tendêncial da proposta de lei, conforme sublinha o parecer da Câmara Corporativa.

Não poderão os juizes limitar os seus conhecimentos ao direito civil ou ao direito criminal. Bem pelo contrário. Continuará a ser-lhes sempre exigida preparação jurídica bastante para a sua possível colocação em Relação onde não vigore a separação de jurisdições ou em secção onde a jurisprudência praticada não seja a que melhor corresponda à sua formação profissional.

E nem a adaptação será difícil, dada a sua formação universitária e o interesse que lhe merecerá a jurisprudência dos tribunais, alheia ao ramo de direito por si mais bem conhecido.

Além de que há todo um caminho percorrido pelos magistrados até aos tribunais superiores no qual não vigora o regime de especialização.

É certo que um juiz, mercê de comissões, poderá atingir a Relação e ser colocado em secção criminal sem nunca ter julgado cível. E essa sua incompleta formação profissional poderá pre judicar-lhe a visão global da questão que lhe é posta, com prejuízo para uma boa aplicação da justiça.

A acontecer, será sempre um caso anómalo, uma situação extrema e um argumento que prova de mais.

Pois não seria pior para a justiça que tal julgador fosse colocado em secção cível?

O ensaio da especialização, que é a proposta de lei, sem outros inconvenientes que não sejam os de ordem geral teórica, é uma experimentação que tem, além do mais, a grande vantagem de colher ensinamentos para o seu progressivo e possível aperfeiçoamento.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr Rómulo Ribeiro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados. No mesmo pendor de esforço legislativo que se vem acentuando noutros domínios departamentais da administração pública, o Governo enviou oportunamente à Assembleia Nacional a proposta de lei n.º 2/XI relativa à criação de secções cíveis e criminais nos tribunais da Relação.

Precedida de um laborioso e destacado parecer da Câmara Corporativa, a referida proposta de lei entra agora em debate sobre a sua apreciação na generalidade.

O conteúdo do respectivo tema incide e consubstancia-se num breve articulado de três números. Mas nem por isso a vasta gama de incidências que nele se reflectem e de consequências em que se desdobra pode escapar à preocupação desta Câmara e à motivação das suas decisões finais.

Efectivamente, o problema da especialização na carreira da magistratura judicial está directamente ligado a uma complexidade de questões, que vão desde o delicado ponto de recrutamento dos magistrados > O jurista que se fixa predominantemente, por exemplo, sobre assuntos de natureza criminal há-de propender (e propende, naturalmente) a um avanço mais profundo na pesquisa do ordenamento jurídico respectivo e na busca da complementaridade de ciências ou de circunstâncias afins. A relacionação destes dados permitir-lhe-á, depois e indubitavelmente, não só uma capacidade de percepção mais pronta, como ainda uma dimensão de perspectivas muito mais dilatada.

O fenómeno é trivial. Encontramo-lo quer no comércio das letras jurídicas, quer, de igual jeito, na prática de qualquer outra actividade intelectual.

No que concerne ao trato dos problemas forenses, uma incidência especializada consequência, desde logo, por parte do agente, certa capacidade técnico-científica mais sagaz e mais precisa. E determina-lhe, por outra banda, num plano de ajustamento psicoprofissional, uma maior inclinação e um progressivo interesse pelas matérias específicas da assinalada especialização.

Mas a natural habitualidade no estudo aprofundado do assunto, a crescente inclinação e apetência funcional do tema, bem como um mais agudo sentido de responsabilidade por qualquer opinião ou decisão que lhe respeite, faz com que o jurista especializado supere e rompa os limites estreitos da própria especialização e, sempre que o julgue necessário, mergulhe no âmbito de ciências complementares ou auxiliares.

A especialização - designadamente no mundo do direito - não implica nem significa uma compartimentação hermética. Muito pelo contrário, a boa compreensão da sua dinâmica e as exigências da sua perfeita exequibilidade impõem uma inserção quase permanente noutros domínios das ciências, das artes e das meras vivências humanas.

Por outro lado, quer a experiência geral da vida, quer a experiência específica do traquejo jurídico dizem-nos, com abundância de casuística, que a especialização da judicatura tem resultado em melhoria de competência funcional, no aument o do rendimento do trabalho e, o que é de maior interesse, na obtenção de soluções mais justas.

Continua a ter-se como duvidosa a eficácia da especialização da magistratura judicial? Mas então por que nos socorremos tanto, e com indiscutível invocação de mérito, dos pareceres e das lições dos mestres de Direito, que normalmente incidem sobre aspectos sectoriais da ciência jurídica e se louvam com o valimento especializado dos seus autores?

É certo que o julgador deve ter sempre em mente a visão global do caso que lhe é posto e a sua inserção no todo social que criou a lei e que a lei deve servir.