confrontá-los com razoável objectividade, ainda que obedecendo, em grande parte, a determinados padrões.

O processo foi em certa medida instigado pela própria elevação do poder de compra das grandes massas populacionais, permitindo um consumo crescente, especialmente daqueles produtos estandardizados

Deve, porém, salientar-se, a propósito do caso português, que nos achamos em larga medida em fase de transição do artesanato para uma estandardização exigente de níveis de consumo adequados, fase na qual sobressai a importância do efeito de demonstração incitado por padrões estrangeiros

Um grande número de consumidores nos países industrializados, uma vez alcançado certo grau apreciável de bem-estar, mostram tendência para refinar e diversificar de requintadas maneiras a satisfação das suas necessidades fundamentais, exibindo modos muito pessoais de agir e dando mostras de se preocupar com um novo estilo individualizado de vida Assim, o aumento dos seus rendimentos disponíveis e a dilatação dos tempos livres abriram-lhes caminho à demanda exploratória de novas experiências, o que, por seu turno, possibilitou o advento e a expansão de novas indústrias

Ora, os produtores, em face desta evolução dos padrões de consumo, redobraram os seus esforços de diferenciação de produtos e de intensificação da obsolescência (em especial, por variação dos tipos e redução da sua duração média) dos bens de consumo lançados no mercado. Assim se foi reforçando a calculada inclinação dos produtores para, ao mesmo tempo, criarem novos bens e necessidades e para influenciarem a procura em vez de simplesmente a seguirem.

A par deste fenómeno, foi-se operando a concentração de empresas e adoptando outras formas de seus agrupamentos e acordos, que restringiram a concorrência e, concomitantemente, reforçaram a posição dos vendedores.

Daqui se infere, pois, que as relações produtor-consumidor e distribuidor--consumidor se foram tornando progressivam ente desiguais: nos mercados, a estrutura predominante passou a caracterizar-se pelo confronto entre vendedores concentrados, poderosos e organizados na prossecução do seu interesse, e consumidores débeis na sua divisão e vulneráveis nas suas humanas limitações Evidente se tornou então que da disparidade de forças daí resultante poderiam advir não apenas quebras na eficiência real do funcionamento das economias, mas ainda graves danos de índole social

Também se foi reconhecendo, não sem alguma lentidão, que o progresso social se não deve aferir pela simples maximização de variáveis quantificáveis tomadas como medidas do bem-estar material Há que, paralelamente, considerar aspectos qualitativos da existência o problema da qualidade da vida passou a preocupar os governantes, à medida que o progresso tecnológico e as exigências da produção de massa depredavam a Natureza nos seus dons mais preciosos e que o consumidor ia ficando mais subalternizado num jogo de forças que menosprezava muito da sua dignidade

Esta evolução operada no seio do sistema económico de livre iniciativa, marcada pelo avançar das tecnologias e pela produção de massa, a reforçar o poder contratual do produtor e a dificultar opções esclarecidas por banda dos consumidores, contribuiu para que estes buscassem meios de autodefesa e os Poderes Públicos lhes acudissem pela tutela dos fundamentais interesses assim agredidos. De modo particular, na elevação incessante do nível geral dos preços nos países do Ocidente, ainda que ela possa resultar de um excesso quantitativo da procura global, encontramos mais uma circunstância a dar vigor ao movimento generalizado dos consumidores a partir do decénio de 50

Mas saliente-se que só relativamente tarde o aludido desencontro de interesses entre produtores e consumidores passou a receber da Administração o merecido cuidado. O conflito empresário-trabalhador ocupou e continua a ocupar um lugar relevante nas preocupações dos Poderes Públicos. Tal facto poderá talvez explicar-se por se mostrar em regra o homem mais desejoso e capaz de defender o seu interesse concentrado como produtor do que o seu interesse dividido como consumidor. As negociações salariais ocupam uma posição importante na actividade da produção, ao passo que o ajuste de preços entre consumidores e produtores vai fluindo continuamente em milhões de transacções de diversíssimos produtos Numa economia de mercado cabe ao meça nismo dos preços a missão de promover a afectação eficiente dos recursos Ora esta função desempenhá-la-ão os preços com uma eficácia que muito depende do quantum e da forma da concorrência que ai puder prevalecer, o que leva os Poderes Públicos a agir segundo modalidades de intervenção em que o apoio aos consumidores toma uma posição fulcral. Estes, nas economias de mercado, não podem com êxito chamar a si, desajudados, a tutela do seu próprio interesse, nem pode esperar-se que os produtores, ao demandarem os seus objectivos específicos, sejam guiados por «mão invisível» para a automática prossecução do interesse geral De modo que a opção pelo sistema de livre iniciativa impõe à Administração o ónus de desimpedir e sanear os mecanismos de que depende o seu funcionamento regular e eficiente Deverão, pois, os Poderes Públicos intervir em defesa do consumidor. Mas, concretamente, em defesa de quê que aproveite ao consumidor? Em que grandes cadinhos se tem vazado a sua intervenção?

A pluralidade de esquemas que se nos deparam reconduz-se, na sua generalidade, a quatro grandes metas Melhoria da qualidade da procura do consumidor, Reforço dos meios de representação e defesa dos seus interesses, Promoção e defesa do seu poder de compra; Preservação do meio ambiente.

Pode também afirmar-se que a protecção do consumidor reveste dois aspectos distintos, como salienta um relatório do Comité de la Politique à l'Égard dês Consommateurs, da O C D. E o da sua protecção física e o da sua protecção económica. E é fácil reconhecer que nos objectivos enunciados estão contempladas ambas as formas de protecção