remunerado em quantia superior a um escrivão e até a uma chefe de secretaria de comarca de 3.ª classe?

É certo que se trata de anomalias do sistema que terão escapado ao legislador e que podem ser facilmente ajustadas com uma rápida correcção.

Mas o que dizer dos baixos níveis de remuneração dos magistrados e funcionários quando os confrontamos com outras actividades?

Será admissível, por exemplo, que um delegado de 3.ª classe, depois de uma difícil licenciatura em Direito e de um estágio adequado, ganhe apenas 6938$, que um escriturário de 2.ª classe aufira 2488$ e que um corregedor, que preside aos mais importantes julgamentos em l.ª instância, tenha uma gratificação de 1500$, aliás, velha de anos?

É evidente que a motivação para o ingresso na magistratura e funcionalismo judiciais é tão débil que só por milagre ainda há quem queira alimentar-se com a dignidade da função, sofrendo verdadeiro suplício de Tântalo ao ver passar-lhe pelas mãos pleitos em que se debatem milhões e milhões de escudos, de que tomam apenas um leve, passageiro aroma!

Não negamos que o restante funcionalismo público está insuficientemente remunerado.

Não negamos que o Governo tem feito um indiscutível esforço nestes últimos cinco anos no sentido de melhorar a sua situação.

Não negamos que a crise económica em que o Mundo se debate não é muito propícia a aventuras.

Não negamos, finalmente, que será condenável proclamar classes privilegiadas.

Mas o que também não podemos negar é a necessidade de acautelar a segurança da trave mestra do edifício social e, de uma maneira geral, dos servidores da mais importante empresa nacional - o Estado -, na feliz e lúcida expressão do Sr. Presidente do Conselho, a quem neste momento saúdo e renovo os meus sentimentos de profunda confiança na sua determinação, sereno equilíbrio e larga visão no rasgar dos caminhos difíceis do futuro, na mesma confiança envolvendo, na parte que hoje me toca mais de p erto, o categorizado Ministro da Justiça, que já deu evidentes sinais de inconformismo e de compreensão.

Só assim poderemos construir validamente o Estado Social de direito que todos desejamos, em que a distribuição da riqueza não sofra o rasoilo atrofiante e utópico do socialismo nem as picadas pertinazes das sanguessugas do capitalismo internacional - aquele e este a alimentarem-se do sangue dos povos, em nome dos quais o sugam sofregamente até à indigestão.

Podemos estar, no entanto, tranquilos.

O Governo, pela voz autorizada e sempre magistral do Sr Presidente do Conselho, acaba de dar ao País a garantia, para nós desnecessária, de que continua nas suas preocupações mais instantes a revisão do magno problema do funcionalismo público à luz do bom senso e do sentido das proporções, que a grave crise económica mundial e o estado de guerra a que nos forcaram condicionam.

Saber esperar é uma virtude.

E ninguém terá o direito de duvidar de um estadista que tem dado inequívocas provas de serena determinação e de excepcional devoção pelos servidores do Estado.

Assim todos o saibam compreender e apoiar. Por mim, continuarei firme na primeira linha.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Leite de Faria: - Sr. Presidente, Srs. Deputados Chegou o momento de se discutir a proposta de lei n º 2/XI, relativa à criação de secções cíveis e criminais nas Relações. Frequentador assíduo dos tribunais, no exercício da única actividade profissional a que me venho dedicando há mais de vinte anos, não poderia assistir indiferente ao desenrolar de um debate que, como é regimental, se inicia pela generalidade.

Deverá assim a discussão, em tal domínio, versar sobre a oportunidade, vantagem e economia da proposta.

É manifesta a simplicidade da formulação do texto apresentado, o que em nada diminui a complexidade do tema e o alto interesse da respectiva matéria, cuja discussão e votação se integra na competência exclusiva da Assembleia Nacional [artigo 93.º, alínea b), da Constituição]

A iniciativa em apreciação tem desde logo como pressuposto o facto de, embora constitua regra geral da organização judiciária, ao nível da 1.ª instância, a cumulação de c ompetência em matéria cível e criminal, tal não suceder nas comarcas de Lisboa e Porto, onde funcionam inúmeros tribunais, na base de uma institucionalizada dualidade de competência em razão da matéria.

om efeito, tomando-se em linha de conta a realidade emergente do estado actual do por de mais conhecido fenómeno de macrocefalia dos dois principais centros urbanos do País, detêm as comarcas de Lisboa e Porto, em permanente funcionamento, 76 tribunais de 1.ª instância, cuja competência é determinada em razão da matéria cível ou criminal das questões que perante eles são instauradas pelas respectivas populações.

Vê-se, pois, que nestas duas grandes comarcas do País acabam por se dedicar a julgar matéria cível ou criminal, quase sempre por período não inferior a seis anos - tempo mais do que suficiente para se adquirir uma especialização -, aqueles que estão prestes a ser promovidos à 2.ª instância.

O certo, porém, é que se tem ignorado, pura e simplesmente, esta realidade, esperando-se que os magistrados sejam enciclopédicos, mesmo depois de se haverem, efectivamente, especializado precisamente na fase amadurecida da Vida. Para mais, decorado o tempo de servir na Relação, surge ao magistrado novamente a oportunidade de exercer a sua nobre missão, segundo a apontada dualidade, em alguma das secções cíveis ou na secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça.

A irresistível tendência dos tempos modernos é de tal modo obstinada na especialização, que a mesma se afigura irreversível nos múltiplos domínios da ciência, da técnica e das correspondentes actividades profissionais.

Quanto à actividade forense, foi a especialização defendida no nosso I Congresso Nacional dos Advo-