São conhecidos os erros da impropriamente chamada sociedade de consumo. Com lucidíssima ênfase se afirma no preâmbulo da proposta de lei sobre o IV Plano de Fomento que a decisão e firme apoio com que o Governo impulsionará as transformações necessárias à nossa sintonização com a Europa desenvolvida «não farão ignorar, todavia, os riscos que tal evolução comporta, nem menosprezar a intensidade do esforço requerido para os controlar. É que uma abertura incondicional e menos atenta aos estímulos que o mundo desenvolvido lança e aos figurinos que propõe poderia significar o enfeudamento aos seus interesses, o domínio pelos poderosos grupos económicos que o movimentam e, afinal, a sujeição do País aos aspectos negativos que o desenvolvimento industrial avançado não têm sabido evitar - mas de que já estão activamente conscientes os povos, das nações mais industrializadas».

Conhecer e diagnosticar os erros da chamada sociedade de consumo, procurar o caminho para as rectificações necessárias e planificar soluções novas é trabalho da inteligência; exige ideias e não emoções, exige estudo, problemática, determinação de meios técnicos, científicos e humanos, espírito crítico (que não é o mesmo que destrutivo espírito de crítica), investigação permanentemente em .aberto. Mas tudo isto nada tem que ver com repetir slogans em coro e cultivar nos intervalos o dolce far niente.

À juventude realmente estudiosa, que é o Portugal melhor de amanhã, daqui rendo as minhas homenagens de professor que sou e de estudante que quero sempre continuar a ser. E sobretudo àquela juventude trabalhadora que, depois do seu duro trabalho quotidiano nas empresas, nas fábricas, nos arsenais, em todos os lugares em que se trabalha por um mundo melhor, consegue ainda ter a força de vontade suficiente para estudar - em cursos nocturnos, em estágios de reciclagem ou de pós-graduação, ou até em suas próprias casas, autodidacticamente, numa ânsia incontida de saber .

E também por isso é que admiro, em especial, aquela juventude portuguesa que se bate nos campos de batalha pela perenidade da Pátria, una e indivisível - na Guiné, em Angola e em Moçambique -, e que, em muito casos, nos intervalos dos combates, ainda consegue disposição de espírito e energia para estudar, apresentando-se a exame nas épocas normais e extraordinárias para militares.

Aliás, essa reflexão analítica a que se chama filosofia, e que só é possível em tempo de estudante, foi a nota mais característica da mais célebre civilização humana: a civilização grega. E estou certo de que será essa de novo a mais autêntica forma de afirmação do homem como homem, virado então essencialmente para o estudo da verdade, nesse tempo que há-de vir quando os homens aprenderem formas de convivência social, em que o aforismo «homo homini lúpus» seja uma recordação da pré-história da humanidade e o amor atinja na Terra o seu mais profundo significado.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Farei, por último, incidir a minha análise sobre um sector que, na minha qualidade de Deputado pelo ultramar, considero dever merecer especial referência - o capítulo sobre a educação em Angola.

A obra que no sector da educação se tem realizado, sobretudo na última década, em Angola pode qualificar-se de verdadeiramente excepcional. Mas seria dar provas de falta de sentido das realidades não reconhecer nem diagnosticar com todo o cuidado as imperfeições, insuficiências e lacunas e especialmente o muito que está por fazer. A virtude de saber fazer, com toda a objectividade, esse diagnóstico tem-na o projecto do Plano no que a este sector se refere; como tem a indiscutível virtude de apontar os caminhos a seguir, os objectivos a concretizar com explicitação das medidas de carácter global e das específicas dos diferentes graus de ensino no que respeita aos aspectos materiais e humanos, à reestruturação dos serviços ao dimensionamento e funcionalidade das realizações.

Trata-se, com efeito, de uma análise e planificação rigorosamente fundamentada em investigação estatística, com plena visão das dificuldades a vencer e dos meios para as enfrentar e, no entanto, nitidamente virada para o futuro. O sector não está, porém, planificado em relação a todo o hexénio, e isso se me afigura também de grande vantagem. Na verdade, embora prevendo-se desde já um programa de investimentos e financiamentos da ordem de 1 220 000 contos, pareceu prudente que a planificação ficasse em aberto a partir do 2.º triénio, atendendo a que, em territórios cuja expansão nem sempre é previsível com rigor, convém não espartilhar, em esquemas que ulteriormente pode verificar-se não serem os mais adequados, as próprias realidades futuras.

Mas, precisamente porque assim é, julgo vantajoso deter-me num aspecto fulcro! que pode vir a determinar outras incidências de não menor significado. É o seguinte: o projecto estabelece, como é sabido, que é object ivo prioritário em relação à metrópole o atingir até final do hexénio a efectiva extensão da escolaridade obrigatória para oito anos, processando-se através de quatro anos de ensino primário e outros quatro de ensino complementar.

Ora, sucede que o projecto prevê que em Angola a esquematização seja um tanto diferente. Diz o texto do projecto:

Perante a realidade actual, que demonstra que o ciclo preparatório do ensino secundário é encarado por grande maioria dos alunos que o frequentam como um tipo de ensino terminal-- parece conveniente modificar a estrutura do ensino básico complementar, .bifurcando a única saída agora existente em três tipos de ensino, dos quais dois de tipo terminal e um do tipo de orientação. Ter-se-ia assim:

Ciclo preparatório, idêntico ao actual, para as camadas populacionais que normalmente prosseguem os estudos;

Dois tipos de ensino complementar: 5.ª e 6.ª classes e ensino técnico elementar (escolas de artes e ofícios remodeladas), como tipos de ensino terminal.

Esta dualidade de esquemas diferentes para a metrópole e para o ultramar (e digo ultramar porque, embora não haja expressa referência à opção nos planos estabelecidos para as outras parcelas ultramarinas, seria talvez essa a alternativa a adoptar), esta dualidade de esquemas, dizia eu, levanta para já as