ser mais rigoroso sob o ponto de vista de uma terminologia consagrada. Imagens como a da morte, do Sol, do ciclo das estações, são de há muito utilizadas para ligar as pessoas nas liturgias, nos movimentos de massa, na educação moral, como sustentáculo e última raiz das ideologias.

Porque nunca tínhamos saído de nossa própria cultura, durante muito tempo se pensou em mitos colectivos «naturais» - era a tese de Jung.

A verdade é que a cultura de massa tende a substituir esse «imaginário colectivo» tradicional por um novo.

Mais ainda: o novo aparece como não abstracto, ilustrado ao vivo, mais autêntico. É por isso mais forte.

Valerá a pena tentar alguns exemplos. Quem não reparou que a imagem tradicional da cidade «Babilónia devoradora» foi substituída pela da cidade onde se comprova que as pessoas podem viver (até porque lá vivem muitas), onde há muito mais oportunidades, conforto, progresso, liberdade ... Onde fica o modelo do agricultor, submetido e sacrificado pelas leis da Natureza, perante o do técnico, capaz de orientar e submeter essa mesma Natureza?

Mais que uma mudança de cultura, somos capazes de ter iniciado uma mudança de civilização. Temos consciência disso?

Estamos, ao menos, a ser capazes de enfrentar corajosamente e assumir a ideia de que o nosso mundo e o nosso tempo são de evolução e de mudança e que as próprias imagens de mudança e movimento se opõem às estáticas?

Aqui entronca a maior dificuldade: não só genericamente, como, muito especialmente, para Portugal.

É que, por um lado, todo o tempo «antigo» está próximo e ainda vive perto de nós, e o tempo novo, em boa verdade, talvez nem sequer tenha começado.

Mas, mais do que isso, muitos de nós ainda não fomos sequer capazes de o aceitar. Há coisas, factos, ideias, que, quando muito, assimilámos.

Mas assimilar é tentar apropriar-se, absorver no sistema que tínhamos. É por isso que é mais fácil aceitar o desenvolvimento ou os acordos económicos europeus como aquisição do que como mudança. Mas é a mudança, são as transformações inevitáveis que verdadeiramente assustam e geram a recusa (expressa ou tácita).

Creio que não poderá negar-se que, na sua maioria, é através dos novos meios de comunicação social que se exprimem quantos procuram um sentido novo para um tempo novo.

Mas também não me parece que possa esquecer-se uma outra realidade complementar: a de que os meios de comunicação de massa também são «conservadores» e contribuem para reforçar ideias correntes e preexistentes. Como escreve Cazaneuve (in Lês Pouvoirs de la Télévision, col. Idées, pp. 178-179): c[...] para agir sobre a opinião pública, é mais fácil criar atitudes inteiramente novas ou apresentar mensagens como dizendo respeito a problemas novos, em relação aos quais ninguém tenha ainda uma opinião bem estabelecida, do que atacar essas convicções de frente pretendendo substituí-las por tomadas de posição diametralmente opos tas. A melhor argumentação arrisca-se a ser inútil se, desde o início, é apresentada como em contradição com as ideias já admitidas.

Quereria só acrescentar que, ainda assim, nada se altera na ideia de serem os meios de comunicação modernos os grandes foros culturais do nosso tempo.

E que fundamentalmente, e porque de uma interacção sempre temos falado, eles irão, aqui, reproduzir as condições próprias da sociedade em que se integram ou dos grupos que os comandam.

Aqui termino a premissa maior do raciocínio que tentei transmitir.

Parece-me, com efeito, que, sem que seja brusco o salto, podemos passar já ao caso português. Com ele concluindo, até, a última das ideias que tinha esboçado.

Falava eu dos meios de comunicação como foro em que se reproduzem as condições próprias de uma sociedade ou dos grupos que as comandam.

É altura de, ainda que repetindo-me, voltar a dizer que, aqui, está em causa a atitude de uma sociedade perante o futuro.

Creio que entre nós a atitude dominante começou por negar a própria possibilidade de evolução, progresso ou desenvolvimento, ou tentou convencer-se de que o encanto da vida bucólica e pastoril superava a atracção da casa mais confortável, da escola, da electricidade, do melhor salário.

Tudo se misturou com a tentativa de convencimento de uma auto-suficiência e com o culto do passado transformado em legitimação. A história tornou-se uma coutada, facilmente apropriada com o objectivo evidente de limitar, por um lado, a visão crítica do presente, por outro, a construção do futuro.

Creio que o sentido e a consciência da história são extremamente importantes, mas é preciso perder-se o espírito de visitante cerimonioso e embasbacado de museu: a história não parou; continua, todos os dias, a fazer-se. Agora por nós, por muito que tentemos fugir à responsabilidade.

Para além das falsas defesas psicológicas e culturais (também aqui já o disse), alimentámos a esperança de que todas as mudanças fossem fugazes e passageiras e tentámos evitar-lhe o alcance ou atenuar-lhe os efeitos.

Os resultados estão demasiado à vista. O avestruz não só não costuma iludir o problema presente como, suponho, menos ainda resolve os do futuro. Gostaria que fôssemos capazes de tirar a cabeça do conforto da areia.

O que queria perguntar é até que ponto a política de informação que possuímos corresponde ao desejar a construção do futuro e a tomá-lo, corajosamente, em mãos ou ao pretender avolumar ou manter as indecisões, as meias decisões, numa recusa de mudar e de abandonar antiga «segurança».

Acrescentarei ainda que os meios de comunicação social reforçam essa atitude de recusa sempre que estão submetidas ao Poder, às censuras e ao dirigismo ou quando, por demagogia ou baixo comércio, renunciam a educar e a despertar.

À sensação de que muito me fica por dizer, houve que sobrepor-se a necessidade de me conter, quanto possível, nos limites de tempo regimentais.

Passo assim, imediatamente, a concretizar o caso português.

Não julgo estar em contradição comigo mesmo ao propor que olhemos para o presente. Por meu lado,