Tenho, pois, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a esperança de que do debate ora iniciado alguma coisa de válido irá surgir.

Antes de terminar esta minha despretensiosa intervenção, devo acrescentar que continuo vinculado ao relatório apresentado pela Comissão do Ultramar, que, como membro da mesma, subscrevi. Peço também licença para desta tribuna render as minhas homenagens ao presidente da Comissão do Ultramar, Sr. Dr. Neto de Miranda, pela forma como vem conduzindo os trabalhos da Comissão que mui dignamente preside.

Finalizando, dou o meu acordo as linhas gerais contidas no aviso prévio sobre o plano estadual de habitação e urbanismo para Angola e Moçambique, sem prejuízo para a descentralização e regionalização das iniciativas e soluções, como atrás me referi.

Vozes: - Muito bem!

O Sr Sá Viana Rebelo: -Sr Presidente, Srs. Deputados. Pelo Sr. Deputado José d'Almeida Santos Júnior foi premente à Assembleia Nacional um aviso prévio cujo tema é um plano estadual de habitação e Urbanismo para os Estados de Angola e de Moçambique.

Já nas legislaturas imediatamente anteriores, os Deputados Manuel Nazaré e Alberto Alarcão tinham abordado igual assunto em avisos prévios exaustivamente debatidos e muito comentados, sobretudo o primeiro, além-fronteiras, e assim natural é que surja a interrogação se é oportuno ou não voltar a falar-se sobre um tema que poderá julgar-se esgotado. E outra pergunta é de formular, enquadra-se este aviso prévio nas atribuições da Assembleia Nacional ou antes é matéria das Assembleias Legislativas dos Estados Ultramarinos? Numa altura em que Angola e Moçambique, com o acordo do Governo Português, reivindicam cada vez maiores autonomias, não parece que esta Câmara tenha de debruçar-se sobre um plano demasiadamente técnico para que seja discutido em assembleia política de âmbito nacional.

Mas, por outro lado, o problema da habitação é sempre aliciante e preocupante, além de naturalmente político, pois da falta da sua resolução podem advir graves consequências para a governação. Um povo descontente, por desalojado ou «arrumado» em péssimas condições, é sempre um abcesso político, que raras vezes aborta com paliativos ou promessas.

Estou vivendo há cerca de vinte anos em Angola e sempre tive conhecimento dos esforços do Governo local e das autarquias para se debelar o mal dos musseques em Luanda e dos bairros pobres das outras cidades. Os governantes estiveram sempre atentos à mancha que alastrava nos centros urbanos e largas verbas se gastaram para tentar diminuir a diferença entre as instalações existentes e as necessárias para se enfrentar o afluxo das populações que demandavam as cidades.

Reportando-me a Luanda, onde exerci durante os últimos cinco anos funções de chefia municipal, a Luanda onde o problema é mais grave, profundamente grave mesmo, posso referir que se têm construído milhares de fogos distribuídos por famílias economicamente débeis, construções edificadas pela Junta da Habitação, pela Câmara e por outras entidades, entre as quais a Fundação Salazar. Mas todo esse esforço tem sido improfícuo, pois não ocorre sequer às necessidades mínimas de uma população que se amontoa em bairros sem condições. Segundo uma afirmação recente do actual secretário provincial das Obras Públicas de Angola, para fazer face às necessidades actuais de Luanda são precisos 20 milhões de contos e mais 3 milhões cada ano que passa, dadas as verdadeiras torrentes humanas que invadem a capital de Angola.

A esta afirmação corajosa de quem está bem dentro de um assunto apaixonante e aparentemente impossível de resolver, acrescentarei a de que são ainda necessários terrenos municipais ou do Estado, que não existem disponíveis em quantidades suficientes dentro da área da cidade, nem sequer para alojamentos transitórios.

E já não falo na criação de bairros suburbanos, pois, além de tal solução contrariar o projecto do Plano Director de Luanda, não existem nesta cidade as infra-estruturas de transportes colectivos, abastecimentos de água e luz, bem como outras, capazes para a vida das populações a deslocar.

Conhecedor de todas estas dificuldades, o Governo de Santos e Castro nomeou recentemente uma Comissão Provincial de Habitação, que procura encontrar soluções aplicáveis dentro de um ano, a médio prazo e a longo prazo, Comissão essa, abarcando diversos sectores ligados à habitação, que afincadamente estuda o problema, baseando esses estudos no lema de que não basta construir casas, mas é preciso promover as populações, para que essas casas não sejam meros depósitos de gente, mas lares onde haja o prazer de viver familiarmente.

Tarefa digna de sinceros encómios, que não deve ser perturbada, mas antes acarinhada e ajudada, como é, aliás, o intuito do autor do aviso prévio, que, por coincidência, é pessoa que, além de estar directa e intimamente togada à habitação em Angola, é neste Estado uma das mais competentes, pela experiência, pelas obras publicadas e pelos relatórios executados O seu plano é uma valiosa peça de estudo, em que foram abordadas com proficiência as mínimas facetas de tão árduo problema, que deveriam ser objecto da atenção cuidadosa dos organismos-cúpulas a que fosse entregue todo o sector habitacional e que ele preconiza serem o Conselho do Governo para os Assuntos Sociais, como coordenador, e a Secretaria Provincial de Habitação e Urbanização, como órgão orientador.

Esse plano, pela profundidade técnica de que se reveste e pela autoridade que lhe conferiu o seu autor, deverá, quanto a mim, ser peça de consulta para as entidades que estudam o problema habitacional em Angola. Seria mais um trabalho do Deputado José d'Almeida Santos Júnior a ser consultado, pois, não esqueçamos, dos dez que a Comissão a que me referi escolheu para basear a sua actuação cinco são da sua autoria total ou em colaboração.

De realçar nele, a parte que se refere aos meios de financiamento, que julgo fundamentais. Serão úteis e de louvar todas as medidas sociais e todos os estudos teóricos, mas sem possibilidades financeiras para construir não há solução válida para o problema da habitação. E vinte milhões de contos, no final de 1973, para Luanda, e em cinco anos mais quinze milhões, é obstáculo que não poderá ser transposto