Sá Cardoso:

Sr. Presidente: Eu tinha como certo que deviam ser portugueses os que marcassem um dia o maior impulso da aviação tornando-a prática. E devia ser assim. Foram os Portugueses que rasgaram os largos horizontes marítimos, era fatal que seriam portugueses também os descobridores dos caminhos dos ares. As qualidades atávicas da raça que se não perdem; a fatalidade da tradição que é incentivo constante e permanente e a continuidade, a sequência da história, bem o deixaram prever.

Depois de aludir à epopeia portuguesa em terra e no mar, disse:

E no ar? No ar... as figuras eminentes de Gago Coutinho e Sacadora Cabral a dar à viação o maior impulso. Tinha de ser assim. A tentativa de outrora transforma-se numa epopeia. É a audácia e a ciência que conseguem planear e realizar essa viagem feliz. O próprio contratempo dos rochedos, serviu para demonstrar que a um avião era tão fácil atingir um minúsculo ponto no oceano, como a um navio demandar uma barra. Feliz vingem esta que conseguiu aproximar para sempre as duas pátrias irmãs.

Por isso também n apoteose não é feita apenas pelo povo português. É por toda a raça.

É, pois, todo o Portugal quem aqui no Parlamento saúda os dois ilustres portugueses, e é dever nosso tombem mostrar à mocidade, às gerações de amanhã, os nomes de Gago Coutinho e Sacadora Cabral, apontando-os como nobre exemplo para que neles se inspirem e possam praticar novos cometimentos. Tomás de Vilhena:

Devo dizer sem sombra de lisonja que Gago Coutinho e Sacadora Cabral, que hoje vieram honrar o Congresso com a sua visita, são duas autênticas personalidades de epopeia.

Descobrir . . . acrescentar mais uma verdade à ciência, experimentá-la através de gravíssimos perigos, a fim de dar ao Mundo uma lição útil e à Pátria uma glória imorredoura, é aspiração sublime, para a qual a nossa raça dispõe de especial competência para compreender e para realizar.

Sr. Presidente: Gago Coutinho e Sacadora Cabral são lídimos protótipos do nosso antigo génio empreendedor e audaz.

Ora esta audácia não oferecia parentesco com aquela que se desperdiçava, às cegas e às tontas, no serviço das fúteis aventuras, tão celebradas pelos tropeiros e trovadores; não audácia à portuguesa revelava-se na efectivação de cometimentos famosos, como foram a fundação da nacionalidade, a defesa da sua independência, a sua expansão Ultramarina, cometimentos que reclamavam para o seu êxito uma valentia e uma tenacidade invulgares, mas que eram planeados e preparados com tino e com consciência.

Os nossos primeiros navegadores, antes de se afoitarem a desvendar os mistérios do oceano, educavam-se na Escola de Sagres.

Ali receberam lições do ínclito infante, do eminente Jaime de Mayorca e de outros mestres, sobretudo os conhecimentos de que a ciência de então dispunha para dirigir a navegação.

Diz-nos o célebre Pedro Nunes na sua Defensão da Carta de Marear que estes descobrimentos de costas, Ilhas e terras firmes não se fizeram indo a acertar, "mas partiam os nossos navegantes mui ensinados e providos de instrumentos e regras de astrologia e geometria".

Ora, os nossos aviadores mantêm a tradição da audácia à portuguesa, audácia capaz de afrontar os maiores perigos, audácia que não afrouxa ante as dificuldades, audácia que se não desfaz no meio dos reveses; porém, audácia que se não desvaira em heroicidade impertinentes e ridículas, porque toda ela se reserva para a realização de algum anelo útil e nobre.

A travessia Aérea de Portugal ao Brasil é a audaciosíssima experiência de uma teoria que se estabeleceu com processos rigorosamente científicos.

O Sr. Almeida Costa: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Cotta: - Eu agradeço penhoradamente a V. Ex.ª ter-me consentido interrompê-lo, tanto mais que, julgando que todos comungam no mesmo sentimento, eu apenas desejaria associar-me às palavras com que V. Ex.ª tão eloquentemente tem recordado esta notabilíssima efeméride nacional. Efeméride que culmina na consagração da comunidade luso-brasileira, cada vez mais forte, dada vez de mais alto significado.

Muito obrigado a V. Ex.ª

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado Almeida Cotta, pelas suas magníficas e patrióticas palavras.

A prova real de que a teoria saiu certa ressalta da precisão da paragem marcada em pleno oceano, junto dos Rochedos de S. Pedro e S. Paulo.

Estava ganha a partida.

A ciência de voar firmava um passo decisivo, gigantesco. Sucedeu depois o desastre do avião. Foi uma sensaboria, porque prejudicou a estética, o efeito teatral do cometimento, mas só isso: o triunfo científico estava seguro, ficou inabalável. Era o que se pretendia.

Nesta consagração merecida que o Parlamento tributa aos dois insignes portugueses que serviram a ciência com tanto risco e lustre e dignificaram a Pátria de uma maneira esplêndida, não me permito falar, em nome do partido monárquico. Ah! Não é uma deserção. Fui sempre e continuo a ser homem de um só rosto e de uma só fé.

Mas, sob o deslumbramento do grandioso feito que comemoramos, eu não vejo aqui monárquicos nem republicanos, eu não sei nem quero saber de partidos, nem de facções, nem de dissidências; aqui, nesta hora histórica, só há portugueses, unidos todos pelos mais generosos sentimentos de júbilo e de gratidão.

Esta festa é uma festa da Pátria, e a Pátria portuguesa é de todos nós.

Vozes: - Muito bem !