Da melhoria da «qualidade da procura», expressão devida a R. H. Holton1, resulta protecção física do consumidor, pois ela racionaliza as suas reacções perante os bens que o solicitam, defendendo-o de produtos tóxicos e nocivos. E resulta ainda protecção física, porque os Poderes Públicos não se limitam a promover o esclarecimento do consumidor' actuam também fiscalizando e reprimindo práticas fraudulentas e abusivas de produtores e distribuidores que possam comprometer-lhe a saúde e a integridade física.

Mas a melhoria da qualidade da procura também confere uma protecção económica. Com efeito, esclarecendo-se por essa via as suas escolhas, maior será o volume de satisfações que o consumidor retira dos seus recursos limitados Aumentando a transparência dos mercados e alargando o campo de escolhas dos consumidores, permite aumentar a elasticidade das suas procuras, contribui para a contenção dos preços nos diversos mercados e, bem assim, para a mais eficiente afectação dos recursos da economia.

E também aqui a protecção económica virá a ser servida pela ingerência da Administração, que intervirá disciplinando e punindo actuações que insinuem a fraude ou a confusão nos mecanismos que se quer sanear e nos espíritos que urge manter esclarecidos.

Do reforço dos meios de representação resulta o alertar da Administração, dos produtores e da opinião pública em geral para os interesses fundamentais do consumo, com consequências benéficas para a protecção económica e física dos consumidores

É óbvio, a ponto de dispensar qualquer justificação, que a defesa do poder de compra do consumidor e a preservação do meio ambiente podem constituir meios de protecção física e económica. A maioria das medidas que é costume incluir na política de protecção dos consumidores respeita à valorização da qualidade da procura.

As escolhas dos consumidores inspiram-se no seu conhecimento dos caracteres dos bens e dos respectivos preços Ora, tal conhecimento é sempre limitado, embora possa, mediante o recurso a meios adequados, melhorar substancialmente. Resulta ele de uma soma de informações oriundas de várias fontes as que provêm do próprio consumidor e são fruto da sua indagação e experiência, as que dimanam do vendedor, e ainda aquelas que são fornecidas por associações de consumidores, organizações de trabalhadores ou organismos públicos.

Quanto mais completa e objectiva for a informação, mais se enriquecerá o conhecimento em que a procura se alicerça e mais a qualidade desta será beneficiada. Mas toda a informação tem as suas fraquezas, pelo que a qualidade da procura sempre ficará aquém do seu óptimo, o que é igual a dizer que só muito raramente ex ercerá o consumidor as suas escolhas com satisfatório esclarecimento. A insuficiente qualidade da procura prejudicará, deste modo, a função que a esta deve caber no encaminhamento dos recursos para os fins mais úteis Por outras palavras, ficar-se-á mais distante do completo conhecimento das ofertas alternativas que os modelos de concorrência pressupõem Saliente-se, de passagem, que a informação pode constituir um meio de provocar e facilitar a intervenção oficial em favor dos consumidores.

Afirmou-se que todas aquelas informações têm as suas fraquezas Com efeito, e desde logo, a avaliação pessoal, alimentada na indagação e experiência directas (aquilo que Stigler designa por «search») 2 a, padece de sérias limitações a perspicácia e a paciência do consumidor têm limites, a sua memória é imperfeita; os resultados da avaliação pessoal sujeitam-se a uma obsolescência que se agrava com o estugar das inovações tecnológicas, das diferenciações produtivas e da pressão pub licitária, as novas tonalidades qualitativas que nos produtos se introduzem não atingem amiúde o limiar da percepção do consumidor, os testemunhos de outros consumidores revelam-se tantas vezes superficiais e mal fundados E junte-se a tudo isto o peso que no orçamento do consumidor médio podem ter os serviços não padronizáveis, logo de difícil cotejo objectivo.

No tocante aos consumidores situados nos grupos superiores e inferiores de rendimentos, algo de peculiar pode adicionar-se a tudo isto para diminuir a qualidade da procura Nos grupos abastados, uma avaliação pessoal cuidada e, consequentemente, custosa em esforço e tempo, é tarefa que os consumidores podem dar-se o luxo de menosprezar, para eles a renúncia a outras aquisições imposta por uma compra menos acertada tende a ser menos penosa do que para os consumidores de menores rendimentos Mas, entre estes últimos, vemos os indivíduos em geral menos esclarecidos e menos capazes ou dispostos a uma cautelosa ponderação de alternativas. É nos grupos intermédios que se nos depara a maioria dos consumidores dispostos a uma indagação mais aturada.

Note-se que a dispersão dos preços no mercado de um produto é em larga medida indício da ignorância nele reinante acerca das suas características Feita abstracção de outros elementos informativos, tal fenómeno deve-se em boa parte à insuficiente indagação dos consumidores Por outro lado, quanto maior for a dispersão dos preços relativamente ao custo da indagação, mais os consumidores sentirão que vale a pena indagar. A publicidade, segunda fonte de informação, pode reduzir drasticamente o custo da indagação Pode e deve. E porque deve, sempre as políticas de defesa do consumidor acolhem medidas tendentes a discipliná-la, intentando fomentar o seu aspecto informativo e reprimir o que nela haja de doloso ou lesivo de uma clara apreciação.

Produtores e distribuidores buscam sistematicamente influenciar os consumidores nas suas escolhas, embora se deva reconhecer que estes últimos também podem, em alguma medida, comandar as decisões dos vendedores que, como salienta George Katona, «[...] all carefully watch for any slight change in consumer tastes and buying indmations» 3 Mas, quando os produtores e distribuidores se põem vigilantes às mínimas

2 Cf George J Stigler, «The Económica of Information», in The Journal of Political Economy, LXIX, 1961, p 213,

3 Cf The Powerful Consumer, p 242