Como então afirmara, «impõe-se valorizar toda a zona adjacente do rio».

Tendem a alargar-se os espaços verdes em Lisboa. O jardim da Praça dita «do Império» - e melhor se lhe chamara porventura de Vasco da Gama, das Descobertas ou da Comunidade Luso-Brasileira -, zona nobre da cidade em sua abertura para o rio, vai estender-se até Belém com a construção de outro, cuja área está a ser terraplenada.

Mas persistem nas vizinhanças, «perto já da Praça de Afonso de Albuquerque e da estação fluvial de Belém, essa figura avantajada, adamastórica, desconforme e horrenda, soturna, ocre, dos primeiros tempos da revolução industrial portuguesa), os edifícios da Central (termoeléctrica) Tejo.

Por quanto tempo mais aí permanecerão, até ser desmontada, que a sua provecta idade há muito o mereceu ?» Volto a insistir na pergunta, em vez de ora agradecer também.

E pena tenho também que não venha a ser destinado a melhor e mais condigna utilização essoutro canto da Praça do Império, onde ainda se acolhem «novas e velhas viaturas, muitas delas abandonadas, reformadas, ferrugentas, que cumpriram sua missão ao serviço das obras públicas do empreendedor Ministério respectivo.

Não seria possível encontrar local algo mais retirado da vista de quem circula ou passa pela estrada marginal e zona ribeirinha ou utiliza - sobreelevado em vistas - os cosmopolitas transportes da linha do Estoril?»

Cheguei mesmo a pensar se, fronteiro ao Museu da Marinha, hoje algo acanhado para o muito a conservar e expor, não ficaria bem um museu do mar (e dos rios) que o excessivamente reduzido Aquário de Vasco da Gama, no Dafundo, dificilmente comporta.

Mas demos ao tempo o que ao tempo possa ser devido.

Tenho dito.

Vozes:-Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos passar à

Continuação da discussão na generalidade da proposta de lei sobre a criação de secções cíveis e criminais nas Relações.

Tem a palavra o Sr Deputado Homem Ferreira.

O Sr Homem Ferreira: - Sr. Presidente: Constituída por três simples artigos, parece bem reduzida a área da proposta de lei em discussão.

E, no entanto, em seu redor latejam problemas agudos e da maior importância para a vida do País.

Já na anterior legislatura tive oportunidade de salientar e descrever com tintas escuras e reais a crise que começava a deteriorar e ia corroendo, passo a passo, o sector da administração da justiça.

De então para cá, as sombras do panorama adensaram-se e cobrem já de forma preocupante toda a organização judiciária.

Das 196 comarcas do continente e ilhas adjacentes, 20 estão sem juizes e a grande maioria está deserta de delegados do Ministério Público.

Acresce que a própria afluência dos candidatos aos respectivos concursos é exígua e está longe de chegar para preencher as vagas existentes.

Esta rarefacção dos quadros da magistratura assenta em vários factores.

A carreira judicial não dispõe ainda entre nós de atractivos que possam compensar as agruras que comporta e seduzir os novos licenciados em Direito.

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - Na verdade, decidir da honra, da vida e da fazenda das pessoas é uma missão dolorosa e cheia de torturas interiores, que demanda uma vocação especial, só por si ao alcance de pouca gente.

Depois, a antevisão de uma vida errante, de comarca em comarca, com o seu cortejo de incomodidades e sacrifícios de ordem pessoal e familiar, não é de molde a aliciar o espírito da gente nova, que já se acostumou a contemplar e interrogar o futuro em termos de vantagens e inconvenientes.

Por seu turno, o esquema das pressões profissionais apresenta-se intensamente desanimador, porque o serviço é imenso, a responsabilidade é enorme e a compensação material é pequena.

Para agravar e enegrecer a linha destes factos, avulta também o contraste com diferentes profissões que permitem dispersar esforços e acumular vencimentos e o confronto com diversos ramos de actividade mais tranquilos, menos pesados e, sobretudo, mais rendosos.

Assim, nem se chega a estranhar que em cada dia que passa se acentue a deserção dos quadros judiciais e se vá estreitando o campo de recrutamento da magistratura.

Aliás, dada a delicadeza e gravidade da função, esse recrutamento nunca pode ser alargado indiscriminadamente, pois tem de implicar um mínimo de nível, dignidade e exigência.

Neste capítulo, desapertar os critérios de uma rigorosa selecção seria tombar numa situação de altíssimo melindre e correr o risco de estilhaçar o prestígio que ainda rodeia a função judicial.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Para além desta paisagem sombria, acontece actualmente que os delegados de 3.ª classe quase se limitam a tomar posse do lugar, mal iniciando as suas funções, pois logo partem para o serviço militar.

E aí permanecem longo tempo afastados dos códigos, dos processos e do tribunal.

No regresso, muitos surgem já promovidos à classe superior, e até à 1.ª classe, e todos vêm com uma carência aflitiva de preparação científica, técnica e prática.

Conhecem, certamente, o funcionamento das metralhadoras, mas não conhecem a tramitação dos mais simples autos judiciais.

Podem saber de instrução militar, mas ignoram a instrução processual. Sabem dar recruta, mas não sabem dar uma acusação ou uma forma à partilha nem interrogar uma testemunha.

Ora, constituindo os delegados o núcleo basilar dos futuros julgadores, torna-se fácil ver como o problema é sério e dispensa comentários, glosas e teorias