No entanto, a própria Câmara Corporativa é bem clara quando refere que, no estrangeiro, se tende para exigir a maioridade.

É assim na Itália. O mesmo se passa na Checoslováquia, embora neste país a maioridade se atinja aos 18 anos, segundo se depreende do próprio parecer da Câmara Corporativa.

Na Dinamarca, a lei de 1967, sobre a recolha de tecidos humanos e outros produtos biológicos, exige a maioridade para o consentimento do dador, apesar

de estabelecer ainda, como condição, que a operação não deve acarretar para ele um perigo real.

E, como se refere também no parecer da Câmara Corporativa, «a aplicação generalizada dos princípios consagrados na lei dinamarquesa foi recomendada pelo Conselho das Nações Escandinavas, reunido em 1967, a todos os seus Estados membros, o que é demonstrativo da importância que se atribui ao problema». Eu diria, o que é demonstrativo do cuidado e espírito realista com que se encara o problema.

Na Suécia, tratando-se de menor, a operação não poderá ser levada a efeito se não a título excepcional, com autorização da autoridade de saúde (Direcção Nacional da Previdência Social).

Nos Estados Unidos e nos países anglo-saxões, segundo se depreende do parecer da Câmara, também só os indivíduos de maioridade podem dispor de órgãos ou tecidos para fins de transplantações.

No Brasil, vigora o mesmo princípio, o qual está consagrado no artigo 10.º da Lei n.º 5479, de modo expresso.

É que, como frisa o Prof. Gervásio Leite, vá pessoa humana é um valor social positivo e a ablação de um dos seus órgãos pares só é possível conjugando a vontade do disponente e os interesses da sociedade, que também estão em jogo, não interessando a esta a existência dê seres humanos mutilados», pelo que, a transplantação, «ainda que para fins humanitários e terapêuticos, é impedida pela lei desde que implique prejuízo ou mutilação grave para o disponente».

Se estes dados impressionam, o que imp ressiona mais é a razão funda que deve condicionar o consentimento para a transplantação de órgãos, no tocante á idade do dador.

Se se aceita que a maioridade se atinge aos 21 anos, é porque, para tanto, sérias razões de ordem física, psicológica, jurídica e social levaram o legislador a adoptar essa solução.

Mas, então, afastam-se essas razões sem fundamentação válida, precisamente num caso como este, em que mais completa e acabada formação física, mais perfeita autonomia psicológica e maior ponderação de espírito são de exigir, e em grau tão elevado que não se vê que para outros actos se possa ou deva ser mais rigoroso ou intransigente?!

Para mim, estabelecer-se que a idade mínima de 18 anos deve ser o limite para o consentimento da transplantação de órgãos ou tecidos equivale a revogar, no plano que mais interessa, a própria norma legal (artigo 122.º do Código Civil) que prevê que a maioridade se atinge aos 21 anos.

Não darei, por isso, o meu voto a o preceito proposto, porque não me quero vincular a uma providência destinada, na prática, a dar origem a verdadeiros atentados -e tanto mais quanto são prematuros - à integridade corpórea de rapazes ou raparigas ainda não suficientemente formados fisicamente, e, tantas

vezes, psicológica e mentalmente, e, por isso, bem mais sujeitos que os adultos a serem influenciados por circunstâncias e pressões de toda a ordem, sobretudo num domínio como este, em que certo e conhecido tipo de coacção pode exercer-se por processos subtis e enganadores.

Não poderão as comissões reconsiderar este assunto e propor uma norma diferente que dê satisfação ao que acabo de expor?

Penso que poderão fazê-lo com toda a facilidade, pois, tendo-se louvado, como dizem no seu parecer, no estudo de exegese e de direito comparado da Câmara Corporativa, e havendo-se mostrado agora que £ interpretação das legislações estrangeiras não autoriza a conclusão a que chegou a Câmara, nada impedirá uma nova posição, a não ser que outras razões hajam sido ponderadas, o que não me parece, em face dos termos usados no citado parecer.

O Sr. Mendonça e Moura: -Sr. Presidente: Conforme já hoje aqui foi assinalado, as Comissões chegaram à proposta que temos para discussão num plano de compromisso, petas razões que foram invocadas há instantes.

Razões médicas indicariam como idade mais própria, para se definir o limite mínimo para se poder ser dador para efeitos de transplantações, os 21 anos.

Chegou mesmo a pensar-se em definir esse mínimo pela maioridade legal, mas verificou-se que em determinadas circunstâncias a maioridade legal se pode atingir muito antes dessa idade.

Medicamente haveria toda a vantagem em que fôssemos para os 21 anos de idade, em que naturalmente se atinge a plenitude do desenvolvimento físico e psíquico, de tal maneira que o indivíduo é menos influenciável como já foi assinalado e, por outro lado, menos sujeito a determinadas afecções que podem vir a comprometer o seu organismo, especialmente se tiver sido dador anteriormente de um daqueles órgãos fundamentais duplos de que pode prescindir.

Estas as razões que me levaram a defender esta posição nas Comissões, embora tendo aceite o compromisso a que se chegou, aceitando o texto da Câmara Corporativa, que, na realidade, acrescenta à posição do Governo algo mais, como seja admitir os 18 anos condicionados pela posse de uma plena capacidade volitiva e possibilidade de manifestar um pessoal, livre e esclarecido consentimento. Apesar de ter aderido a esta posição de compromisso, não posso nem quero deixar de manifestar a posição que como médico tomei na Comissão, e, ao mesmo tempo, declarar que no plenário me absterei em relação a qualquer dos textos em discussão.

O orador não reviu.

O Sr. Moreira Pires: - Sr. Presidente: Como médico manifestei nas Comissões a opinião de que a idade para se poder ser dador deveria ser a dos 21 anos. Portanto, corroboro inteiramente a opinião do Sr. Deputado Mendonça e Moura e de todos os outros colegas que já se pronunciaram no mesmo sentido.

Tomamos uma atitude de compromisso, adoptando a norma da sugerida pela Câmara Corporativa, mas, como médico, inclino-me para os 21 anos. Todavia, devo esclarecer que no artigo que será discutido posteriormente, ou seja no antigo 7.º, os exames