Embora lá se diga que «fomentar, pois, a unidade do lar é contribuir para assegurar a estabilidade da família, que tem no lar, na comunhão de mesa e habitação dos cônjuges e dos filhos, o seu natural suporte» (§ 8.º, n.º 15), a opinião da Câmara Corporativa quedou-se em reserva excessivamente prudente e entendeu não querer ir além do enunciado ...

Isto significa que no parecer da Câmara Corporativa as razões de defesa da família não procedem para todos os lares e que, portanto, são só dignos de atenção e susceptíveis de direitos os casais em que marido e mulher exercem o professorado primário.

Pode também concluir-se, ainda dentro do espírito do parecer, que não é aconselhável o casamento de professores primários com funcionários públicos ou administrativos. Francamente, não conheço motivo que o justifique.

Tenho para mim que todos os lares são merecedores de protecção e, desse modo, interessa garantir-lhes o máximo de ajuda conducente a tornar real a sua u nidade.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Não compreendo por que podendo fazer muito nos sujeitamos ou satisfazemos em realizar pouco. Temos de nos capacitar de que ultrapassámos o tempo em que «qualquer coisa» bastava.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Os problemas, hoje, exigem ser estudados no sentido de comportarem a solução mais ampla.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: -A visão acanhada das realidades deve ser banida, pois não representa progresso espiritual nem material.

O parecer da Câmara Corporativa encaixa-se, modestamente, à sombra do que está, sem preocupações de contribuir de modo válido para a melhoria de vida de milhares de portugueses.

O que sugere a Câmara Corporativa corresponde à manutenção da lei vigente (Decreto n.º 27 279, de 24 de Novembro de 1936, e Decreto n.º 19531, de 30 de Março de 1931), com excepção apenas da preferência atribuída às professoras solteiras [parecer, base I, n.º l, alínea b)],

Relativamente ao projecto de lei, além da referida, há a preferência da naturalidade [base I, n.º l, alínea c)], se bem que conste já - e mais ampla - do n.º 5.º do artigo 11.º do citado Decreto n.º 19 531.

Porém, a grande diferença reside na exclusão, no parecer da Câmara Corporativa, da matéria da alínea b) do n.º 1 da base I do projecto de lei, do que resulta não alargar, não fazer extensivo a maior número de casais, o benefício da estabilidade do lar.

Penso que qualquer alteração de fundo ao escopo do projecto de lei só deve realizar-se no sentido de lhe ampliar o âmbito, por forma a incluir também os professores dos outros graus de ensino, como, aliás, o nota o parecer (§ 7.º, n.º 11.º), embora compreenda ser, nesta ocasião, matéria deslocada.

Yozes: -Muito bem!

O Orador: - Estas as razões que conduzem a negar a minha concordância ao parecer da Câmara Corporativa, que considero pouco atento às realidades actuais, na medida em que não acolhe vantagens de ordem moral que a

família reclama, nem encara a extensão a maior número de lares dos benefícios, económicos de que tanto carecem.

Mas não quero deixar de manifestar ao autor do projecto de lei as minhas felicitações pela apresentação, em texto juridicamente equilibrado, de resposta oportuna aos anseios morais e materiais de classes bem desprotegidas: professores primários e funcionários públicos.

Por isso, é com verdadeiro entusiasmo que dou o meu voto na generalidade ao projecto de lei em discussão.

Tenho dito.

Yozes: -Muito bem, muito bem 1 O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. José Alberto de Carvalho: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O presente projecto de lei dignifica o seu apresentante, Sr. Deputado Borges de Araújo, pelo que representa da sua preocupação acerca dos problemas humanos que no momento presente enchem de dificuldades o desempenho da missão de ensinar que aos professores do ensino primário compete. Diminuídas pela amarga realidade de uma remuneração das mais baixas na escala das remunerações do trabalho, as professoras primárias vêem-se solicitadas constantemente por situações que lhes são criadas da parte daqueles que, possuindo mais remuneradora compensação material, medem as resistências e os valores pelo deturpado conceito que a posição material de desafogo lhes criou.

Para eles não conta a força de espírito, nem conta, porque a desconhecem, a luta do dia a dia que travam essas sublimes educadoras, que se desdobram a todo o momento na sua dupla e única missão de mãe e professora, dando-se constantemente em espírito e amor aos filhos que adoram e aos alunos, seus filhos também, que amam; e contando com que a dor das dificuldades permanentes de uma vida de renúncias ao bem-estar vençam a força espiritual e moral que formam a personalidade de quem educa, insistem no seu ataque.

Não fica dele, louvado seja, evidente sinal que macule essa tão digna classe, mas quanta vez fica ferido o pudor e o sentimento mais íntimo da dignidade de uma esposa, ou mãe, com profundos sinais de alterações psicológicas. Se outro valor não tivesse esta lei que se propõe, apenas este, que permitirá uma diminuição desses perigos, pelo viver em comum, evitando as longas deslocações e as demoradas ausências, seria bastante para merecer desta Câmara a sua aprovação.

O estudo da presente proposta leva-nos, porém, a que nos debrucemos sobre dois aspectos que dela se extraem: o seu valor económico-social em relação aos funcionários beneficiários e o seu reflexo sobre a Administração.

Lançado num mundo inacabado e sabendo-se dotado de semelhança com o Criador, o homem sente em si a capacidade de realizar a vontade criadora de Deus. Este facto dota o homem de uma finalidade própria e de responsabilidade, levando-o a viver a transcendência na sua trídua significação: coexistência, existência no Mundo e tendência definitiva para Deus, transcendendo-se, assim, a si mesmo.

Porque coexiste, o homem tende naturalmente para o «tu», isto é, tende para o conhecimento íntimo do seu semelhante. Semi isso o homem aniquilar-se-ia no seu próprio egoísmo, consequentemente viveria desesperado em -razão da sua própria esterilidade & da sua insaciável insatisfação; o dizer-se., pois, que o homem é um social significa que tem necessidade de «encontro», através do qual aprecia os seus próprios valores1 e realiza na sua existência concreta os valores universais da humanidade.