Estou, portanto, com a redacção proposta pela Câmara Corporativa, pois contempla as transplantações necessárias à sobrevivência e também aquelas de alto valor terapêutico, que são, tantas vezes, de alto e fundamental interesse para o equilíbrio moral e psicológico do receptor e não menos vezes do próprio dador.

O Sr. Moreira Pires: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Moreira Pires: - Era só para perguntar se V. Exa. nos podia esclarecer quais são as outras situações que estão foi a do esquema, uma vez aprovado o texto do Governo.

Muito obrigado

O Orador: - Sr. Deputado. Logo de início me reduzi à minha insignificância e me afirmei não ser técnico sobre este assunto No entanto, estou perante uma proposta que efectivamente é de órgãos e de tecidos.

É, como disse inicialmente, no pressuposto de que há órgãos e tecidos a transplantar que eu estou tecendo estas considerações.

Se houvesse algum médico que me pudesse auxiliar quando terminar a minha intervenção, eu agradeceria a ajuda.

Muito obrigado.

Com a aprovação do artigo 2.º segundo a Câmara Corporativa, será então possível a transplantação, por exemplo, e quando for possível, de tecido dérmico, cartilagens e mesmo tecido muscular, que, pela sua dimensão, não estejam contemplados na base x, e destinados a operações de cirurgia plástica, de tão grande interesse psicomoral e ate psiquiátrico.

Será então também viável com tal redacção a transplantação inter vivos, de córneas, tecidos ósseos, de vasos, de porções de intestino, etc Transp lantações estas de grande valor e óbvio interesse para a saúde dos doentes receptores e de perigo-risco muito relativo para os dadores.

Sr Presidente. Não quero ocupar mais tempo a esta Assembleia com considerações sobre um problema Ião controvertido e emocionalmente tão carregado, dadas as implicações de ordem moral de que está envolvido, mas não desejaria deixar de afirmar a V. Exa. de que votarei pela redacção proposta pela Câmara Corporativa, acompanhando assim o parecer de muitos membros da Comissão a que pertenço.

Na verdade, não pretendo com outra atitude, e não a assumida, que um dia mais tarde, alucinadamente arrependido, eu próprio me veja impossibilitado de oferecer algo do meu corpo de fundamental valor terapêutico para o equilíbrio psicossomático daqueles a quem de bom grado daria, se necessário, a própria vida.

Para terminar, quero afirmar que tenho a máxima consideração pela classe médica e assim pelos operadores chamados a intervir nas transplantações tecnicamente já viáveis e aquelas que o progresso virá em futuro, que pretendo próximo, permitir.

O Sr. Veiga de Macedo: - Já aqui foram hoje ditas palavras que só não considero graves, severas e injustas porque, ditadas por boa intenção, as dominou uma emoção que, de algum modo, pode ter perturbado o pensamento.

De qualquer maneira, essas palavras aplicam-se, pelos vistos, a todos os que defendem, no caso, opinião diferente daquela que advogam, por maioria, as Comissões.

Ora, o ponto de vista tão emotivamente atacado pelo primeiro e ilustre orador neste debate de hoje é, afinal, o que se contém na própria proposta de lei.

Como concordo inteiramente, neste ponto, com a proposta do Governo, nem sequer devo protestar contra essas afirmações Merecendo ou não essas palavras, só direi que me sinto bem acompanhado.

Mas adiante.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Depois do que ontem disse sobre o assunto em discussão, torna-se mais fácil apreciar o artigo 2.º da proposta de lei e as sugestões formuladas pela Câmara Corporativa e pelas Comissão de Justiça e Comissão de Trabalho e Previdência, Saúde e Assistência.

O Governo entende que a transplantação só é lícita quando no plano científico for reconhecido, simultaneamente, que e necessária à sobrevivência do receptor, que o dador não corre risco anormal de perecer ou de lhe causar uma sensível diminuição física, e que as probabilidades de sobrevivência do receptor sobrelevam indubitavelmente o risco corrido pelo dador.

A Câmara Corporativa entende, porém, que «é restritivo este preceito, à face da economia do diploma e da sua finalidade essencial».

A Câmara elucida que, «no n º 1 do artigo 2 º, limita-se a licitude das transplantações aos casos em que estas sejam necessárias à sobrevivência do receptor, do mesmo modo se exigindo que as suas possibilidade s de sobrevivência sobrelevem o risco corrido pelo dador».

E acrescenta. «Isto é exacto e compreensível, mas talvez se possa ir mais longe, sem atraiçoar a rigidez que o preceito inculca, abrindo um pouco a hipótese, até pelas dificuldades médico-técnicas de ajuizar com segurança a fronteira da sobrevivência humana à face da doença. E também porque se não justifica o menosprezo pela oportunidade de importante alívio ou atenuação do sofrimento físico».

Concluindo, a Câmara sugere que, na alínea a) do preceito, a expressão «sobrevivência» seja substituída por esta outra «indiscutível e fundamental valor terapêutico».

A Câmara, na mesma linha de pensamento, alvitra que, «de igual modo, na alínea c), em vez de sobrevivência se faça referência à probabilidade de simples sucesso de operação».

As Comissões parlamentares chamadas a pronunciarem-se sobre a proposta de lei, «achando preferível este último critério, adoptam, adoptam não sem demorada hesitação, o articulado que fez vencimento na Câmara Corporativa». E confessam que as determinou, «particularmente nesta orientação, a circunstância de se possibilitar com a nova regra um alargamento substancial do campo de intervenção de cirurgia das transplantações», acrescentando que suma tal inovação interessaria mormente a casos extremos de necessidade de cirurgia, em que o aspecto penoso da situação do enfermo só pode ser minorado por efeito de uma oportuna transplantação».