dizem-nos que o vinho americano atenta contra a saúde dos que o consomem, outros, que atenta contra a saúde da economia do sector Se assim é, na linha de uma legislação que vem de longe, em que se tentou proibir a plantação e a cultura do vinho americano, parece-me que, em vez da fórmula vaga do n.º 2 da base X proposta pela Comissão, em que não se sabe se deixa ao Governo ou não a proibição da sua cultura, era preferível atacar frontalmente o problema, como faz a proposta do Governo, e proibir definitivamente tal cultura.

Não me repugna fazer esta defesa, tendo mesmo em mente os princípios enunciados pelo Sr Deputado Veiga de Macedo. Já desde há longos quarenta anos que deixou de haver entre nós uma constituição do tipo daquela que foi firmada há sessenta anos e até anteriormente.

O Orador: - A nossa Constituição não defende de forma absoluta e de qualquer modo o direito à propriedade individual, entende antes, de forma expressa, que a propriedade tem um fim social.

O Sr. Veiga de Macedo: - Mas eu estou plenamente de acordo com a doutrina que a Constituição consagra.

O Orador: - Parece-me que a intervenção do Estado, de que esta Câmara é um dos órgãos, para fazer vingar o fim social da propriedade, não é só um poder, mas antes um poder-dever.

O problema está em saber se as videiras de produtores directos são portadoras ou não daqueles malefícios que os técnicos apontam e que eu não sou capaz de defender nem de negar. Aceito apenas essas opiniões.

Sendo assim, e se o próprio Código Civil hoje está imbuído desse mesmo pensamento, da finalidade social da propriedade privada - e eu não queria responder a um Sr. Deputado que na discussão na generalidade fez uma defesa agressiva, cheia embora de esplêndida roupagem formal, desses direitos individuais dos proprietários-, eu diria que o nosso Código Civil, para além de referir que o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, acrescenta que dentro dos limites da lei, e com a observação das restrições por ela imposta

Há uma disposição genérica no nosso actual ordenamento jurídico civil que diz que é ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente o fim social ou económico desse direito.

O Sr. Veiga de Macedo: - Não é o caso.

O Orador: - Eu direi ainda, que era uma criança e assisti à degola dos produtores directos da minha região Ainda bem que essa degola se verificou, fez-se com excitação, mas sem revolta, e não sem que, passado algum tempo, se reconhecessem os benefícios que daí advieram.

Os produtores directos foram cortados, não foram arrancados, foram enxertados e hoje são ricas videiras que produzem óptimo vinho do Dão.

O Sr. Veiga de Macedo: - É uma espécie de ressurreição depois da «degola» a que V. Exa. se referiu.

O Orador: - Em contrapartida, ainda no meu círculo existe uma região onde se produz um vinho cheio de tipicidade, um vinho que poderia ser lançado comercialmente com marca de origem e numa região que poderia ser demarcada e que não o será porque aí ainda existem cerca de 20% de videiras de produtores directos. Há toda uma região a ser prejudicada porque não se tem a coragem de mandar irradicar dali o produtor directo; refiro-me à região de Lafões. Essa degola, permita-se-me o termo, permite a reconversão Se a videira não for arrancada, mas sim cortada, é um porta-enxerto para ser reconvertida numa videira local.

Estes eram os aspectos de fundo que me levaram a fazer a proposta de alteração que subscrevi. Aproximei-a da proposta do Governo, juntando-lhe apenas alguns condimentos que resultaram do estudo aprofundado da nossa Comissão de Economia.

O segundo aspecto, que eu há pouco considerei, é já um aspecto de formulação técnica. É que não se proíbe a cultura no n.º 1 e no n.º 2, admitem-se apenas medidas de natureza e carácter suasório para levarem as pessoas a fazerem a sua reconversão, ou melhor, levarem os proprietários de videiras americanas a fazerem a sua reconversão.

Mas no n.º 4, que quanto a num salvaguardaria todas as hipóteses que devessem ser consideradas pela Administração no sentido da manutenção, aqui e além, de vinhas de produtores americanos, diz-se que, apodera admitir-se em certos casos a existência de vinhas e produtores directos. Ora, se poderá admitir-se em certos casos, a contrario conclui-se que nos outros será proibida. A verdade é que a lei, segundo a fórmula da nossa Comissão de Economia, não proíbe frontalmente a cultura de videiras e produtores directos.

Daqui me pareceu que há realmente uma falha de ordem formal, digamos assim, na elaboração desta proposta de alteração que nos trouxe a nossa Comissão de Economia e, eu pergunto, pois, qual teria sido o pensamento da Comissão: Terá sido o de que a cultura venha a ser proibida pelo Governo? Se assim for, eu direi que nós, Assembleia Nacional, nos estamos a demitir de frontalmente atacar o problema e passar a «bola» ao Governo, o que não parece ser muito justificado.

Se a Comissão de Economia não pretende essa proibição frontal, então direi que o n.º 4 da base X apresenta uma formulação redundante, na medida em que acabarão por ser admitidos, não só aqueles casos em que seja possível a reconversão, como todos e quaisquer outros.

Muito obrigado.

O Sr. Vaz Lacerda: - Não tendo sido apresentada oportunamente qualquer proposta sobre a liberalização do plantio da vinha, não obstante a firme e coerente orientação do Sr. Deputado Roboredo e Silva e a irreverente, mas corajosa, intervenção do Sr. Deputado Homem Ferreira, eu congratulo-me que em ambas as propostas submetidas à nossa apreciação e votação se tivesse salvaguardado a necessidade de estabelecer um regime de tolerante excepção