O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei sobre mar territorial e zona contígua.
Tem a palavra o Sr. Deputado Sebastião Ramirez.
O Sr. Sebastião Ramirez: - Sr. Presidente: Foi V. Ex.ª mestre ilustre da velha e prestigiosa Universidade de Coimbra. O seu saber, a sua privilegiada inteligência e as suas qualidades pessoais fizeram alinhar a sua forte personalidade entre os grandes doutores. Em Coimbra ajudou V. Ex.ª a criar uma escola nacionalista da melhor água e ocupou na sua mocidade lugar destacado na trincheira ao serviço dos altos ideais; e ia-se lançando a semente para uma autêntica revolução nacional.
Parlamentar distintíssimo, foi designado nosso leader por voto unânime da Assembleia.
Os mais velhos recordam o brilho das suas intervenções, o poder da sua dialéctica, a forca da sua argumentação, dispersando às mãos-cheias o seu calor humano.
Todos o acatavam como chefe e em todos nascia e crescia uma amizade respeitosa.
Foi V. Ex.ª reeleito nosso presidente, para honra desta Casa e nosso orgulho.
Disse V. Ex.ª um dia que a "função não é património do homem, mas para ser servida por eles, e ao longo da sua vida tem sido fiel ao seu próprio pensamento.
Largos anos de amiga convivência e comunhão nas ideias construíram entre nós uma forte e leal amizade, cujos laços o desgaste do tempo não desatará.
Apresento a V. Ex.ª as minhas respeitosas e amigas saudações.
Dirijo igualmente saudações ao nosso leader, Deputado Soares da Fonseca. Inteligência aguda e penetrante, maneja as coisas e os homens com o maior desembaraço e cria ao seu redor um clima de merecida admiração e uma disciplina alegremente aceite por todos nós.
Aos Srs. Deputados, com os meus afectuosos cumprimentos, asseguro-lhes a mais leal camaradagem e atenta colaboração.
Encontra-se à discussão na- generalidade a proposta de lei sobre mar territorial e zona contígua.
O assunto é da maior relevância, dado que somos um povo ribeirinho, com extensas zonas marginais a dois oceanos.
O princípio da liberdade dos mares - tão velho como a própria humanidade - apresenta através dos séculos duas posições distintas. Uma, a mais antiga, fundamentava-se em que o mar não poderia ser objecto de domínio; a segunda, mais moderna, defendia o princípio de que o domínio do mar era pertença da comunidade internacional.
Assentavam estas ideias na livre usufruição dos oceanos, condição necessária para o desenvolvimento das transacções comerciais e facilidade de intercomunicação dos povos. O mar era assim um veículo de civilização, e como tal deveria ser completamente livre. O argumento não tem em si mesmo uma força autónoma.
A terra também serve como veículo de civilização e é elemento necessário para as comunicações entre os povos. Nela se estabeleceram as fronteiras que delimitam os direitos e os interesses das nações e se criaram as pátrias.
Não é verdade que o domínio numa extensão do mar por qualquer estado impeça as comunicações entre os povos ou dificulte as normais transacções comerciais. Nos chamados mares territoriais facilita-se em alto grau a segurança da navegação, afastando perigos por meio de faróis, de bóias de sinalização, etc.
Nos tempos contemporâneos fortalece-se a doutrina de que os estados ribeirinhos podem e devem exercer total soberania sobre uma determinada zona adjacente às suas costas.
Estas zonas são, de facto, o prolongamento do território, isto é, uma parte submersa do próprio território, e daí designarem-se por "mar litoral" ou, mais propriamente, por "mar territorial".
No mar territorial o estado ribeirinho exerce plena e exclusivamente a soberania, como se da terra firme se tratasse.
São de vária natureza as regulamentações sobre os mares territoriais, visando essencialmente a estratégia à defesa sanitária, à dos interesses e direitos aduaneiros, aos de ordem fiscal ou comercial, etc.
Os navios de guerra estrangeiros gozam do privilégio da extraterritorialidade, por virtude do qual se consideram como parte integrante da nação a que pertencem e, como tal, se regem pelas suas leis, embora navegando em águas estranhas.
O antigo princípio da completa liberdade dos mares está ultrapassado e é inoperante na época contemporânea.
Nas frequentes e numerosas conferências internacionais com o objectivo de se fixar doutrina sobre a largura do "mar territorial" não tem sido possível conseguir uma unanimidade, nem sequer numa significativa maioria.
Apesar de nas duas últimas guerras se ter verificado a inutilidade do alargamento territorial, pela dificuldade, se não impossibilidade, de os estados defenderem eficazmente a sua neutralidade, para além das 3 milhas, alguns governos mostram-se dispostos a .alargar a extensão do seu mar territorial. A largura dos mares territoriais varia de um mínimo de 3 milhas até às 200 milhas das costas.
No bem elaborado parecer da Câmara Corporativa colhem-se preciosos esclarecimentos sobre a legislação nacional e estrangeira sobre a extensão do mar territorial.
A atitude dos nossos delegados às conferências internacionais não é uniforme e, ao contrário, varia frequentemente.
Se é certo não haver nenhuma disposição legal que fixe a extensão do nosso mar territorial, verifica-se que "a regra das 3 milhas para largura do nosso mar territorial é a que colhe melhor tradição e é também a mais conforme com a doutrina universalmente aceite da liberdade dos mares", e| como tal tem sido seguida pela nossa Administração.
Deverão ser estes, entre outros, os fundamentos que levaram a Câmara Corporativa a propor a eliminação do artigo 1.º da proposta de lei.
Alinhamos nesta orientação com várias outras nações, e designadamente com a Inglaterra.
Os ilustres Deputados Nunes Barata e Jerónimo Jorge trataram este assunto com a sua proverbial competência e brilho e deram-nos valiosos ensinamentos.
Modernamente, a noção do mar territorial perdeu muito do seu anterior conteúdo.
A partir dos primeiros anos do nosso século os homens da ciência, e também os homens do Estado, passam a preocupar-se principalmente com a defesa e a usufruição das zonas do mar adjacentes às costas.
Na verdade, junto às costas estende-se uma larga plataforma submersa com profundidades que variam de 0m a 2000m - "plataforma continental".