silva, tendo pedido a palavra para explicações, não tem direito a ela senão por cinco minutos.

Se o Sr. Deputado José da Silva entender que também deseja prestar explicações à Assembleia, no seguimento das palavras do Sr. Deputado Boboredo e Silva, pois conceder-lhe, com muito gosto, a palavra esse título, portanto, por outros cinco minutos.

O Sr. Deputado Boboredo e Silva tenha a bondade de continuar.

O Orador: - Dizia eu, pois, que todos erramos ou pecamos: leigos, sacerdotes, bispos, até o próprio Papa, como, par exemplo, quando recebeu em audiência, no Vaticano, e se calhar abençoou, chefes terroristas portugueses, autênticos exterminadores de populações inocentes.

Não obstante as subtilezas de oratória do nosso ilustre colega Dr. José da Silva, que, como distinto advogado que é, delas e da sua inteligência, tem colhido notáveis êxitos no foro, com os quais decerto todos nós aqui na Assembleia nos congratulamos...

O Sr. Casal-Ribeiro: - Todos não!

O Orador: -... Permite-me chegar aquela interpretação.

De resto, não é raro verificar-se que os mesmos textos suo interpretados de forma diferente, conforme a óptica com que são vistos ou as intenções. com que se lêem, particularmente quando são filosoficamente mais ou menos confusos .paro o comum dos mortais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Eu terminaria, Sr. Presidente, apenas dizendo que, sem pretender ir mais filem- mesta matéria, que para mim está definitivamente encerrada e talvez tivesse sido mais curial tê-la encerrado com a publicação do comunicado do Sr. Bispo do Porto, quero apenas proclamar que os virtudes militares, que se me afigura o Sr. Bispo pretender agora reconhecer, superam no seu conjunto e em doutrinas todas as outras, porque, além das que ornam os cidadãos que exercem qualquer mister civil, exigem sacrifícios que vão até ao da (própria vida, imolada a Pátria com a firme convicção de que se trata de um dever inabalável.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José da Silva pediu a palavra para explicações. Tem cinco minutos.