brar aqui o nome do Sr Engenheiro José Luís Abecasis Foi durante a sua actuação como secretário provincial de Obras Públicas e Comunicações que se levou a cabo a experiência dos bairros de realojamento e de reordenamento urbano - uma experiência medita, magnífica de ensinamentos, em que pela primeira vez, através da coordenação de vários serviços, se deu às populações carecidas de habitação e de amparo um atendimento global cheio de calor humano, um atendimento adequado à verdadeira dimensão das suas necessidades.

Mas dir-se-á se o interesse, o estudo atento e a aplicação entusiasta de muitos esforços e muitas experiências têm sido dirigidos, ao longo de mais de um quarto de século, para a resolução do problema habitacional das cidades de Angola e de Moçambique, por que será então que tal problema se encontra dia a dia mais agravado.

A esta pergunta poderíamos aduzir as seguintes respostas.

Talvez por não existir uma estruturação verdadeiramente eficaz e os esforços se apresentarem dispersos e descoordenados Talvez por falta de continuidade governativa e pela secular pecha portuguesa de se mudarem critérios e princípios com a mudança dos governantes Talvez porque os recursos oficiais e particulares postos ao serviço do sector habitacional, vultosos embora, têm sido insuficientes e aplicados com um aspecto descoordenado e até, por vezes, notoriamente versátil Talvez, ainda, por possuirmos personalidades demasiado vincadas e andarmos constantemente a arrumar a nossa casa com experiências originais e inteligentes, mas de resultados imprevisíveis, sem querermos cuidar da experiência alheia, já confirmada por resultados garantidos.

É que, na verdade, meus senhores, as necessidades primárias do homem -necessidades de alimentação, de vestuário, de abrigo - são as mesmas em todos os lugares da Terra. Ora, se à escala universal existem para as solucionar métodos consagrados por sucessos obtidos, que relutância poderemos nós ter na aplicação desses métodos, adaptando-os, como é óbvio, à nossa vivência e ao ambiente onde vão ser praticados?

É ao debruçarmo-nos sobre as experiências do presente e do passado, mesmo sobre as experiências dos estranhos, que conseguiremos encontrar os indícios e a traça para podermos trilhar os caminhos mais seguros Já escrevi algures que ao próprio infante de Sagres, o grande responsável da dispersão da nossa Pátria pelas sete partidas do Mundo e o grande responsável desta nossa aventura de África, que encheu e continua a encher páginas da História Universal, pois ao próprio infante de Sagres não o perturbou apoiar-se nas experiências e nos ensinamentos dos nautas e cosmógrafos estrangeiros, para vir a alcançar as terras que ficavam para lá dos grandes mares e dos terrores .

Além disso, não estamos já nós a usar a experiência alheia nos mais diversos campos. Não a usamos, verbi gratia, nas relações da banca, no trato económico, nos tratamentos médicos - eu sei lá! -? E acaso os recém-casados serviços da Missão de Extensão Rural de Angola e todos quantos se apoiam no desenvolvimento comunitário se não servem de ideias básicas universais, adaptadas, é evidente, à

nossa maneira de ser e de estar no mundo? Sendo assim, a que vem então esta preocupação de originalidade e de improvisações no campo habitacional? Ademais, quem haverá entre nós que não reconheça ter cessado definitivamente a hora do improviso - improviso em que tantas vezes fomos grandes no passado, quando ínventivamente superámos tantos momentos de aflição e de penúria? Quem não reconhece que hoje a técnica, o método e a ciência têm de aplicar-se em planos compatíveis com a profundidade e a dimensão dos nossos problemas - único meio de podermos ser coerentes com o corolário de princípios sociais e políticos que nos propomos defender?

Experimentos que envolvam o bem-estar social e a felicidade das populações, quando existem alhures práticas de resultados seguro s e já conhecidos que poderiam ser por nós adoptadas nas suas linhas mestras, não podem merecer de forma alguma a minha adesão voluntária.

Sr Presidente e Srs Deputados Possivelmente pelas razões atrás apontadas, e com certeza por outros motivos, verificados aliás à escala universal, como seja, por exemplo, o movimento centrípeto para os grandes meios, é que crescem e se multiplicam de dia para dia, à volta das cidades de Angola e de Moçambique, os desordenados e desagradáveis bairros de subúrbio. Com efeito, o homem nativo dos sertões africanos está-se hoje dando conta de uma nova maneira de viver, mais cómoda e sobretudo menos fastidiosa, nos aglomerados urbanos de maior importância, e sente-se atraído pelo movimento, pelo bulício, pela expectativa de boas oportunidades e até pelo ar de festa que, para ele, parece envolver e exalar-se da cidade. Tem já uma ideia da família diferente da tradicional E ganhou pelo trabalho um respeito que contraria todos os seus hábitos ancestrais Compara mentalmente o letargo enfadonho da libata, onde pouco mais pode ser do que pastor ou agricultor, normalmente por conta de outrem, com a trepidante actividade dos meios urbanos, em que supõe haver larga multidão de empregos à sua espera Não mais lhe agrada dormir na esteira ou na tarimba, prefere uma boa cama Por outro lado, se algum dos seus estiver doente, cura-se melhor e mais rapidamente no hospital da cidade do que com os velhos milongos do feiticeiro Na cidade tem cinemas, tem cervejarias, tem luzes, bulício, animação Não é como ali no «quimbo», em que as horas de lazer passam modorrentas e fastidiosas, com um ou outro batuque, cabaças de «marufo» e historietas sem interesse ao redor da fogueira sonolenta.

E, motivados por estes e outros estímulos de semelhante teor, largos fluxos migratórios convergem diariamente para os grandes centros grandes na métrica africana, é evidente- e empolam os chamados «musseques» e «caniços» São milhares de indivíduos mal preparados profissionalmente a disputarem os poucos lugares da burocracia funcionai e os limitados empregos da actividade particular

E é todo um desfazer de ilusões.

Por um lado, na cidade, as estruturas sociais e as estruturas administrativas não estão preparadas para conseguirem ordenar e assimilar o caudal, cada vez maior, dos imigrantes do interior Não se lhes pode acudir de imediato, nem com meios de subsistência, nem com alojamentos, nem com possibilidades de emprego