Cabe relembrar que actualmente 50 por cento do produto nacional é formado unicamente em dois distritos do País e que a restante metade se reparte desigualmente pelos outros, onde habita cerca de 70 por cento- da população do continente. Cingindo-me apenas ao distrito de Évora, que me honro de aqui representar, e cujo mandato livremente aceitei, liberto de quaisquer compromissos, mas consciente dos meus deveres para com Deus e a Pátria, dizia, cingindo-me apenas ao distrito de Évora, constato que todos estes desníveis, contrastes e anomalias verificados se bem que com muitas lacunas e imperfeições têm os seus reflexos mais ou menos acentuados.

Considerando o continente e comparando os resultados dos dois últimos censos 1950 e 1960 , podemos verificar que a população se concentra num grande pólo a capital, com l/10 da população, e que em oito distritos (Beja, Castelo Branco, Coimbra, Évora, Portalegre, Faro. Guarda e Viseu) se verificou uma redução absoluta da população presente neste decénio. Este decréscimo demográfico assinalado tem como causa mais relevante a emigração, uma vez que existem saldos fisiológicos.

Esta conclusão engloba, por seu turno, um conjunto de situações a que, em regra, o êxodo anda ligado.

Ao nível regional, a transferência da mão-de-obra agrícola para os outros sectores tem-se verificado a um ritmo baixo por razões mais que óbvias: indústria insípida, pequeno e médio comércio vivendo num mundo de dificuldades cada vez mais agravadas com tributação e encargos de ordem vária, salários de baixa remuneração, fraco poder de compra para as classes menos abastadas, na qual podemos incluir os funcionários públicos, alguns dos quais suportam, a ocultas, sacrifícios enormes para ocorrerem às necessidades mínimas do seu agregado familiar.

Na verdade, têm chegado até nós ecos de uma situação d.o mal-estar resultante da elevação do custo de vida que se agrava semana após semana. Aliás, na proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1966 pode ler-se a p. 66, que:

No decurso do corrente ano foi reforçada a acção tendente a limitar a elevação do custo de vida, em especial no que toca aos bens alimentares, dada a sua projecção nos orçamentos das famílias de menores rendimentos ...

Apesar de intenções tão justas, infelizmente o custo de vida em Évora, por exemplo, continua a situar-se ao nível do de Lisboa, se não mais agravado, como aconteceu no decorrer do ano de 1965 (vide índices de preços do Instituto Nacional de Estatística, quadro vi, da Conta Geral do Estado, a p. 25). Tenho para mim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a convicção de que se deve contrariar, na medida do possível, st tendência generalizada de os apoios e incentivos &e orientarem mais para a indústria e para as actividades ternárias - decerto porque os seus rendimentos são mais rápidos e se revestem de aspectos mais espectaculares tantas vezes em detrimento e prejuízo da agricultura e do desenvolvimento das comunidades rurais.

Não devo, porém, ocultar que o Governo está atento a todos estes problemas que tenho referido ao incluir no texto da proposta de lei de meios o princípio da programação regional. Já foi referido aqui, nesta Assembleia, a necessidade do corrigir as assimetrias espaciais dos níveis cio desenvolvimento e os desequilíbrios que a sua distribuição regional representa.

Esta forma de planeamento foi objecto de particular referência no Plano Intercalar de Fomento.

Nele se acentua que esta modalidade de programação assenta num conjunto de investimentos destinados a criar condições que permitam o progresso das regiões atrasadas e contribuam para o bem estar das suas populações. Inspira-a ainda o objectivo de contrariar as disparidades geográficas do desenvolvimento, assegurai- o equilíbrio demográfico e combater o êxodo rural.

E particularmente significativo o caso alentejano. onde a população, tradicionalmente, sedentária, começou a emigrar. E para que V. Ex.ª, Sr. Presidente, e VV. Ex.ª, Srs. Deputados, possam aquilatar da intensidade com que se tem processado o abandono dos nossos campos, referirei que só no ano de 1964 se inscreveram nas Casas do Povo do distrito de Évora 3304 trabalhadores rurais dispostos, a ausentarem-se do País.

[...ver tabela na imagem]

Como só uma percentagem diminuta foi atendida, é natural que no ano seguinte o número de inscrições tenha diminuído; porém, segundo informações das autoridades locais, a rarefacção da mão-de-obra quer rural, quer especializada, verifica-se a ritmo que causa apreensão.

E, diga-se de passagem, já estão a surgir no Alentejo dramas passionais ligados a casos de- emigração clandestina. Por mais paradoxal que pareça, as chamadas crises sazonais de desemprego rural continuam a verificar-se-não obstante as providências especiais que S. Ex.ª o Ministro das Obras Públicas tem tomado, não só através da Comissão Coordenadora das Obras Públicas no Alentejo, como, inclusive, na execução da* obras relativas no Plano de rega do Alentejo.

Segundo o relatório da Comissão Coordenadora- das Obras Públicas no Alentejo, em 1964 no Alentejo a mão-de-obra desempregada equivaleu a cerca de 150 500 homens /dia. Desemprego rural c êxodo rural são o reflexo de um conjunto de problemas de vária ordem, cuja*» causas e remédios já se encontram devidamente estudados e diagnosticados. Há que enfrentá-los com realismo e resolvê-los com espírito de justiça e caridade. Os inconvenientes vêm-se acumulando t; torna-se indispensável actuar de frente e com decisão, pois que os factos e as realidades falam por si e, infelizmente, são por de mais evidentes para que possamos ignorá-los. São, portanto, os fortes motivos de natureza económica que estão na base da debandada das populações rurais que se está processando de norte a sul do País.