um adoptava 5 milhas, outro 9 milhas, outro 10 milhas, outro 200 milhas, e um, 50 km.

Alais uma vez, por desentendimento acerca do direito de pesca, a Conferência teve de encerrar sem haver sido obtido acordo quanto ao ponto fundamental que provocara a sua convocação: a largura do mar territorial.

E, todavia, curioso registar que, tendo as duas últimas guerras mundiais demonstrado a dificuldade, para os Estados não envolvidos, de defenderem eficazmente a neutralidade nas suas águas para além de 3 milhas (52), se notou de então para cá um crescente número de países dispostos a alargar para além desse limite o seu mar territorial (M).

O facto representa, muito provavelmente, «uma fonte potencial de dificuldades futuras» (M).

Mas uma coisa, desde ]&, parece indicar como certa: menos do que em 1930 se entrevê hoje que esteja próximo o momento em que será possível estabelecer uma regra uniforme sobre a largura do mar territorial quer por via convencional, quer por espontâneo consenso dos Estados. O nosso direito interno refere-se à largura do que chama águas territoriais, ou jurisdicionais, em determinadas acepções particulares. (Mas não a menciona nunca em termos gerais, nem a este propósito se pode dizer que exista uma tradição jurídica nacional.

Gama Barros, lembrando que a «pirataria era um dos maiores inimigos com. que tinha de lutar geralmente o comércio marítimo durante a Idade Média», aponta os acordos estabelecidos com outros países, os privilégios concedidos a mercadores estrangeiros e as medidas1 a partir do século xiii tomadas para enfrentar o flagelo, repetidamente denunciado em cortes (M).

Neste ponto, as nossas dificuldades não diferiam das que tinham de enfrentar as restantes nações europeias, atlânticas ou mediterrânicas.

A «opiniom de Bartholo», que não existindo lei do Eeino as Ordenações mandavam que em última análise fosse guardada (56), era já conhecida e seguida no reinado de D. João I.

.Sem embargo, nas pazes com Castela, concluídas em Medina dei Campo a 31 de Outubro de 1431 e ratificadas pelo rei em Almeirim a 27< de Janeiro de 1432, na companhia de seu filhos, ficou capitulado «que dos lugares donde em hQu rreyno sooem ser ancorados navyos ataa hüa legoa, nom possam ser tomados por naturaes e sobdictos do outro rreyno, em todollos portos e abras e quebradas e ancorações de cada hüú dos dictos rreynos e senhorios» (57).

A .distância de uma légua, que a aproximação com outros textos leva a pensar teria o mesmo valor que ainda hoje

(*) Cf. v. g., Balladore PaJlieri, «Un problema sempre inso-luto: lesíensione dei maré territoriale», em D. Internae., vol. xm (1959), p. 100.

(") Cf. Boaretto, «Maré», em Novíssimo Dig liai.,- vol. X (1964), p. 362.

(") Brierly, op. cif. Na tradução portuguesa: p. 208.

(55) História da Administração Pública em Portugal ..., Lisboa (2.a edição dirigida pelo Frof. Torquato de Sousa Soares, e. d.), t. x, pp. 2121 e eegs. e 3)33 e segs.

() Ordenações Afonsinas, livro n, t. ix, § 2; Ordenações Manuelinas, livro n, t. v, § 1; Ordenações Filipinas, livro m,

(ST) Capítulo 12, que no texto castelhano corresponde ao cap. 13 em Monumento, Henricina, Coimbra (1962), v. IV, p. 18 e eegs.

é atribuído a essa medida .no nosso país(58), tomava o lugar das 100 milhas, propostas por Bártolo. Por necessidade de negociação, ou por corresponder a costume enraizado?

A destrinça poderia ter interesse quanto ao Atlântico Norte. Mas não em relação ao Atlântico Sul, onde desde o início praticávamos de maneira sistemática a política do maré clausum.

A primeira lei que o atesta é já de D. Afonso V. Data de 22 de Outubro de 1443.

Daí em diante, invocando como título primordial a concessão pontifícia («esguardando nos em como os samtos padres de Boina nos teem feita merçee e doaçom») e juntando-lhe o bom uso dela «com grades gastos e pe-rijgos e despesas», como no intróito de outra lei sua, esta de 31 de Agosto de 1474 (59), se exprime o monarca, arrogam-se os nossos reis o domínio dos mares e acrescentam aos seus títulos os «ditados» de senhores do comércio, navegação e conquista dos novos mares e das novas terras descobertas.

As Ordenações-decretam proibições formais e fulminam com severas penas quantos tentem turbar este monopólio ou vão sem licença régia à «Guinee, e índias, e quaisquer outras Terras e «Mares, e lugares de nossa Conquista» (60). Leis extravagantes, como a de 9 de Fevereiro de 1591 ou a de 18 de -Março de 1605 (61), reproduzem ou reforçam, quando não ampliam, estas disposições.

A doutrina do monopólio da navegação e comércio no Atlântico Sul e no Indico é, desde os derradeiros anos do século xvi, vigorosamente apoiada por jurisconsultos como António da Gama (6a), Jorge Cabedo de Vasconcelos C8) ou Bento Gil (M).

Em 1608, pouco antes de publicada a obra de Bento Gil,. saía anonimamente a lume o opúsculo já referido de Grócio, Maré Liberum.

Morto entretanto Bento Gil, tomar iasobre si o encargo de defender os direitos da coroa de Portugal Fr. Serafim de Freitas, com o De Justo Império Lusitanorum Asiático (65).

A argumentação de Serafim de Freitas será alargada por Domingos Antunes Portugal, que não descura a tradição bartolista:

Tandem facit, quod maré dicitur de território illius civitatis cui appropinquat [...] quia maré dicitur esse de território Principis, cujus provinciis adhaerat

(") Cf. v. g., a Crónica de D. João I, em cujo cap. cxxxi-A Fernão Lopes refere a chegada da frota portuguesa a Cascais, «lugar que eram cinco léguas da cidade», o que condiz com a atribuição de tal valor.

No mesmo sentido se pronunciava Gama Barros, op. cif. t. z, p. 87.

(5>) Reproduzida pelo Prof. Paulo Merêa, op. e Zoe. cito., pp. 43-45.

() Ordenações Manuelinas, liv. v, t. 109, Cf. tt. 81 e 113 (na ed. de 1521, o t. 109 tem a numeração de 112). Ordenações Filipinas, liv. v, t. 107. Cf. tt. 106 e 108.

(61). Ambas nas Ordenações «Vicentinas» (1747), vol. v; e a segunda tb. em Andrade e .Silva, Collecção Chronologica da Legislação Portuguesa, Lisboa (1854), anos de 1603-1612, p. 108.

(az) Dicisionum Supremi Senatus Invictissimae Lusitaniae Regis, Lisboa (1578), Dec. cccxxxv.

(") Valhadolid (1625). Há tradução de M. Pinto de Meneses, com introdução do Prof. Marcelo Caetano, Lisboa (1959), vol. i.