uma pátria una e indivisível, com a mesma feição criadora e fraterna, amorável e heróica, altiva, mas generosa, compreendendo perfeitamente, irmamente, o modo de ser de outras raças, de outros continentes, de outras etnias, de outras culturas E pode assim constituir-se com estas variedades, repito, esta pátria singular, a patina mais bela e linda, como dizia um poeta, que «ondas do mar e luz do luar viram ainda». Meus senhores. Temos de voltar-nos pana a figura veneranda do Chefe do Estado, cujo patriotismo, cuja firmeza, cuja serenidade, cuja isenção de espírito são para nós um exemplo edificante, perante o qual nós todos e o País temos de nos curvar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Temos, meus senhores, de nos voltar para o Presidente do Conselho, onde embate a ressaca de todos os acontecimentos, de todas as dificuldades, de todos os descontentamentos, para com o nosso abraço, o nosso apoio e a nossa admiração lhe robustecermos a firmeza e a superioridade com que enfrenta todos esses descontentamentos, procurando dominá-los com a superioridade do seu espírito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Voltemo-nos, meus senhores, para as forcas afanadas da Nação, em que o País tem de confiar.

Disse há muitos anos que as forças armadas de um país são a sua espinha dorsal, é indispensável que a espinha dorsal de um país, que são as suas forças armadas, se mantenha bem firme.

Se um dia as forças de dissolução, que também por aí existem, conseguissem fazer quebrar essa espinha, desviá-la por qualquer forma, ai de nós, meus amigos, o que seria deste País!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Temos de confiar nas forças armadas da Nação, que se têm batido heroicamente durante estes treze anos, regando o caminho percorrido com o seu sangue.

Devemos confiar na nossa juventude, que se sacrifica e bate nas terras de além-mar, sem outra recompensa que não seja a do dever cumprido e dos sacrifícios prestados a bem do futuro deste País.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Temos de confiar no povo português, que moureja e trabalha e se sacrifica e acompanha com os seus votos e as suas orações o esforço dos seus filhos e a sorte das nossas armas.

Meus senhores. O povo diz que depois da tempestade vem a bonança.

Eu direi que, depois das restrições da guerra, há-de raiar um dia a hora luminosa da vitória, de uma paz gloriosa e fecunda.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr Almeida Santos: - Sr Presidente, Srs Deputados. Acaba de fechar os olhos para sempre o jornalista Ferreira da Costa.

A morte de um homem não tem, na realidade, qualquer tanscendência ou relevo no ciclo biológico do Universo. A todo o momento se vão apagando à nossa volta rostos e figuras que fizeram parte do nosso círculo pessoal, assim se vão, sem remédio, os nossos afectos, os companheiros do dia-a-dia, assim desaparecem, ironicamente igualados, os grandes e os pequenos deste mundo.

Todavia, a morte de Ferreira da Costa veio, sem dúvida, acordar um eco muito longo e sentido dentro e fora do País, porque acaba de imobilizar-se para sempre aquela torturada mão que arrancou soberbas cintilações à velha língua portuguesa, língua que ele afeiçoava como poucos a uma prosa plástica admirável, para nos descrever eventos, homens e situações.

Porque Ferreira da Costa, quer como ficcionista, quer como correspondente de guerra, quer ainda no silêncio do seu gabinete, esmagando cigarro após cigarro na gestação de um artigo de fundo, era sempre um artista, grão-senhor de todos os segredos e de todos os matizes capazes de agarrarem e subjugarem o leitor da sua prosa.

Não vou aqui recordar a sucessão de lances aventurosos e trágicos, de honrarias, de homenagens e de dolorosos passos que constituíram a sua vida.

Como qualquer outro homem de elevada estirpe intelectual, Ferreira da Costa haveria fatalmente de sofrer, como sofreu na carne e no espírito, as frechadas da inveja e da malquerença, como teria, fatalmente, um dia, que ser distinguido e compensado pela consagração oficial do seu talento.

Desde as páginas de Na Pista do Marfim e da Morte até Os Olhos dos Rouxinóis, de pungente filosofia, até àquelas outras proféticas e terríveis escritas em Luanda, no deflagrar do terrorismo, quantas produções admiráveis nos deixou!

E é sobretudo aqui que desejo deter-me um pouco, para relembrar, como um dever, aquilo que Ferreira da Costa representou para Angola e para o País nos dias alanceados de Março e Abril de 1961.

Não vou evocar, nem quero evocar, os morticínios e as chacinas que então deram brado e ocuparam as manchetes da imprensa de todo o Mundo. E não o farei porque, na verdade, a dor e a morte são grandes de mais para serem especuladas com adjectivos sonoros, e ainda porque, todos os homens, todas as mulheres e todas as crianças de Angola, brancos, pretos e mestiços, que viveram então horas de pesadelo, guardam hoje essas amargas recordações no recato e no silêncio de si mesmos, e têm horror à lástima e à exibição das suas cicatrizes.

Comparada com a de 1961, poderia dizer-se que a Angola de hoje desfruta de paz, pois vive-se ali na euforia do muito que se vai realizando, com trabalho, com esforço e com dedicação. Mas estou certo de que ninguém naquela terra poderá jamais esquecer e sentidamente deixar de evocar a voz do jornalista que, em certo momento, representou a voz das populações angolanas; a voz que dia a dia foi esclarecendo o País e conseguiu despertar cons-