E esta segunda tarefa, muito trabalhosa, muito pouco espectacular, afigura-se-me de uma importância bastante especial e de uma nobre e elevada utilidade para todo o País.

Todavia, nem por isso o novo Plano de Fomento deixará de ter sido elaborado com participação dos Portugueses.

Ele terá mesmo a virtude de representar um primeiro (embora tímido) passo no caminho da efectiva participação dos cidadãos em mais uma zona da vida pública nacional.

Foi nesta qualidade, de obscuro e longínquo membro de um grupo de trabalho do planeamento regional, que, até este momento, me sentia também participante da preparação do IV Plano. Como me sentirei quanto à execução dele, na medida em que às comissões regionais compete igualmente o acompanhamento dessa execução, cumprindo-lhes alertar o Governo para algum desvio, demora ou omissão, relativamente a pontos que sejam de considerar.

Isto não significa que à Assembleia Nacional não pudesse ser cometida uma acção mais completa e mais ampla para a perfilhação consciente dos princípios que ora lhe são propostos. Como, aliás, já no campo meramente consultivo, certas entidades poderiam ter dado ao Plano muito mais e muito melhor.

É do domínio público que o calendário dos trabalhos preparatórios não conseguiu ser cumprido. Pelo menos no que respeita às comissões de planeamento regional, dos três relatórios programados só os dois primeiros, afinal, lhes foram pedidos, frustrando-se assim as esperanças que alguns depositavam num terceiro relatório mais amadurecido e mais completo.

A própria orgânica das comissões - que têm três escassos e atribulados anos de vida - só permitiu um contributo restrito de pessoas, que tensões mal desfeitas e próprias da falta destes hábitos tornaram ainda mais limitado.

Não foi possível até hoje dinamizar os homens e os grupos quanto eles o deveriam ter sido, acordando-os para a apaixonante batalha do desenvolvimento, e ampliando a consulta e a auscultação dos possíveis interesses a considerar com validade, pelo menos a nível local.

Não foi possível também o que parecia ter sido mais curial: a aprovação da lei na sessão legislativa anterior a esta, a organização definitiva do Plano durante as férias parlamentares, de maneira que, em 15 de Novembro, já fosse presente à Assembleia Nacional o seu primeiro programa anual de execução.

É, todavia, sabemos, e não devemos ocultar, o extraordinário esforço que demandou a preparação do projecto, esforço em que é evidente terem claudicado alguns sectores - parece-nos isto claro no caso da pesca, em que sentimos uma autêntica perplexidade perante problemas que ... serão objecto de estudo durante a execução do próprio IV Plano de Fomento (pp. 383-393). Nem o enorme passo que, apesar de tudo, este Plano representou relativamente aos demais que o precederam.

É por todo o exposto que creio dever começar-se, desde já, a pensar -paralelamente com a execução do IV - na efectiva preparação do V Plano de Fomento. E, nomeadamente:

No papel mais amplo que nele, através das comissões de planeamento regional, serão chamados a desempenhar os cidadãos, os estudantes, os grupos profissionais e os económicos e os culturais, seja na realização de inquéritos, seja na elaboração de relatórios, seja na mentalização da população para o processo do desenvolvimento;

No papel dos sectores da Administração, seguramente já então reorganizados em moldes de maior eficácia e menor desconfiança, designadamente no campo da colaboração com outras entidades e no da programação a médio e a longo prazos;

No papel final desta Assembleia, que só por acaso será constituída por técnicos, e que fatalmente não abrangerá apenas entusiastas do desenvolvimento, mas que representa a Nação, ao ponderar, com tempo e com calma, com eventual acesso aos trabalhos preparatórios, as grandes opções que orientarão a actividade sócio-económica que convenha promover ou estimular no período .que vier a seguir.

parece-me imperdoável que esta discussão venha a encerrar-se sem uma referenda muito especial.

Estou desta maneira a chegar ao segundo assunto - o de fundo - que desejava abordar nesta minha intervenção. Quero referir-me ao voto de vencida da Procuradora à Câmara Corporativa engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo, emitido em 18 de Setembro passado, aquando do parecer subsidiário sobre investigação e desenvolvimento tecnológico, e que consta das Actas da Câmara Corporativa, n.º 176, de 27 de Outubro próximo passado, pp. 2941-2944. A este voto de vencida foi feita ampla referência por um sector, bastante restrito, da imprensa portuguesa.

O voto da engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo desdobra-se em duas partes. A primeira situa-se num nível puramente ideológico, e a segunda, dela decorrente, num nível metodológico.

Aquela Procuradora, com notável desassombro e coragem moral, põe em causa, radicalmente, as ideias de que a vida de um país seja determinada pelo incentivo da competição, e de que o modelo para o desenvolvimento a seguir em Portugal deva ser o da Europa desenvolvida. A esse modelo contrapõe, em sugestão, a génese de um outro, que assente no efectivo conhecimento do povo (português, designada-