O Orador: - ... o apontamento devido à obra que nos legou e que perpetua o seu nome.

Mas ficaria de mal com a minha consciência, eu homem do Norte, eu aprendiz do ofício de historiador, se hoje deixasse passar este dia sem neste lugar, erguendo uma vez mais, como todos os dias faço, os meus olhos para a nobre figura daquele que do alto, na evocação do pintor Veloso Salgado, como que nos contempla a todos e acompanha os nossos trabalhos, o lembrar e lhe prestar a homenagem que lhe é devida e de algum modo reivindicar para ele a justiça que tantas vezes lhe é negada.

Com efeito, Sr. Presidente, até de antipatriota se tem acusado o pobre cardeal Saraiva, já esquecidos esses de que logo em 1806, ainda moço, ainda com a sua cogula a recobrir-lhe o corpo, porém já doutor em Teologia e lente pela Alma Mater Conimbrigense, seria ele a chamar a si a responsabilidade de membro da Junta Militar do Minho, assumindo posição singular contra o invasor francês.

E depois encontramo-lo sempre na primeira linha da luta, até 1820, quando da revolução de Agosto. Nele, como noutros não arrastados pelos ventos que sopravam do sinédrio, mas sim ainda impulsionados por sentimentos patrióticos que os levavam a reagir contra o domínio inglês, contra o domínio de outro invasor, contra um domínio tirânico, era ainda o patriotismo que o movia. Sacrificou também nas aras da política do tempo, foi vítima dos vendavais. Vemo-lo, por isso mesmo, em 1823, exilado no Mosteiro da Batalha e em 1828 exilado na serra de Ossa, de uma e outra vez exilado na própria pátria. Mas ainda bem - quase me atrevo a dizer -, ainda bem que lhe foi movida perseguição, perseguição que se traduz nesses dois exílios, porque, tanto no Mosteiro da Batalha como na serra de Ossa, havia de nascer o escritor e, para além do escritor, o historiador que melhor soube servir a sua pátria. Bem a serviu como mestre e reitor da Universidade de Coimbra. Serviu também a Santa Igreja como bispo-conde de Coimbra e, mais tarde, como car-deal-patriarca de Lisboa. Mas foi sobretudo alto o serviço que prestou às Pátria como historiador. Tantas e tantas vezes se tem esquecido o valor da obra do cardeal Saraiva e de tal modo se tem ocultado o que ela representou para o seu tempo, que podemos concluir ser fácil, como tem sido até agora, denegrir a sua figura, amesquinhá-la e caluniá-la. Não o devemos fazer nós, que estamos no pleno conhecimento da sua obra, e sobretudo hoje, que podemos saber a sua orientação, o seu sentimento e até a sua preocupação maior.

Com efeito, não pode ser acusado nem de libertário nem de antipatriota quem se debruçou sobre o problema das origens de Portugal e procurou aí, mergulhando bem fundo nessas raízes, suspeitar e logo realçar quanto nos caracteriza como nação independente a partir das mesmas origens. Igualmente não pode ser acusado de antipatriota quem, mais tarde, se debruçou sobre os problemas dos Descobrimentos, desde logo apontando, confirmando, porque demonstrou imediatamente, que essa epopeia nos seus objectivos como nas suas consequências imediatas não foi mais do que a continuação de uma cruzada tendente a constituir uma unidade nacional, repartida embora por vários continentes. Assim sendo, é de inteira justiça reivindicar para o cardeal Saraiva a merecida classificação, a que lhe vai mais a carácter, de mestre da contra-revolução.

E a esse mestre da contra-o-evolução, ele, repito,- que havia sacrificado também na ara do liberalismo, ele que por vezes parecia transigir com ideias estranhas, mas que veio a reagir contra elas, que presto a minha homenagem; a esse que, continuando o rumo definido dentro da própria Ordem em que professou, seguindo a lição dos seus mestres, mais tarde, maduro, concentrado, senhor de vasto cabedal de conhecimentos, nos disse o que devíamos fazer daí para o futuro em toda a matéria de evocação histórica.

É para esse cardeal Saraiva que reivindico a qualidade de mestre da contra-revolução e nessa qualidade o quis lembrar, prestando-lhe a minha homenagem ao verificar que se comemorava hoje o 2.º centenário do seu nascimento.

E para concluir, como a melhor e mais significativa das homenagens devidasao cardeal Saraiva, permito-me sugerir que, pelo Ministério da Educação Nacional e por intermédio do Instituto de Alta Cultura, se promova a edição dos escritos dispersos do cardeal Saraiva, completando-se assim a sua obra, já hoje repartida por dez volumes, e também, se possível, a edição dos inéditos que sei encontrarem-se em poder dos seus familiares.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

O Sr. Presidente: - Interrompo a sessão por uns minutos para entrarmos na primeira parte da ordem do dia: preparação das listas para eleição das Comissões de Trabalho, Previdência e Assistência Social e do Ultramar.

Eram 17 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 17 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: Fez-se a votação.

Vai passar-se à votação.

O Sr. Presidente: - Está concluída a votação. Designo para escrutinadores da Comissão de Trabalho, Previdência e Assistência Social os Srs. Deputados Pacheco Jorge e Borges de Araújo; e da Comissão do Ultramar os Srs. Deputados Aulácio de Almeida e Serras Pereira.

Fez-se o escrutínio.

O Sr. Presidente: - Está concluído o escrutínio. Para a Comissão de Trabalho, Previdência e Assistência Social entraram na uma 89 listas. Tiveram 89 votos os Srs. Deputados: Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso, Albano Carlos Pereira Dias (Magalhães, Antão Santos da Cunha, António Calapez Gomes Garcia, Arlindo Gonçalves Soares, Augusto Salazar Leite, Elísio de Oliveira Alves Pimenta, Fernando Cid de Oliveira Proença, Fernando de jMatos, Henrique Veiga de (Macedo, Jorge Barros Duarte, José Henriques GVÍouta, José dos Santos Bessa, Leonardo Augusto Coimbra, Maria de Lurdes Filomena Figueiredo de Albuquerque, Mário Bento Martins Soares, Manuel Henrique Nazaré e D. Sinclética Soares Santos Torres; com 88 votos foram eleitos os Srs. Deputados António José Brás Regueiro, Francisco José Cortes Simões e José Pais Ribeiro.