de se tomarem graves decisões, que, fora desse quadro ou dessas pressões de momento, em consciência, não seriam tomadas.
Por isso mesmo, em trabalho do Prof. de Direito Gervásio Leite, publicado na Revista de Informação Legislativa, do Senado Federal do Brasil, se revela que o Prof. Todoli, catedrático da Universidade de Madrid, «preocupado com a ética dos transplantes expõe o ponto de vista de Penador que considerava ilícito o transplante de órgãos pares de pessoa viva por considerá-lo mutilação». E acrescenta-se: «Isto porque a ninguém e dado atentar contra a integridade física de pessoa física, salvo o caso de se tornar necessária a mutilação para salvar a vida do paciente».
Vozes: - Muito bem!
O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente. Vou ser muito breve. As declarações que fiz, na minha intervenção, na apreciação da generalidade desta proposta de lei, tinham a intenção de informar a Câmara sobre a necessidade de reduzir as consequências de aplicação da lei que iríamos votar, e que eu, como então disse, não considero nem necessária nem oportuna, tais são as condições em que infelizmente nos encontramos sob o ponto de vista dos fundamentos essenciais que hão-de servir às transplantações de órgãos e tecidos. Os dez anos que se seguiram à legislação sobre a colheita de órgãos e tecidos de cadáveres nada nos trouxeram, infelizmente, neste campo.
Está tudo na mesma como há dez anos, sem podermos utilizar a lei que então votámos.
Julgo tê-lo justificado.
A redacção do artigo 2.º apresentada pelo Governo é aquela que oferece maiores possibilidades de ver limitada a aplicação desta lei e, portanto, de circunscrever o âmbito das suas graves consequências.
É por isso que voto o texto do Governo.
O orador não reviu
O Sr. Mendonça e Moura: - Sr. Presidente: O problema que estamos aqui a discutir, o problema da base n desta proposta de lei, tem sido notavelmente dramatizado.
Foram dadas múltiplas explicações de carácter técnico, foram feitas previsões quanto ao futuro da ciência, e ora se toma essa ciência como indiscutível nalguns pontos, ora, pelo contrário, se nega tudo o que ela possa vir a fazer no futuro.
A mim surpreende-me, efectivamente, que essas mesmas pessoas que aceitam como facilmente definível o que seja um caso de sobrevivência venham dizer que ainda não sabemos bem qual é o momento exacto da morte.
Também me surpreende que essas mesmas pessoas, quase no mesmo estilo, venham dizer que só devemos fazer transplantações num caso de urgência absoluta para uma sobrevivência, e não num caso de indiscutível valor terapêutico.
Ficaria muito grato se fossem capazes de me dizer qual a diferença entre um caso de sobrevivência e um caso de indiscutível e fundamental valor terapêutico.
Podemos talvez dizer que estamos todos a partir das mesmas premissas, no fundo não estamos em pólos opostos. Todos aceitamos, efectivamente, a existência do direito à vida e à integridade do corpo humano, todos aceitamos o direito à saúde, todos aceitamos o princípio da totalidade e, portanto, do uso limitado do corpo nesse mesmo princípio da totalidade Todos aceitamos a posição de indisponibilidade do corpo humano, todos aceitamos a possibilidade de sacrificar, de mutilar esse corpo em proveito do seu todo. Naturalmente que também devemos rejeitar a possibilidade de sacrificar parte desse corpo em proveito de um corpo mais vasto, como seja o da sociedade. Aí também eu adiro às posições que aqui foram definidas. Sim, e digo-o porque já o disse nas comissões respectivas em que tive a honra de trabalhar. Se, na verdade, esta lei viesse propiciar a criação de um banco de órgãos de pessoas vivas, digamos assim, que viesse criar um serviço de dadores de órgãos, aí com certeza eu teria sido dos que a rejeitariam in limine na generalidade!
Mas não é disso que se trata.
Todos aceitamos, aceitam os três textos que temos na nossa frente, o sacrifício livre, voluntário, esclarecido da parte do corpo em benefício de outrem. Todos os textos o aceitam E em que circunstâncias? Uns admitem quando seja indispensável para a «sobrevivência», outros quando se trate de um «indiscutível e fundamental valor terapêutico», e nisto talvez haja, na verdade, alguma diferença, mas não tão grande como pode parecer à primeira vista.
Verifica-se que todos aceitamos já o sacrifício livre, voluntário e esclarecido de uma parte em proveito de outrem, desde que, evidentemente, tenha sido formado este consentimento com uma vontade autónoma e num sentido do mais alto e mais puro altruísmo, em favor do outro que precisa de uma parcela do nosso ser. Todos aceitamos já o alargamento fundamental do âmbito da disponibilidade Na verdade, o princípio da indisponibilidade do corpo humano sofreu já um corte, sofreu já uma mutilação fundamental, e esta de princípio Aceitamos todos quantos até hoje nos pronunciámos que poderá fazer-se uma mutilação do corpo humano e, portanto, cortarmos cerce o princípio básico da indisponibilidade do corpo.
Resta apenas discutir em que circunstâncias e por que motivos vamos aceitar que possa na prática fazer-se essa mutilação e esse sacrifício.
Motivação fundamental, e esta de princípios. Aceitar-nos-á todos quantos até hoje aqui nos pronunciámos Onde está, no fundo, a licença, onde está o drama que tem sido trazido a este plenário, que, aliás, já se viveu também nas comissões?
De facto, um dos textos exije, para justificar a cedência, a doação, em proveito de outrem, se se tratar de um caso de sobrevivência. No outro texto, no texto que nos vem documentado, votado pela Câmara Corporativa e que as comissões aceitaram por larga maioria, diz-se efectivamente que poderá fazer-s e realmente uma transplantação nos casos de indiscutível e fundamental valor terapêutico.
Dentro de uma perspectiva evidentemente cristã, dentro daquela perspectiva que enforma a nossa civilização, não há dúvida de que o próprio Papa, referindo-se à transplantação das córneas de cadáveres, deu o significado exacto, pois, na verdade, a córnea do cadáver já não serve ao cadáver, já não pode servir para coisa nenhuma E eu pergunto, embora este caso não seja de sobrevivência, se isso não poderá acontecer em relação à córnea do indivíduo que