Nestes domínios, como em muitos outros, não estamos afinal perante delicadas opções de natureza política que deveriam ter sido objecto de debate público e deliberação desta Câmara?

Quis, porém, o Governo tomar sobre si a exclusiva responsabilidade das grandes opções do desenvolvimento económico-social do País, que o IV Plano de Fomento irá promover. E envia agora à Assembleia Nacional uma proposta de lei que constitui apenas a síntese das decisões já tomadas e que o projecto do Plano especifica e articula.

Tem a Assembleia Nacional, de acordo com a Constituição, competência bastante para modificar o diploma em discussão em termos tais que impliquem a escolha de moldes diferentes de desenvolvimento e, consequentemente, a revisão integral do projecto do Plano a realizar. Mas, uma vez que o Governo já marcou posição, optando por determinado esquema em prejuízo de outros, que - é de presumir - considera inexequíveis ou inconvenientes, a posição frontal desta Câmara saldar-se-ia num conflito de órgãos da soberania, a resolver conforme os preceitos constitucionais.

A liberdade de decisão da Assembleia Nacional, num caso como o presente, que envolve um juízo global sobre a política a seguir ao longo do próximo hexénio nos domínios decisivos do económico e do social, e dada a prévia opção do Governo, é pois extremamente reduzida.

É, afinal, um voto de confiança no Governo o que esta Câmara dará ao aprovar a proposta de lei que agora nos ocupa. E tal forma de intervenção no processo de elaboração do IV Plano de Fomento, cujo significado político é por demais evidente, só não será, no entanto, praticamente supérflua na medida em que o Governo tomar em linha de conta - estou certo que o fará -, na versão definitiva do Plano e na execução que lhe vier a dar, as sugestões que aqui forem feitas e as emendas porventura introduzidas ha proposta de lei em discussão.

Porque as grandes opções já estão feitas, o que se pede à Câmara, dizia eu, Sr. Presidente, é a adesão a elas e um voto de confiança no Governo para a execução do Plano de Fomento que as deverá tornar realidade. Mas essa adesão e esse voto - que, não obstante, entendo a Câmara deve dar, aprovando na generalidade, e unanimemente, a proposta de lei agora em apreço - seriam tanto menos reticentes quanto mais pormenorizado fosse o projecto do Plano que nos foi presente.

Poder-se-ia, decerto, ter ido muito mais longe neste campo da concretização dos objectivos, da sua quantificação, da especificação dos empreendimentos que os tornarão realidade. Falta, sobretudo, na parte referente à metrópole, a estimativa dos investimentos já programados e a previsão das fontes de financiamento que lhes irão dar cobertura. Ora, sem o cálculo do seu custo de execução, difícil se toma apreciar a viabilidade do projecto do Plano e até a sua própria significação para a comunidade nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Haverá quem argumente que muitos dos empreendimentos a realizar não estão ainda sequer projectados, muito menos se dispondo do orçamento do seu custo; por outro lado, os factores de incerteza dos tempos que atravessamos, onde avulta a alta dos preços, persistente e generalizada, aqui e ali reforçada por crises espectaculares, como a do petróleo, tornam particularmente difícil o cálculo antecipado do custo de investimentos a realizar dentro de anos. Mas se esta ordem de considerações não deixa de ser exacta, dela decorrendo, a meu ver, a impossibilidade, nas condições actuais, de planear com rigor para um período de seis anos, também não o é menos que o projecto em apreciação perde assim as características de plano, para se configurar, mais precisamente, como um programa harmónico de política económica e de política social a médio prazo.

Fica, portanto, dado um passo mais na evolução da natureza do planeamento económico em Portugal. Desde sempre indicativos para o sector privado, em obediência ao princípio constitucional que garante a livre empresa, os planos de fomento começaram por ser imperativos para o sector público, na medida em que determinadas actuações neles previstas constavam de mapa anexo às leis de bases que ordenavam a sua organização, já que nunca foi objecto delas a aprovação dos próprios planos em si.

A partir, porém, do II Plano de Fomento, e continuando embora a denominar-se imperativos para o sector público, os planos de fomento nacional deixaram de ficar submetidos, na sua execução, à vinculação decorrente da força legal do aludido mapa. No caso presente, quando os próprios empreendimentos a realizar e a sua cobertura financeira ficaram esbatidos, já não parece caberem dúvidas de que estamos perante um plano totalmente indicativo: o Governo fica apenas vinculado à prossecução dos grandes objectivos constantes da lei que há-de «resultar da proposta em discussão, e dentro dos condicionalismos por ela traçados, cabendo-lhe escolher em cada ano, especificando-os no competente programa de execução, as medidas de política e os investimentos a realizar, porventura diferentes dos primitivamente encarados, consoante, o bem público aconselhe.

Tudo o que vem de ser dito não diminui o valor do documento em apreciação e vai até possibilitar. Sr. Presidente, a fundamentação de consequências políticas do maior alcance para esta Casa e para o País inteiro. É que, comprometendo-se a Assembleia Nacional com os objectivos que o Governo se propõe levar a cabo na vigência do IV Plano de Fomento, mediante a aprovação da proposta de lei em debate, e sendo, por outro lado, deferida aos programas de execução anual do Plano a especificação dos meios concretos de realização de tais objectivos - impõe-se, em minha opinião, um estreito acompanhamento, por parte desta Câmara, dos programas e dos relatórios de execução do Plano, bem como da sua projectada revisão no final do 1.º triénio.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Vou até ao ponto de defender que todos esses documentos devem ser submetidos à apreciação da Assembleia Nacional. Mas esta é matéria que melhor se esclarecerá durante a discussão na especialidade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Revertamos agora, Sr. Presidente, à proposta de lei que neste momento a Câmara debate, a fim de justificar a aprovação na generalidade, que entendo dever ser-lhe dada.