naturalmente se o volume do serviço e a complexidade dos processos submetidos a julgamento o exigirem.

Isto está em correspondência com a actual redacção do artigo 20.º do Estatuto Judiciário, que prevê a hipótese de haver apenas uma secção com competência tanto cível como criminai.

O Governo ficará com carta branca para unir ou desdobrar as secções, dando-lhes competência cumulativa ou especialização, conforme as conveniências dos serviços.

Nas Relações de Lisboa, Porto e Coimbra o volume do serviço, a complexidade dos processos e o número de juizes justificam o desdobramento em secções especializadas.

Os apontados e consabidos inconvenientes da especialização não se farão sentir grandemente, segundo penso, pois que a formação jurídica que os juizes promovidos à Relação podem e devem ter nesse estádio da sua carreira permitir-lhes-á obter uma visão suficientemente ampla dos problemas jurídicos sobre que se vão debruçar.

Prevejo a objecção que se poderá levantar e que é a de que, quando os juizes das Relações subirem ao Supremo, poderá não haver neste último Tribunal vaga na secção ou secções correspondentes à especialidade que os juizes tinham na Relação.

Não me parece que este seja um obstáculo de monta, se atendermos a que o n.º 2.º do artigo 1.º da proposta de lei permite que o Conselho Superior Judiciário autorize a permuta entre juizes de secções diferente e até, segundo a alteração apresentada pela Câmara Corporativa, as mudanças de secção, sempre que seja possível, mesmo sem permuta. Deste modo, sempre se conseguirá, com relativa facilidade, que os juizes do Supremo se encaminhem para as secções da sua especialidade.

A proposta de lei em discussão visa a aperfeiçoar a estrutura dos tribunais das Relações de modo que possa haver maior celeridade processual e melhoria técnica nas decisões tendentes, uma e outra a uma melhor administração da justiça.

Estes objectivos poderiam ser conseguid os através do aumento do número de juizes nas Relações Mas, como se observa no douto parecer da Câmara Corporativa, e como todos nós sabemos, o número dos alunos saídos das Faculdades de Direito que pretendem ingressar na magistratura tende a diminuir e não a aumentar e, por isso, não se prevê que nos próximos anos se possa conseguir um acréscimo de magistrados nos tribunais de 2.ª instância.

E já que aflorei este ponto não quero passar sem, neste momento, unir a minha voz à de muitas pessoas responsáveis e chamar a atenção do Governo para a grave situação resultante da notória e sempre crescente falta de magistrados, sobretudo nos primeiros estádios da carreira do Ministério Público.

A carência de delegados de 3.ª classe é alarmante. A continuarem as coisas assim, em breve faltarão por completo os delegados de 3.ª, depois os de 2.ª e de 1.ª, e, finalmente, não haverá juizes. A insuficiência dos quadros não pode ser suprida indefinidamente pela especialização.

Também não resolvem satisfatoriamente o problema as soluções de recurso, como é, por exemplo, a utilização dos substitutos legais Muitos deles não possuem a necessária competência técnica e os que a possuem quase sempre são altamente prejudicados nos seus interesses materiais, ao exercerem as funções, e por este motivo falta-lhes a indispensável boa vontade e espírito de bem servir. Acresce ainda a circunstância de que também os lugares dos substitutos legais, ou seja, os dos conservadores e notários, já estão a não merecer o devido interesse por parte dos diplomados em Direito, sobretudo pelas limitações a que estão sujeitos, como, por exemplo, a proibição de advogar fora da respectiva co marca e as frequentes chamadas a substituir os magistrados titulares.

Também não posso deixar de observar que para haver uma boa e eficaz administração da justiça têm os magistrados necessidade de serem coadjuvados por bons auxiliares, sobretudo os escrivães de direito, e que também os respectivos lugares não estão a ser procurados por aqueles que melhor os poderiam servir. É facto notório que as novas aquisições não desempenham a sua função com a mesma dedicação e saber que eram e são ainda apanágio daqueles que entraram para os serviços de justiça há vários anos atrás. O trabalho exaustivo em muitas comarcas e a deficiente remuneração são a causa desta situação.

O Governo, através do Ministério da Justiça, terá de rever com urgência este magno problema para que a administração da justiça em vez de baixar suba de nível. A função judicial tem de continuar a ser exercida de modo que satisfaça os interesses do Estado e do povo português.

Para terminar, re atando o fio do pensamento atrás expresso, entendo que a proposta de lei em debate, se for aprovada, pode melhorar o nível técnico dos tribunais das Relações, e, nesta conformidade, lhe dou o meu apoio na generalidade.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. António Brochado: - Sr Presidente: Alheado de qualquer sentimento fatalista que vê nas mudanças e nas transformações, por que o mundo continuamente está a passar, um mal irreversível, um mal colectivo e inevitável, eu vejo antes, em qualquer reforma, seja ela de ordem sócio-económica, político--administrativa ou jurídica, quando concebida com senso e com um sentido prático, um desejo louvável de adaptar às realidades da vida o mundo das ideias. E é neste mundo de ideias, em constante evolução, em que determinadas verdades consideradas absolutas deixaram de o ser, e mesmo as relativas sofrem flutuações constantes, que temos de movimentar-nos, que temos de viver sob a complexidade das relações humanas. E vem tudo isto a propósito do debate na generalidade da proposta de lei n.º 2/XI, que trata da criação de secções cíveis e criminais nas Relações, e a que dou a minha aprovação na generalidade, e que, a meu ver, vem contribuir grandemente para o aperfeiçoamento da nossa o rganização judiciária, que o Governo se esforça por tornar cada vez mais eficiente e mais capaz de desempenhar a nobilíssima missão de administrar a justiça.

E a justiça, Sr. Presidente e meus ilustres pares, faz parte da vida dos homens, e, fazendo parte da