A realização prática leva frequentemente a dolorosas constatações que paradoxalmente se afastam dos fins sonhados, não obstante candidamente proclamados.

A concorrência de interesses inconfessados, a tacanhez burocrática ou a deformação ideológica podem motivar, não raro, soluções que estão longe de serem as melhores e as que se desejam.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Se a técnica deve ser a ciência ao serviço do homem, a tecnocracia poderá ser difundida como a doença dos espíritos vazios de conteúdo ideológico, ou ainda a ditadura férrea e desumana daqueles congenitamente traumatizados ou, noutros casos, pela sua comprovada incapacidade.

Poderá haver motivações psicológicas poeticamente sonhadas ou capciosamente dirigidas à construção de um clima de adulação que os compense, mas temos de convir que há infiltrações demolidoras e insidiosas que possam comprometer a genuinidade do sistema que dizemos querer construir e que alguns mais parecem querer subverter.

Oportunismos mal disfarçados para aqueles que nunca foram capazes de construir à custa de todos senão capelas para oração mais ou menos privada, onde se promove o culto de si próprios, não podem continuar a ter a audiência que contraria os autênticos objectivos nacionais.

Neste sentido parece ver-se a orientação do discurso em Castelo Branco do lúcido e inteligente Ministro Clemente Rogedro.

Os recalcamentos, de um funcionalismo forcado por limitações pessoais ou razões extrínsecas que marcam as personalidades, não se tornam válidos pela simples adesão calculista a ideias com que se pretendam justificar. Isto para aqueles que não multam consoantemente noutros campos sobejamente intencionais e opostos à nossa construção do Estado social.

Desejamos, pois, ver definida, bem clara e iniludivelmente pelo Governo, na teoria e na prática concretizada, uma política de saúde que seja coerente com os princípios e que não ceda a razões de oportunismos que comprometam ou a demagogia que degrade.

O Sr Mendonça e Moura: - V Ex. dá-me licença? O Orador: - Com muito prazer.

O Sr. Mendonça e Moura: - Eu estou a ouvir V Ex a com o maior interesse, como, aliás, era de esperar, dada a maneira como V. Ex. está a pôr o problema. E penso efectivamente que há problemas fundamentais a considerar E na realidade, no que respeita à orgânica dos cuidados médicos, à orgânica da saúde neste país, é de realçar que muitas vezes se tem ido buscar as soluções precisamente àqueles campos que contrariam os princípios fundamentais em que assenta o nosso próprio Estado, um estado social e corporativo. Muitas vezes temos ido efectivamente procurar soluções aos regimes socialistas, com contradição e com negação dos princípios em que assenta toda a nossa estrutura política É preciso

que assentemos de vez numa cobertura assistencial, numa cobertura sanitária, numa cobertura da saúde que, atingindo a todos e a todos dando as garantias da melhor saúde, das melhores possibilidades de defesa dessa saúde e desse bem-estar, corresponda aos princípios éticos em que o nosso Estado assenta, que são a base afinal de toda a nossa vida política.

Era isto que eu queria dizer em apoio às palavras de V. Ex, Sr. Deputado Moreira Pires.

O interruptor não reviu

O Orador - Muito obrigado, Sr. Deputado, e agradeço imenso a sua brilhante intervenção no sentido de me ajudar nesta exposição à Câmara

Ou nós temos razão e defendemos a nossa razão com realizações coerentes, ou então deveremos mudar, aderindo àqueles que dizemos combater por não acreditarmos na justiça específica do seu sistema nem tão-pouco dos métodos preconizados.

Soluções híbridas de compromisso ideológico diferem sensivelmente de um ecletismo prudente.

A coordenação dos meios destinados à saúde terá de obedecer logicamente ao tipo de medicina com que se pretende servir a Nação.

Num Estado social não caberá jamais uma medicina socialista, que, fosse boa ou má, seria péssima fora do adequado sistema socialista.

Ou não temos tido capacidade de construir uma medicina coerente com os princípios que dizemos defender, ou não termos tido a coragem de sermos nós próprios, acreditando em nós mesmos e no nosso sistema.

Ainda no recente e importante d iscurso do Ministro do Interior ouvimos:

Repudiamos, portanto, as soluções socialistas e de colectivização da riqueza; mas repudiamos com a mesma força um capitalismo sem sentido social e opomo-nos decididamente ao que Salazar designou um dia «flor do mal» do pior capitalismo- a plutocracia.

No caso que versamos, os problemas da saúde terão, como quaisquer outros e sem discriminação, de obedecer à mesma linha ideológica numa totalidade do sistema.

Todo o esquema nacional de saúde deverá cumprir funções específicas no capítulo de saúde pública e profilaxia em exclusivo Já no aspecto curativo, para além de toda a natural orientação, deverá respeitar determinadas constantes, evitando cairmos no estatismo que sob o seu peso esmaga os indivíduos e a sua natural liberdade.

Deverá, não só teoricamente, mas sobretudo na prática, respeitar-se a liberdade para o doente escolher os seus médicos, como a liberdade para os médicos se poderem realizar, evitando frustrações e projectando a sua actividade na sociedade, não como peças de uma máquina social, mas como seres livres e conscientes.

Ao defender uma medicina socialmente organizada em oposição a uma medicina socialista lembro o que paralelamente me sugere o que lapidarmente Marcelo Caetano afirma (p 162, Pelo Futuro de Portugal):

[...] não poderemos desejar a invasão socializante da actividade humana pelos Poderes Pu(...)