Sr. Alberto de Meireles: V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza.

Eu só tenho receio que o Sr. Presidente ...

O Sr. Presidente: - Seria realmente desejável que V. Ex.ª encurtasse o mais possível a sua intervenção. Embora V. Ex.ª esteja a ser tão brilhante e o assunto tão digno, outros oradores querem ocupar-se dele.

Mias se algum Sr. Deputado quer interromper V. Ex.ª, V. Ex.ª é que é senhor de o deixar falar.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Eu peço o favor ao Sr. Deputado Alberto de Meireles de ser curto ...

O Sr. Alberto de Meireles: - Curtíssimo.

Tenho muito gosto em render homenagem a V. Ex.ª pela homenagem que presta aos monárquicos portugueses com a transcrição que esta lendo.

Eles vibraram, como vibram sempre, com os grandes momentos altos dia Pátria.

E lembro até a V. Ex.ª que foi o grande padre Luís Gonzaga Cabral, proscrito em 1910, como provincial dos Jesuítas e meu tio, que teve a honra de saudar, em palavras de magnífica eloquência, a chegada no Brasil, em nome de todos os portugueses, monárquicos e republicanos, os grandes heróis que chegavam.

Sacadora Cabral e Gago Contrito foram saudados pelo padre Luís Gonzaga Cabral, em palavras que não lembro aqui, mas que estão ainda escritas e na ressonância da comunidade luso-brasileira.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado.

Senador da Nação, é em nome da Pátria que eu saúdo e bendigo os ínclitos heróis.

Ministro da Marinha (Vítor Hugo de Azevedo Coutinho):

Depois de declarar que o Governo o incumbiu de o associar à homenagem do Congresso a "dois beneméritos da Pátria" e da emoção com que o faz como português e Ministro "dessa prestimosa Marinha de Guerra de tão nobres tradições e que tantos e tão assinalados serviços tem prestado à Pátria e a República, e que acaba de acrescentar a sua história uma nova página, sem dúvida das mais brilhantes", fez várias declarações sobre a génese e concretização da viagem, e falou das qualidades dos dois heróis:

E aqui tem V. Ex.ª como foram pelos ares demandadas as terras de Santa Cruz, essas mesmas terras em que os nossos gloriosos aviadores sentiram vibrar, uníssona com a nossa, a alma do Brasil, e eu não poderei, Sr. Presidente, prestar mais alta homenagem a Gago Coutinho e a Sacadora Cabral do que fazer hoje aqui a afirmação de que, além de relevantes serviços por eles prestados à ciência e à humanidade, eles souberam, pelo seu trabalho perseverante, pelo estudo, pelo seu patriotismo e pela audácia, fazer vibrar a Nação, levando-a colaborar nessa obra. que a história consagrou e que é, quanto a mim, o início de uma época de ressurgimento nacional.

Saudando deste lugar Gago Coutinho e Sacadora Cabral, eu saúdo a Pátria engrandecida e a República prestigiada.

Vozes: Muito bem!

O Orador: - Depois das transcrições que apresentei e que provavelmente já poucos ou nenhum de V. Ex.ª teria curiosidade de ver nos Diários do Congresso de há meio século, afigurou-se-me que se fica com uma mais perfeita ideia do que constituiu para a vida interna do País e para o seu prestígio a fabulosa viagem aérea Lisboa-Rio de Janeiro, com amaragem nos penedos.

Quanto a mim, o que então se disse é mais expressivo, até pela categoria intelectual e moral dos oradores, do que frases grandíloquas que porventura eu agora fosse capaz de arquitectar.

Limitar-me-ei a sumarizar e concluir:

Quando em 30 de Março de 1922 se iniciou a viagem aérea, Gago Coutinho tinha 53 anos feitos e Sacadora Cabral fazia em Maio seguinte 41 anos.

O segundo avião Fairey foi levado para Fernando de Noronha pelo navio mercante brasileiro Pajé, por não ter sido possível pô-lo no mar, nos penedos, como se "pretendia, devido à sua forte agitação. Por isso, os aviadores, para não haver solução de continuidade na extensão total da viagem aérea Lisboa-Rio de Janeiro, largaram de Fernando de Noronha, sobrevoaram os penedos e, no regresso às ilhas de Fernando de Noronha, sofreram a avaria do motor que os obrigou a pousar no mar, sendo encontrados pelo cargueiro inglês Paris City, surgindo seis horas depois o nosso República em seu apoio, perdendo-se contudo o aparelho ao ser rebocado para Fernando de Noronha.

O terceiro Fairey chega a Fernando de Noronha a 2 de Junho embarcado no Carvalho Araújo, navio irmão do República.

No terceiro avião largam os dois oficiais para o Recife no dia 5; chegam a 8 à Baía, a 13 a Porto Seguro (esta escala tinha de fazer-se, pois abrigou os navios de Pedro Álvares Cabral), a 15 a Vitória e a 17 de Junho ao Rio de Janeiro. No total foram dez as etapas da travessia; nos dois acidentes o sextante, o cronómetro e outros apetrechos para a navegação foram salvos, assim como o exemplar de Os Lusíadas, presente único que os aviadores levavam para ofertar no Brasil e que se encontra exposto no Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro.

O ponto alto da viagem foi, todavia, A espantosa tirada Praia-penedos, pois confirmou o rigor e a exactidão da navegação feita, bem mais meticulosa do que correntemente se fazia nos navios. O caso do Paris City, cujo erro de navegação era de 17 milhas e que mercê desse erro encontrou o avião, é concludente.

Os objectivos científicos foram totalmente alcançados, sendo os Portugueses, portanto, pioneiros na navegação aérea astronómica, como o foram na navegação atlântica e noutros oceanos.

Ainda hoje o princípio do sextante de Gago Coutinho é adoptado pela navegação aérea, mesmo nos mais velozes aviões a jacto, que não deixam de fazer os seus pontos nos voos a longa distância utilizando os Astros, não obstante os vários sistemas de ajudas electrónicas de que actualmente dispõem.

Os objectivos políticos também foram alcançados como se viu pelas declarações de membros do Congresso.

No que respeita as relações com o Brasil, apesar dos Hiltos e baixos que entretanto se verificaram, atingiram na altura um ponto cimeiro, e hoje são felizmente o que todos sabemos e apreciamos devidamente.

E imperioso não esquecer, e com profundo desgosto, que Sacadura Cabral desapareceu no canal da Mancha com o seu avião em Novembro de 1024 - aos 43 anos - quando das suas varonis e excelsas qualidades em plena pujança muito havia a esperar, para maior glória de Portugal .