Daqui só posso concluir que o Governo deseja encarar de frente e em toda a sua extensão o problema da educação e doutrinação da juventude, e para tal terá obviamente de investir algum capital e sobretudo muito trabalho.
Considerei necessário recordar estas duas passagens para referir a VV. Ex.ªs, em primeiro lugar, que não considero a parte financeira a mais importante na resolução, em plano nacional, deste problema. Contudo, ela é necessária; o dinheiro - já o tenho ouvido dizer - não dá a felicidade a ninguém, mas ajuda muito a suportar a pobreza.
Em segundo lugar afirmei aqui, e reafirmo agora, que a família é efectivamente a base para a educação. Mas a família tem de estar apoiada. Eu vejo à minha volta muitas famílias que são bem formadas do ponto de vista cristão, do ponto de vista cultural, do ponto de vista político, e que vêem os seus filhos crescer e enveredar por caminhos completamente diferentes daqueles que elas seguiram.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Vejo com frequência pais como eu, da minha idade ou pouco mais velhos, lutando com dificuldades enormíssimas para proceder à educação dos seus filhos. Porquê? Porque os filhos, não obstante terem a família, vivem muito fora da família, em conjunto com outros na escola, nos cinemas, nos clubes, em suma junto a muita gente que não tem a formação que os pais lhes dão em casa, e são muitas vezes sensíveis à doutrinação errada que fora lhes incutem e a um aliciamento constante para caminhos que os desviam daqueles que os pais lhes traçaram.
Os meus filhos - e tenho oito - até agora não me trouxeram qualquer desgosto nesta matéria, mas trazem todos os dias para casa perguntas e relatos que me confrangem e afligem, porque não sei nunca até que ponto eles continuarão a acreditar mais em mim do que nos outros.
Na escola, sabemos que se dá instrução, mas infelizmente não se dá educação. Eu estou a recordar-me, e ainda emocionado pelas palavras que há pouco ouvi sobre a índia, que um dos meus filhos ouviu há dois anos a professora declarar: «Eu não dou a índia, porque já não existe». Isto passou-se e isto passa-se, e é nessas escolas que os nossos filhos andam.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Eu tenho efectivamente muita apreensão com o problema da juventude...
O Sr. António Santos da Cunha: - Temo-la todos nós!
O Orador: - ... porque vejo uma evolução decrescente, em certos aspectos, na confiança que a juventude nos merece. E não a culpo a ela, mas a nós, que somos os responsáveis pelos problemas e desvios da juventude.
E só pus o problema em relação às famílias cujos pais são bem formados, e esses são uma minoria. Há milhares de jovens entregues a pais que não têm qualquer formação. Esses, portanto, nem a família têm para os educar.
Efectivamente, quando li a Lei de Meios e vi referências a pormenores que a mim me pareceram de facto pormenores, como a construção de caminhos, a construção de mercados, etc., chocou-me profundamente que não existisse em todo o texto a palavra «educação».
Existem vários artigos onde eu gostaria muito de ver a intenção de resolver o problema da educação, mas essa intenção não está lá. Inclusivamente o artigo que diz que «os investimentos públicos serão em princípio concentrados nos sectores de maior reprodutividade», pois eu considero a educação o sector de maior reprodutividade. Mas não vejo também nesse artigo qualquer referência à educação, muito embora no parecer da Câmara Corporativa se escreva em certo passo do relatório sobre esse referido artigo:
Estas considerações são por igual aplicáveis aos investimentos públicos, normalmente de reprodutividade indirecta, como é o caso dos investimentos sociais e culturais (saúde, educação, habitação). Com efeito, entre nós, o investimento público, para além de certos sectores básicos, como os assinalados, tem um carácter supletivo, destinando-se essencialmente a suprir eventuais insuficiências da iniciativa privada.
No capítulo dos investimentos parece-me efectivamente que a lei deve incluir investimentos sérios na educação e lamento que seja omissa em tão importante matéria.
Se não sou, portanto, sensível à argumentação técnica da dificuldade de incluir na Lei de Meios um artigo destinado a prever investimentos na educação, argumentação que não aceito, sou sensível à forma como julgo ter visto acarinhada e apoiada a minha intervenção...
O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem!
O Orador: - ... e sensível ao saber e à experiência que a grande maioria dos que aqui estão têm em relação a mim.
O Sr. Soares da Fonseca: - Não quer dizer que V. Ex.ª não faça parte da «maioria», pois tem um «saber» que eu invejo.
O Orador: - E a sugestão do Sr. Dr. Soares da Fonseca de que o problema teria mais relevância se fosse apresentado em aviso prévio e estudado com maior amplitude na Assembleia leva-me a concluir que não deve pesar o meu raciocínio mais do que o vosso parecer na minha decisão.
Eu não sei se é possível e se é regulamentar pedir a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que consulte a Assembleia sobre a opinião do Sr. Dr. Soares da Fonseca, e se, realmente, a Assembleia se pronunciar no sentido de este assunto ser tratado em aviso prévio, eu retirarei a minha proposta.
O Sr. Presidente: - Informo V. Ex.ª de que só posso pôr à votação da Assembleia se a proposta apresentada pode ou não ser retirada.
O Orador: - Sendo assim, e como julgo ter sentido na Assembleia o seu apoio à sugestão do Sr. Dr. Soares da Fonseca, peço à Assembleia para retirar a minha proposta, e reservo-me então para na altura própria fazer o meu aviso prévio.
A Sr.ª D. Maria Ester de Lemos: - Peço a palavra!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Braamcamp Sobral pede para retirar a sua proposta. Consulto, por isso, a Assembleia sobre se autoriza a retirada da proposta.
Consultada a Assembleia, foi autorizada a retirada da proposta.