Sr. Presidente e Srs. Deputados: Após interregno de uma legislatura que durou quatro anos - longos e dolorosos para todos os portugueses de verdade, nascidos aqui ou acolá -, o Governo, não reconhecendo a anexação brutal e fraudulenta do Estado Português da índia pela União Indiana, contra todas as regras de convenções internacionais, manteve neste supremo organismo do Estado que é a Assembleia Nacional a sua presença por três dos seus representantes eleitos pelo sufrágio de todos os portugueses nascidos em Goa, Damão e Diu.

Representação moral, embora, mas muito significativa, mereceu louvores e aquiescência gerais. E certo que no mundo actual, de tantas e desvairadas ideologias, esta palavra passou a ser uma figura do passado, digna de ser conservada num museu de antiguidades, precisamente porque muitas nações nunca a prezaram, pela razão muito simples de o seu passado não ser outra coisa do que mera cobiça do que outras conseguiram à custa de muito sangue e sacrifício, como fez Portugal, pois pelas terras por onde ele passou deixou parte do seu coração.

E se em outros pontos os seus navegadores e missionários criaram núcleos, aos quais transmitiram a fé que levavam, simbolizada na cruz das velas das naus, os hábitos, usos e costumes, em parte alguma essa política de amalgamação e consubstanciação teve mais nítido poente como no Estado da índia.

Esta gesta lusitana foi reconhecida e confirmada, desde séculos, por historiadores coevos e modernos, e o próprio Portugal lhe dedicou, por especiais gestos de benemerência, a sua afeição, a sua dedicação e a sua ternura, motivo por que aí deixou povos criados à sua imagem e semelhança, enquanto outras nações apenas legaram ódio e rancor, motivo por que se viram obrigadas a abandona-los à sua sorte.

E, assim, nota-se por toda a parte onde Portugal fincou o pé terem ficado marcas indeléveis da sua passagem deixando, ainda hoje, apesar de ali não estar presente recordação e saudade.

A todas - próximas umas, longínquas outras -, acolhidas ao seio materno português, como se tivessem nascido do próprio ventre, a Pátria nunca as esqueceu, como se viu quando da violenta usurpação desses pedaços da sua alma que são Goa, Damão e Diu.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - De par em par abriu aos seus filhos as portas do lar pátrio, cumulando-os de atenções que não se podem esquecer, continuando a reconhecer-lhes os mesmos direitos e regalias que, desde sempre, lhes tinha outorgado, ainda da sua representação na Assembleia Nacional, pois ela data de 1822, facto que em nação se verifica.

O Estado da índia enviou seus Deputados às Cortes como ao Parlamento. Não poucos deles foram verdadeiros gigantes, marcando a sua passagem de uma forma invulgar;...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... brilhando como estrelas de primeira grandeza no firmamento intelectual de Portugal de outras eras e ainda de tempos não muito distantes, conquistando alguns renome internacional.

É esta a honrosa e dignificante herança que aos actuais representantes eles legaram.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Oxalá sejamos dignos dela, porque é muito pesada o árdua, sobretudo para os meus débeis ombros.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: A voz do Estado português da índia morreu nesta Assembleia na fria madrugada de 18 de Dezembro de 1961, completando daqui

dois dias precisamente quatro anos. Não vou recordar os motivos e as razões desse doloroso e trágico silêncio, (que só o decorrer do tempo poderá desvendar o mistério à plena luz da verdade.

Porém, ela ecoa novamente nesta sala pela dos representantes que aqui se encontram.

Cabe-nos, pois, a indeclinável obrigação, quase dever, de, em primeiro lugar, agradecer do mais fundo da alma todas as cativantes gentilezas, amabilidades, atenções e conforto com que foram rodeados todos os portugueses de Goa, Damão e Diu fugidos à opressão indiana, acolhidos à protecção da Mãe-Pátria.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nestes últimos quatro anos são milhares de compatriotas nossos, que, não desejando continuar sob o impiedoso ergástulo a que foram sujeitos pelo tirano invasor, abandonaram os seus lares, os seus haveres e tudo o que lhes era querido.

Não há meio mais ignóbil a que ele não tenha lançado a mão para erradicar daquele solo sagrado os vestígios da cultura ocidental e cristã, cujos ecos doloridos chegam até nós, rompendo a densa cortina de Kadi que sobre ele desceu, como o atestam escritores e historiadores de nomeada, que recentemente aí estiveram, salientando entre eles Graham Green.

É autêntico ordálio por que estão a passar os Goeses, Damanenses e Diuenses, que pretendem manter viva a chama da Pátria Portuguesa, cujo mais destacado protótipo é Mons. Francisco Monteiro, conhecido por todos como P.e Chico, verdadeiro guia. para não dizer apóstolo, da mocidade goesa.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Para estes outros vão toda a nossa solidariedade, a nossa gratidão e o nosso respeito, no que, creio, a distinta Assembleia há-de concordar e apoiar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não posso, quase me é impossível, nomear todos a quem devemos o calor da sua caridade, fraternidade e amizade.

Seria, porém, injustiça não referir as provas de sincera afeição da parte de SS. Exas. o Chefe do Estado, Presidente do Conselho, todos os membros do Governo, influindo as autoridades do País, quer do continente, quer do ultramar, ainda dos mais afastados lugarejos, bem como o bom povo português, que, nas horas boas e amargas, sempre lhes dedicaram.

Não me esquecerei dos que nesta Assembleia, em todos os aniversários do iníquo sequestro daquelas nossas terras, lhes dispensaram palavras de carinho e afecto.

A todos só podemos agradecer com lágrimas que brotam espontâneas dos nossos corações sinceros e gratos.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Poderá parecer a alguns que venho trazer para aqui uma braçada de goivos e perpétuas, mas, por mais que queira, não posso arrancar