Ainda que o problema suscite dúvidas, a Câmara pronuncia-se no sentido da sua oportunidade, tendo em atenção o seguinte:

Em primeiro lugar, a proximidade da publicação do Estatuto da Função Pública é relativa.

Por iniciativa do Prof. Marcelo Caetano, à data Ministro da Presidência, foi elaborado já em 1957 um projecto de estatuto, mas a verdade é que, não obstante o disposto no artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 44652, de 27 de Outubro de 1962 - o qual, visando a maior eficiência e rapidez de acção da Administração, estabeleceu que o mesmo seria promulgado até 31 de Dezembro de 1963 -, aquele ainda não foi publicado e não se sabe quando o será, dada a complexidade dos problemas pertinentes à generalidade dos funcionários, em razão da diferente natureza dos serviços em que se acham integrados.

O que se passou em França com a elaboração e execução do Estatuto Geral dos Funcionários dá ideia da delicadeza do problema.

Assim, aprovado pela Lei de 14 de Setembro de 1941, foi profundamente alterado pela Ordenasse de 9 de Outubro de 1945, que, além de unificar as categorias de funcionários das diversas administrações centrais, criou uma direcção da função pública encarregada de coordenar os métodos de recrutamento e de estudar todos os problemas respeitantes aos funcionários e, bem assim, u organização dos serviços públicos.

Este estatuto foi substituído por outro, aprovado pela Lei de 19 de Outubro de 1946, que consagrou, como aliás já o tinha feito o estatuto anterior, a jurisprudência do Conselho de Estado relativa à definição da qualidade de funcionário, à sua situação jurídica, aos direitos de que beneficia e às obrigações gerais que lhe competem.

O estatuto de 1946 previa, para determinadas categorias de funcionários, estatutos particulares aprovados por via regulamentar e destinados a fixar, tendo em atenção a natureza especial dos serviços, as modalidades de aplicação do estatuto geral.

Publicada a Constituição de 4 de Outubro de 1958, que nos artigos 34.º e 37.º fixou a matéria reservada à lei e ao regulamento, passando a ser apenas matéria de lei as normas concernentes às garantias fundamentais concedidas aos funcionários civis e militares do Estado (Constituição, artigo 34.º), o Governo, no uso dos poderes especiais conferidos pelo artigo 92.º da Constituição, publicou a Ordonnance n.º 55-244, de 4 de Fevereiro de 1959, que constitui o Estatuto Geral dos Funcionários actualmente em vigor.

Os funcionários locais gozam de um estatuto semelhante aos dos funcionários do Estado (Lei de 20 de Abril de 1952), sem prejuízo, porém, da autonomia municipal e dos caracteres particulares da função pública local.

Perante esta tendência reformadora, comum aos governos dos diferentes países, já houve quem observasse que «a primeira reforma devia consistir em aplicar as reformas» ... (Fonte: La vie- administrative, in La Revue Adminiatrative, n.º 102, 1964, p. 621).

Nesta matéria, melhor sorte lograram entre nós o Estatuto dos Funcionários Administrativos, codificado no Código Administrativo, e o Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, aprovado pelo Decreto n.º 40 708, de 31 de Julho de 1956, pois estes diplomas, não obstante o lapso de tempo decorrido, designadamente quanto ao Código Administrativo, mantêm-se em vigor, com pequenas alterações.

Na Bélgica, o Estatuto dos Funcionários de 1937 foi modificado e refundido pelo Decreto de 16 de Março de 1964.

Entre os diplomas mais recentes relativos aos estatutos dos funcionários contam-se, na Alemanha, a Lei de 14 de Julho de 1953; na Itália, a Lei de 10 de Janeiro de 1957; na Espanha, a Lei de 20 de Julho de 1963 e o Decreto de 7 de Fevereiro de 1964, completados pelas Leis de 4 de Maio de 1965 e 11 de Setembro de 1965; no Brasil, para funcionários federais, a Lei n.º 1711, de 28 de Outubro de 1952, alterada pelas Leis n.01 3780 e 3826, respectivamente de 12 de Julho e 23 de Novembro de 1960. Aos membros do magistério, do Ministério Público e da carreira de diplomata, regidos por leis especiais, são aplicadas, subsidiariamente, as disposições deste estatuto (Lei n.º 1711, artigo 253.º). J Assim, ao lado do estatuto que contenha as normas comuns à generalidade dos funcionários, admitem-se estatutos particulares ou normas especiais aplicáveis a determinadas categorias de funcionários, em razão da natureza dos serviços e das funções que exercem (magistrados, diplomatas, professores, etc.).

Deste modo, perante a extensão e complexidade de que necessariamente se reveste a sua elaboração, a futura publicação do Estatuto da Função Pública não obsta a que se proceda desde já à revisão do que se acha estabelecido acerca da preferência no provimento de lugares de ensino primário; antes, pelo contrário, a apreciação do projecto pode trazer alguma achega para a inclusão naquele estatuto ou no Estatuto dó Ensino Primário, cuja publicação se afigura urgente, de normas especiais resultantes do estado familiar.

Por outro lado, as dúvidas suscitadas no provimento de professores por preferência conjugal levaram a exarar numerosos despachos que, sob o pretexto de interpretarem o artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 27 279, de 24 de Novembro de 1936, alargaram o seu campo de aplicação, suscitando, por sua vez, outras dúvidas.

Ora, acabar com essas dúvidas e reunir num único diploma o que nesta matéria se acha disperso por vários constitui um dos objectivos do projecto de lei em apreciação, que, nesta parte, não pode deixar de merecer a concordância da Câmara.

$ 3.º Do ensino primário O ensino primário oficial, instituído em Portugal em 1772, tornou-se obrigatório a partir de 1835.

Desde então, através das reformas mais diversas, sofreu alterações profundas quanto às classes, graus e sua designação, disciplinas que o constituem, escolas que o ministram, mencionando-se apenas, por serem as principais, as efectuadas antes da proclamação da República em 1844, 1870, 1878, 1894, 1897 e 1901.

Já então, como se lê no relatório da reforma de 22 de Dezembro de 1894, «a multiplicidade de leis ou diplomas com força de lei pelos quais têm sido regulados os serviços de instrução primária, a diversidade de circunstâncias e de intuitos em que foram concebidos e pró-