quero chamar a atenção, não só dos meus pares, mas de todos os meus concidadãos.
Felizmente, tenho a satisfação de poder afirmar aqui, categoricamente, que na Guiné, apesar da guerrilha, com tentativas de subversão, alimentada de fora e que já dura mais que uma década, as relações entre os dois grupos humanos em presença - africano e europeu - não sofreriam qualquer alteração. Provam-no, além; de outros factos:
1.º A votação maciça do maior eleitorado de todos os tempos na história da província - 106798 inscritos e 90601 votantes (84,06%)- numa das miais autênticas e livres eleições de todo o (País, tendo sido a totalidade dos ventos para os dois candidatos escolhidos polo povo, ambos naturais daquela parcela da Pátria comum;
2.º A indiferença absoluta da totalidade da população da provinda perante a proclamação, pelo P. A. I. G. C. (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde), num país estrangeiro, onde tem a sua sede (a República da Guiné, do ditador Sekou Touré), da fictícia independência da (chamada «Guiné-Bissau» (sem Guiné e sem Bissau, como diria o Sr. Presidente do Conselho, Prof. Marcelo Caetano); isso, numa altura em que, ironicamente, tinha lugar a campanha para a eleição a que já me referi. Sobre este assunto, relativo a um facto ímpar na história da Humanidade, voltaremos a falar oportunamente ...
Eis o ponto da situação na província que ten ho a honra de representar mesta Assembleia, no que se refere à questão posta inicialmente por mim através desta intervenção: relações de convivência entre os cidadãos de diferentes origens que compõem a Nação.
Na metrópole, infelizmente, essas relações, pelo que me foi dado conhecer - e são muitos os casos observados -, não são satisfatórias ou, pelos menos, não são tão boas quanto seria de desejar e deveriam ser, pois é flagrante o contraste que existe entre o tratamento outrora dispensado aos portugueses africanos do ultramar que se deslocam à Mãe-Pátria e o que hoje têm da parte dos seus concidadãos metropolitanos.
Há, sem dúvida, honrosas excepções a que não posso deixar de referir-me, de passagem, uma vez que deviam constituir regra. Com efeito, no momento que passa, os cidadãos africanos, aqui na metrópole, ainda se sentem bem em certas circunstâncias, como, por exemplo, nos meios mais evoluídos, nas igrejas, o que não pode deixar de ser, em círculos restr itos de amigos, de família ou de grupos étnicos afins, nos quais «voluntariamente» se segregam. Fora desses casos, porém, na rua, nos transportes públicos, em estabelecimentos públicos ou nos locais de diversões, qualquer desses cidadãos nacionais não se sente muito à vontade, pois não são raras as provocações, directas ou indirectas, que fazem temer pela segurança individual, quando não provocam reacções indesejáveis, que têm contribuído para agravar a situação.
A confirmar o que acabo de dizer, há o testemunho das próprias vítimas de tais tratamentos inamistosos, que contrariam a velha e tradicional hospitalidade portuguesa, as quais não escondem o seu desgosto, e não perdem oportunidade de confidenciar as suas decepções, sendo frequentes perguntas como estias, com laivos de tristeza: «Não teríamos obtido maior compreensão no estrangeiro? [...]»
Eu próprio, apesar de imunizado por uma auto-preparação psicológica que me protege dos golpes daquela natureza, ten ho sido alvo de algumas provocações dessas - raramente, é certo, devido à minha condição e às minhas relações. O mesmo tem acontecido, e com mais frequência, aos meus familiares, especialmente as crianças, pois raro é o dia em que uma delas, ao regressar a casa depois de uma saída necessária e inevitável, não tenha um episódio aborrecido desse género a contar. E tanto mais sofrem com esta situação, quanto é certo que, sendo africanos, filhos de quem são, não alimentam ódios raciais nem sofrem desse complexo.
Já esgotei quase todos os argumentos com que tenho procurado acalmar os ânimos e convencer os atingidos de que tais casos são excepções; de que as pessoas que assim procedem contra eles são irresponsáveis, de baixa condição moral e soda! ou de deficiente formação; de que o Governo nada sabe, e logo que souber procurará, sem dúvida, pôr cobro a todos esses atentados à paz social e à boa harmonia entre cidadãos da mesma Pátria e contra a solidariedade nacional, etc. Felizmente que o nosso Governo não é do tipo daqueles que, como o zairiano, a que se referiu S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho na sua recente conversa em família, com a indignação que deve fazer eco em todos os portugueses, sem distinção de raças, governos que estimulam o racismo e incitam pretos contra brancos e vice-versa ...
Não me detenho, por desnecessário, a fazer uma análise minuciosa das causas desta situação deveras melindrosa, que naturalmente são múltiplas, mas devo citar aqui duas das que, pela sua importância e actualidade, são susceptíveis de pesar mais nos fenómenos que se vêm registando, sem contar com a acção de elementos subversivos que actuam na clandestinidade é aproveitam todas as oportunidades favoráveis para porem em execução os seus maquiavélicos planos. São, essas causas, a saber:
2) A explosão do fenómeno migratório interno, em especial a corrente que tem origem em Cabo Verde, onde uma prolongada crise determinou a saída em massa de homens e mulheres de modestas condições e desses sociais, dirigindo-se para a metrópole, à procura de meios de sobrevivência, o que é humano e legítimo, pois nesta complementaridade, entre as diferentes parcelas do todo nacional, deve residir a vantagem de uma comunidade como a nossa, multirracial e pluricontinental.
Bem sei que estes problemas não deixariam de merecer a atenção dos responsáveis nem escapariam à previsão do Governo, que terá procurado, na medida das possibilidades, prevenir os casos ou detectá-