O Sr. Casal-Ribeiro: - Por amor de Deus não diga isso!

O Orador: - E de que maneira me atrapalho às vezes.

O Sr. Casal-Ribeiro: - A prova de que V. Ex.ª não se atrapalha é que está a dizer o que se está a ouvir.

O Orador: - Bom! Isso é outro aspecto da questão, Sr. Deputado Casal-Ribeiro.

Ora bem, eu respondo à primeira pergunta: V. Ex.ª desculpe eu já me esqueci...

O Sr. Casal-Ribeiro: - V. Ex.ª não liga importância nenhuma às coisas que nós lhe dizemos, eu principalmente.

O Orador: - Pelo contrário. Então ao Sr. Casal-Ribeiro eu ligo imensa importância.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Eu estava a perguntar a V. Ex.ª se acha bem e se concorda que na Igreja, ou em qualquer outro sítio, se discutisse ou se discuta a legitimidade da presença de Portugal no ultramar.

O Orador: - Ora aí está uma pergunta objectiva e concreta e a que eu respondo também objectiva e concretamente: Acho, sim senhor. Não só na Igreja, como em qualquer outra parte.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Que se deve discutir a presença de Portugal no ultramar?

O Orador: - Sim, senhor!

O Sr. Casal-Ribeiro: - Então não preciso de mais nenhuma resposta de V. Ex.ª Está realmente politicamente definido para mim, e de uma vez para sempre.

O Orador: - Ainda bem, Sr. Casal-Ribeiro!

O Sr. Henrique Tenreiro: - Bem definido!

O Sr. Cunha Araújo: - Tristemente definido!

O Orador: - Ainda bem, Sr. Comandante.

O Sr. Henrique Tenreiro: - Comandante não, almirante.

O Orador: - Desculpe, Sr. Almirante.

Portanto, eu continuo, voltando um pouco atrás.

É aqui, nesta terra glorificada pela fidelidade à Igreja, que no dia 31 de Dezembro os católicos reunidos numa capela para discutirem a justiça, a paz e a guerra são expulsos do templo por ordem do Governo, presos e, como fosse pouco, demitidos dos seus cargos públicos.

O Sr. Dias das Neves: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Tenha a bondade.

O Sr. Dias das Neves: - Eu penso que aí não foram demitidos os católicos, mas sim os funcionários públicos, os cidadãos que estavam em contravenção com as leis que temos em presença.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Aí está um distinguo escolástico muito apropriado...

Não foram os católicos, mas foram, sim, aqueles indivíduos que estavam na igreja e que por acaso eram católicos.

Vozes: - Não! Não! Eram funcionários públicos! Eram desordeiros!

O Orador: - Ah! Eram desordeiros. Então eram católicos desordeiros que lá estavam.

O Sr. Cunha Araújo: - Estavam com ofensa dos Poderes Públicos e dos ideais que nos informam. Que informam a grande maioria da Nação.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Se me dá licença, eu vou continuar.

O Governo não se satisfaz com privar os fiéis da liberdade ...

O Sr. Henrique Tenreiro: - Não apoiado.

O Orador: - Não? É mentira?

O Sr. Henrique Tenreiro: - Não é mentira, mas não apoiado.

O Orador: - Ah! Bom! V. Ex.ª não concorda! Continuo: o Governo não se satisfaz com privar os fiéis da liberdade, encarcerou-os e impediu-os ...

Vozes: - É horroroso, é repugnante!

O Sr. Pinto Castelo Branco: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Tenha a bondade.

O Sr. Pinto Castelo Branco: - O Governo não se preocupou, nem tem que se preocupar com os fiéis, mas sim com esses maus fiéis, católicos, não católicos ou pseudocatólicos. O Governo não poderia deixar de c fazer, porque senão trairia a sua missão. O Governo deve preocupar-se com os cidadãos, é a sua obrigação. Quer V. Ex.ª queira, quer não, estamos em guerra. Praticamente todos os dias morrem irmãos da mesma ou de outra cor que a nossa, mas que são todos nossos irmãos, portugueses como nós, vítimas de actos de terrorismo que V. Ex.ª sabe tão bem como eu que são fomentados do exterior e não do interior.

Peço desculpa a V. Ex.ª para lhe dizer que cheguei a semana passada de Angola (e por isso faltei às primeiras sessões deste mês), e lá continua a haver vítimas civis quase todos os dias por causa dos interesses estrangeiros, por causa dos terroristas, que só não são condenáveis por serem contra Portugal. E é esta guerra que os tais católicos ou pseudocatólicos estavam a querer discutir, apoiando-a, com isso, numa capela.

E V. Ex.ª sabe também que Nosso Senhor Jesus Cristo disse que aquilo que é de César deve ser dado a César e aquilo que é de Deus deve ser dado a Deus. Ora, o que se estava a discutir era essencialmente um problema de ordem política, e não religioso - era um problema de César, e o Estado tinha de intervir.

Vozes: - Muito bem!