Durante a minha curta estada foi-me possível conversar, contactar e auscultar grande parte da população, o que me levou a concluir que os meus conterrâneos, mercê da forte vontade e do bom senso, se encontram no caminho exacto, com um conhecimento perfeito no que diz respeito à afronta e à crise que a província atravessa de momento e quanto ao esforço que Portugal vem desenvolvendo, não só para manter a Pátria una e indivisível, mas também, e sobretudo, ao sacrifício que vem realizando para impedir as agressões vindas do exterior.

Posso afirmar que a população da Guiné, embora torturada e sacrificada, hoje, mais do que nunca, está a dar uma lição de heroicidade, de altivez e de nobreza ao Mundo, lutando, não pela sua terra, mas para que Portugal sobreviva e passe a ser respeitado no Mundo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Deste modo, meus senhores, orgulho-me de pertencer àquele povo que sente e vibra a bandeira verde-rubra, que quer continuar a ser português, e galvanizado por estes predicados manter indestrutível a unidade da Pátria e espiritual.

As lágrimas, as fendas e as chagas que aquele povo deseja enxugar, sarar e curar, e para as quais a isenção de carácter e o bom senso deste mundo conturbado de hoje não repara, servem apenas para incentivar, fortalecer, incitar e conceder mais coragem àquela população, constituindo uma preciosa recompensa para ali continuar a viver.

Meus Senhores Não duvidem - e deste meu lugar quero chamar a atenção do Governo- de que o fulcro, a «mola mestra», de toda a guerra do ultramar assenta na Guiné Portuguesa, e, uma vez perdida esta, Portugal jamais poderá pensar em defender e manter as restantes províncias ultramarinas.

O Sr. Neto Miranda: -V Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Neto Miranda: - Todos nós estamos a ouvir com o maior interesse as palavras de V Ex.ª, mas a forma introdutória com que elas se apresentam parece-me que justifica uns momentos de atenção. A frase que V. Ex.ª apresentou relativamente aos efeitos da perda da Guiné é uma frase que, vindo na linha de rumo e no sentido de tudo quanto V Ex.ª expôs, não é de dúvida de fé. É antes uma frase de reforço e uma frase de intenção Suponho que a Câmara está disso convencida, que V. Ex.ª, ao fazer essa afirmação, quer significar precisamente que é com a vontade indómita que desde 1961 nós temos acompanhado a luta no ultramar, que é com essa mesma vontade que temos reunido todos os elementos para vencer a luta que nós é imposta, é com essa vontade que nós podemos e devemos fortalecer ainda mais essa unidade para defesa de todas as parcelas da Nação e para defesa da sua unidade.

As palavras de V Ex.ª tenho, pois, que as considerar como palavras de fé, e não como palavras de arrest amento. Muito obrigado.

O interruptor não reviu.

O Orador:-Muito obrigado pela sua intervenção. Na realidade, a minha intenção é precisamente essa, para que Portugal reforce a acção que tem exercido no ultramar.

O Sr Casal-Ribeiro:-E a reforce também na retaguarda, principalmente Reforce a retaguarda, que é onde o País pode claudicar mais e de forma mais grave.

O Orador: - Precisamente. Muito obrigado.

Prosseguindo. Deste modo, cabe aqui perguntar.

Como resolver o problema ou quais as directrizes a seguir quanto ao futuro da província?

A meu ver, e salvo douta opinião em contrário, o País, de momento e com urgência, apenas tem dois caminhos a seguir.

1 º Aumentar o número de efectivos das forças armadas estacionadas na província,

2 º Promover e intensificar o seu desenvolvimento sócio-económico.

Quanto ao primeiro quesito, embora não seja militar, entendo que o aumento do número de efectivos das forças armadas não significa apenas um acréscimo do potencial humano, nus sim, e sobretudo, uma reduplicação de material bélico, mormente no que diz respeito à sua qualidade.

Estou certo de que VV. Ex.ª não desconhecem de que aos nossos inimigos não lhes falta material, quer em quantidade, quer em qualidade, e pelo que tenho ouvido dizer em qualidade possuem uma força muito superior à nossa. É impossível suportar uma guerra com armas desiguais, principalmente se cabe a sorte ao inimigo de possuir as melhores.

Aproveitando a oportunidade que se me depara, quero prestar aqui as minhas sinceras homenagens aos que tombaram na província que represento, que não morreram, porquanto das suas cinzas brotará com certeza uma Guiné maior.

Não posso deixar de enviar daqui uma mensagem fraternal e de agradecimento às Corças armadas que ali trabalham e lutam para que a paz volte à Guiné.

É, como guineense, permitam-me que desta magna Assembleia dirija uma saudação especial de consideração e de respeito aos comandos africanos, única e exclusivamente constituída por naturais da província, e que tão galhardamente têm sabido defender o seu solo, não apenas com a força das armas, mas principalmente com a força do coração.

Vozes:-Muito bem!

O Orador: - No que diz respeito ao desenvolvimento sócio-económico, é corrente ouvir dizer-se aqui na metrópole de que a Guiné é uma província pobre e sem recursos, de que é uma província que apenas dá prejuízos, pesando grandemente no orçamento geral de Portugal, de que é um dos maiores cancros do País, etc.

Esta grande verdade, embora dita por vezes por pessoas que mal conhecem, ou não conhecem mesmo a Guiné, sou obrigado a confirmá-la, eu que conheço toda a província, eu que já percorri todas as suas povoações, porquanto a minha missão é prestar assistência às populações nos próprios aldeamentos. É, pois, com certa mágoa e com certo desânimo que o afirmo a Guiné, presentemente, deverá ser, na verdade, o maior cancro de Portugal!

Mas cumpre perguntar por que é que a Guiné pesa tanto no orçamento geral da metrópole, por que é o maior cancro de Portugal? O que é que já se fez para minorar este peso ou sarar esta doença?