populações, quer para a dessedentação de gados e para irrigação de terras de cultura.
Volto hoje a tratar o mesmo tema, porque, entretanto, o problema se agravou. Agravou-se em consequência dos aproveitamentos que estão a ser feitos nos países vizinhos das águas dos nossos rios internacionais; agravou-se porque cada vez se torna mais premente a ocupação económica do nosso território; agravou-se devido às secas que nos últimos anos têm flagelado muitas áreas da província, nomeadamente as áreas de criação de gado no Sul.
Como acabei de dizer, é premente a necessidade da ocupação económica da província, e a água é um elemento essencial para se alcançar esse fim. Ocupação económica inadiável, urgente, porque ela também significa povoamento, porque nela se encontra uma das melhores formas de defesa contra aqueles que procuram lançar a confusão e o caos na terra pacífica de Moçambique. Ocupação que não pode sujeitar-se ao andamento moroso que os assuntos têm nas Secretarias de Estado ou- nas repartições públicas, destruindo cancerosamente na apatia mortal da vida burocrática os altos objectivos que a Nação precisa de atingir depressa.
Peço que me seja desculpada a insistência em voltar a debater o problema do aproveitamento dos rios de Moçambique, mas é meu dever, no cumprimento do meu mandato de Deputado, trazer a esta Câmara os assuntos que afligem e preocupam a província que represento e cuja solução depende do Governo Central.
Pergunto: que pensamos fazer, em Moçambique, em matéria do aproveitamento dos nossos recursos hidráulicos?
À parte a barragem de Massingir, cujos estudos prosseguem - para que se não comprometa definitivamente, por falta de regadio, todo o vasto e importante colonato do Limpopo e também para que se impeça a invasão das águas salgadas no curso inferior do rio, o que traz graves prejuízos para a agricultura das áreas afectadas -, parece que se não pensa, para breve, na construção de outras barragens, de outros aproveitamentos hidráulicos, que viriam dar grande impulso ao povoamento e ao desenvolvimento económico.
Esta situação não pode continuar, a não ser que queiramos comprometer para sempre o futuro da vida económica da província.
Em 1963, em Pretória e, no ano seguinte, em Salisbúria reuniram-se delegações de Portugal, da África do Sul e da Rodésia para discutir aspectos respeitantes ao aproveitamento dos recursos hidráulicos de alguns dos rios internacionais que atravessam Moçambique.
Dizem-me que o Incomati foi um dos rios do Sul da província que mereceu cuidadosa atenção, tendo as delegações portuguesa e sul-africana assumido reciprocamente o compromisso de apresentarem oportunamente projectos definitivos acerca dos aproveitamentos a realizar em cada um dós seus territórios. A África do Sul não terá, com certeza, urgência na apresentação desses projectos, pois a água que o Incomati recebe vem toda do seu território. O mesmo não sucede, porém, connosco. Moçambique tem a maior urgência na apresentação desses projectos e no estabelecimento de um acordo definitivo, baseado nos mesmos projectos, que proteja os escoamentos para o seu território. Não podemos deixar este assunto entregue ao lento rolar dos meses e dos anos.
Entretanto, os aproveitamentos hidráulicos nos rios Komati e Crocodile - que na sua junção na fronteira com Moçambique formam o Incomati - continuam a fazer-se, porque na República da África do Sul se acredita na agricultura, visto nela- assentar um dos mais fortes esteios da sua economia. Agora mesmo, na margem direita do rio Crocodile, uma empresa sul-africana iniciou uma grande plantação de cana-de-açúcar, que virá reduzir ainda mais os ecoamentos daquele rio para o nosso território.
O aproveitamento da bacia hidrográfica do Incomati - que poderá representar um dos mais valiosos contributos para o desenvolvimento agrário do distrito de Lou-renço Marques - compreende os esquemas da Corumana, no rio Sábiè, e da Moamba-Major-Movene, no rio Incomati. Permitirá o regadio de 170 000 ha de boas terras, sendo algumas das melhores da província, e a produção de dois blocos de energia eléctrica, assim distribuídos: Corumana, 36 GWh; Moamba-Major, 200 GWh. Estes dois esquemas proporcionarão ainda a defesa completa contra as cheias, evitando as periódicas inundações das margens do baixo Incomati, nomeadamente a destruição das culturas da fértil várzea da Manhiça; a regularização dos caudais de estiagem; o enxugo e drenagem de óptimas terras de aluvião, e a formação da albufeira de Movene, cuja água servirá para aumentar o caudal do rio Umbelúzi para fins de regadio e garantirá, em caso de necessidade, o abastecimento dos concelhos de Lourenço Marques e da Matola, onde se situam os grandes núcleos de população da cidade de Lourenço Marques e da vila da Matola-Rio, e no Língamo e na Machava algumas das principais indústrias da província.
Estes dois aspectos (abastecimento de água dos concelhos de Lourenço Marques e da Matola e aumento do caudal do Umbelúzi) têm maior importância do que pode parecer à primeira vista. O armazenamento da albufeira do Movene defenderia a cidade de Lourenço Marques contra o risco de ver-se dentro de poucos anos sem água para o consumo da sua população e das suas indústrias, tanto mais que se sabe - e consta de relatórios oficiais - que por volta de 1970 os escoamentos dos rios serão insuficientes.
Também neste caso avultam as consequências dos aproveitamentos hidráulicos que a Suazilândia está a efectuar no curso superior do rio Umbelúzi. Também neste caso as negociações para que nos seja garantido um caudal mínimo se arrastam sem um vislumbre de solução.
Perguntar-se-á: a quanto montaria a execução dos esquemas da Corumana e da Moamba-Major-Movene?
Dizem-me que o custo destas obras andaria à roda de 1 500 000 contos.
É uma verba que não pode caber no âmbito apertado do orçamento ordinário da província e que terá, portanto, de ser custeada pelos planos de fomento.