O Sr. Almeida Garrett: - Sr. Presidente: Suponho estarmos chegados no fim do debate na generalidade da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1978.

Perdoar-me-ão VV. Ex.ªs que, retardando o fim da apreciação, não possa ter ilusões sobre a possibilidade de o enriquecer. Mas, em consciência, sinto, que não devo calar o meu depoimento.

Meus Senhores: A discussão parlamentar da proposta de lei de meios tem dois sentidos e presta dois serviços: por um lado, possibilita a ampla discussão dos problemas suscitados pela conjuntura em que vai vigorar e pelos programas que a enformam ou que com ela se relacionam, e, por outro lado, traduzindo a actuação económico-financeira que o Estudo se propõe realizar no exercício seguinte, permite a Câmara - e, através dela, no País que representa- avaliar da correcção ou incorrecção das práticas para que se pede autorização, no campo económico financeiro em que aquela lei é proposta. Tal avaliação constitui o cerne da intervenção parlamentar nesta matéria; e não pode esquecer-se ou subestimar-se o facto sem grave risco de adulteração de todo o quadro em que se insere e desenvolve uma lei de autorização das receitas e despesas.

Estou inteiramente à vontade para chamar a atenção para o problema. Na verdade, sou dos que têm defendido que à fria exposição de uma lei que se limite a enunciar os preceitos relativos à autorização geral para a cobrança das receitas do Estado e demais recursos necessários à administração financeira, ao pagamento das despesas públicas no próximo exercício, bem como aos princípios a observar na elaboração do orçamento das despesas para o ano em causa - sou dos que têm defendido que à fria exposição de uma tal lei se deve juntar uma palavra sobre o programa económico-financeiro a que anda ligada, buscando colocar a gestão a curto prazo no quadro geral da política económica e financeira, de modo a atender aos condicionalismos conjunturais significativos e a en caminhar toda a política económico-financeira do exercício para a prossecução dos objectivos por que se há-de determinar o nosso esforço colectivo nos próximos anos.

Paralelamente, sou dos que pensam -e claramente o têm expresso e defendido nesta Câmara - que é altamente desejável uma coordenação, tão perfeita quanto possível, das várias políticas empenhadas naquele nosso esforço colectivo, bem como uma coordenada utilização de todos os meios postos ao seu serviço, sejam quais forem os domínios considerados, as áreas nacionais, abrangidas e os centros responsáveis pelo seu comando.

Estou, pois, inteiramente à vontade para me pronunciar a este propósito.

Perante uma proposta de lei de meios, pergunto a mim próprio qual é verdadeiramente o campo das interrogações e exigências a fazer. E salta como resposta, no simplismo das coisas elementares lógicas, que as grandes perguntas hão-de situar-se à volta da correcção ou incorrecção das políticas e procedimentos e conómico-financeiros que propõem, da sua adequação ou inadequação à situação conjuntural e ao processo que, tendo de percorrer vários períodos anuais, se dirige a metas consideradas os objectivos da actuação política da colectividade.

A essa luz - e só a essa - me parece pode e deve apreciar-se vàlidamente uma proposta de lei de meios; de outro modo, o que se põe em causa é a própria natureza, extensão e características da lei, retirando o diploma do quadro em que, constitucionalmente, o Governo o tem de situar.

Vozes: -Muito bem!

desdobramento do plano em programas anuais de execução e a série de actuações do Estado, no campo da economia e das finanças, necessárias para promover um condicionalismo adequado àquela execução ou tradutoras de iniciativas ou intervenções públicas visando realizar projectos programados no plano ou provocar efeitos requeridos pelas suas realizações.

É a essa série de actuações estaduais em matéria económico-financeira que se dedica o programa de uma lei de meios: daí o seu carácter instrumental face à política global prosseguida no período e a ênfase especialíssima que naquela lei tem de ser dada as medidas de natureza conjuntural.

Assim entendida, a lei não pode, sob pena de incoerência, desviar-se do quadro que lhe é determinado pelo programa global: os seus objectivos terão de ser, em última análise, os desse programa ou a ele referidos; as suas preocupações, um reflexo das que enformam a política que o programa traduz, as suas medidas, um corolário das opções que, face aos instrumentos de política disponíveis e ao condicionalismo, existente ou previsível para o ano em causa, tenham de ser tomados para promover uma actuação coerente e eficaz.

Compreende-se, pois, que, perante o condicionalismo em que se desenvolve a nossa economia e se enuncia a correspondente política, a proposta consagre a permanência da constelação de objectivos, quer aqueles por que se orienta a acção a médio ou longo prazo, quer os que determinam as práticas de carácter conjuntural. E não só a permanência dos objectivos, mas ainda a de muitas das fórmulas usadas nas medidas de política propostas.

Sinceramente o afirmo: nem outra coisa seria de esperar. Mantendo-se as grandes finalidades por que se orienta o nosso esforço colectivo e subsistindo as condições em que ele terá de ser exercido, como não havia de consagrar-se a permanência dos objectivos, preocupações e intervenções económico-financeiras?

No último ano de execução do III Plano d e Fomento - pano de fundo das políticas programadas nas últimas leis de meios - poderá honestamente amarrar-se aquela relativa permanência ao pelourinho das velharias inadequadas, estigmatizando-a com o ferro do imobilismo e centrando nesse aspecto a apreciação crítica da proposta em debate? Em vez de me rebelar contra essa prática curvo-me com respeito e consideração perante o Sr. Ministro dos Finanças, pelo alto exemplo de isenção e de responsabilidade que dá ao ter a coragem de resistir às tentações de fácil pessoalismo de uma colheita de louros