saciava toda a produção, manda a Casa do Douro, ano após ano, efectuar uma classificação das propriedades da região, na qual entram vários factores, e entre eles, a localização, exposição solar, constituição do solo, inclinação do terreno, castas, presumível produção, altitude, compasso, designando-se esta classificação por «cadastro».

Está este muito longe da perfeição, enfermado de limitações técnicas e humanas, mas abona-se do mérito de ser o único no País e, pelo que se sabe, raríssimo, se não único, no mundo vitivinícola.

Como a exportação do vinho generoso do Douro desceu a 30 000 pipas e o Douro produzia médias superiores a 200 000, impunha-se saber quais as propriedades que produziam melhores vinhos, para só esses serem beneficiados na vindima, e todos os restantes, que sobejavam, para consumo corrente, genericamente conhecidos por vinho de pasto.

O contingente a beneficiar é definido pelo Instituto do Vinho do Porto, órgão oficial criado para vel ar pela genuinidade do vinho do Porto, desde a produção à colocação nos mercados terminais.

Mercê de uma exportação ascendente, que resultou de uma eficiente e dispendiosa propaganda com amostras de boa qualidade, e não apenas com frases feitas, além de outros factores que não importa aludir, atinge-se neste ano de 1973 cerca de 56 milhões de litros.

Previsto este aumento e também pela curva crescente de exportação, fixou o Instituto em 126 000 pipas de vinho a beneficiar para a vindima de 1973, mas como o Douro produziu este ano cerca de 200000 pipas, sobram para vinho de pasto cerca de 74000 pipas - 74000 que não têm qualquer protecção.

Para os vinhos a beneficiar sai uma nota de vindima do Instituto e depois outra da Casa do Douro, que é uma cópia daquela, fixando quantitativos, preços de aquisição, de aguardente, etc., enquanto para os vinhos de pasto nunca a Casa do Douro definiu uma política de preços nessas mesmas notas, ficando estes à mercê do comércio oportunista.

Em anos de crise, e depois de muitos lavradores terem transaccionado os seus vinhos a preços deficitários, é que a Casa do Douro anunciava os preços de intervenção que aplicaria aos vinhos que ia adquirir à lavoura.

Deve referir-se que estes preços foram, com raras excepções, sempre compensadores, e as diferenças em relação aos melhores vinhos de qualidade destinados a benefício eram compreensíveis.

A fixação de preços dos vinhos de consumo, que devia ser feita sempre na referida nota da vindima, foi uma solicitação constante e insistente, mas que nunca obteve deferimento.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Fui obrigado a dizer este mínimo para esclarecer a causa da intervenção.

A vindima dos generosos de 1972 processou-se em termos normais, e só posteriormente os vinhos começaram a ter uma procura desusada para satisfazerem a avidez da exportação.

E, assim, os vinhos de primeira qualidade, que tinham um preço base de 7500$ na vindima de 1973, segundo a tabela oficial, atingiram preços superiores ao dobro, porque estamos em face de uma procura superior ao benefício de 1973.

Isto demonstra que o contingente a beneficiar devia ter sido muito superior, apesar de todas as prudências, e, assim, um maior número de proprietários ficaria abrangido e venderia o seu vinho pelo dobro do que o vendem em consumo, referindo-me aos preços base da tabela da Casa do Douro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E o que sucede?

Estão no Douro aproximadamente 70 000 pipas em consumo e que serão vendidas à média de 3500$ a pipa, enquanto vinho igual e destinado a benefício, muito para cima de 11 000$.

Esta disparidade de preços entre lavradores vizinhos arrasta os que não tiveram benefício a uma ruína imediata e total, pois têm o agravamento dos salários em 100 % e tudo o mais que necessitam para as suas explorações agrícolas.

Como pode um lavrador com vinhos de igual qualidade e que os vende a 3500$ ou 4000$ a pipa competir com o poder de compra daquele seu vizinho que os vendeu a 13 000$?

E no Douro estão 70000 pipas nestas circunstâncias.

Não me venham argumentar que é por falta de qualidade, quando todos sabem do negócio escandaloso e revoltante da venda das litragens.

Passaram os tempos em que todos tinham um ingente cuidado na escolha e feitura dos vinhos, o que hoje, infelizmente, não sucede, uma vez que se decidiram pela industrialização do fabrico, misturando uvas das mais variadas procedências.

Ainda há excepções, mas são tão poucas!

Não quero narrar a VV. Ex.ªs o que é esse escândalo das litragens, e que até se faz no próprio solar da Casa do Douro, para não me acusarem de, dizendo a verdade, estar a prestar um mau serviço à reputação da qualidade do vinho do Porto. Eu sempre defendi a boa qualidade. E só a não defende quem nunca teve o raro privilégio de saber saborear um bom vinho do Porto, o que também é uma virtude.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E por que se não acaba de vez com esse repugnante negócio das litragens, mas lucrativo para tantos?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O Douro tem o direito de ser integramente tratado, se quisermos ter um Douro capaz de atender às solicitações da exportação, e para isso os vinhos de consumo têm de ter um preço que se aproxime do destinado a benefício.

A distribuição do benefício também carece de uma imediata e honesta análise para ser mais justa e equitativa.

A Casa do Douro tem o dever de vir em auxílio da lavoura desprotegida e fazer o escoamento, mesmo que o destine a aguardente.

Se o preço desta ficar a preços incomportáveis, mas se os adicionarmos aos preços da importação da aguardente - neste País importa-se tudo -, dará um preço médio que o vinho generoso pode comportar sem agravar o preço do exportador.