O Orador: - Entretanto, assistimos a um recrudescimento da discriminação racial e da perseguição violenta nos países que se arvoram em nossos julgadores, desmentindo, assim, a pureza e a sinceridade das suas intenções.

Não é, pois, no que se refere a tais aspectos de coexistência amorável e fraternal que temos a recear quaisquer confrontos, e todos nós, portugueses, devemos fazer justiça desassombradamente às nossas próprias tradições e prestar homenagem ao património moral que nos legaram as gerações passadas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A tarefa que se nos apresenta, e devo realmente atrair toda a nossa capacidade de acção na hora presente, é a realização prática, em ritmo acelerado e com mobilização dos poderosos recursos da técnica moderna, de todas as implicações exigidas pela orientação civilizadora que se acha marcada na nossa história pela intuição admirável dos pioneiros da nossa comunhão inter-racial. Preservar essa orientação, conservando-a pura e incorruptível, deve ser o objectivo do nosso maior cuidado e o dever imperativo a que havemos de obedecer.

Vozes: - Muito bem!

Seja-me permitido, nesta oportunidade, desenvolver um pouco este tema, que me parece de importância fundamental e que, em certa literatura, tantas vezes tem sofrido tratamento tendencioso e menos verdadeiro.

Os partidários da desigualdade antropológica irredutível entre as variedades existentes da espécie humana servem-se usualmente da raça negra como termo mínimo de comparação nas suas erradas deduções, por se lhes afigurar esse agrupamento a prova mais decisiva das teorias que defendem. Nessa orientação, não há tara de inferioridade psíquica ou física, defeito, crime, excesso ou tibieza, que caluniosamente lho não atribuam. Tudo lhes serve, desnaturam-se os factos, sofisma-se a própria evidência, esconde-se a verdade, deturpam-se as intenções e inventam-se erróneas e tendenciosas teorias evolutivas, baseadas na falsa interpretação dos dados insignificativos fornecidos pela antropologia.

Nos Estados Unidos, onde, como é geralmente conhecido, o ódio e o desprezo pela raça negra ultrapassam os próprios limites do inverosímil, a controvérsia sobre este assunto é vivíssima, encontrando eco constante na opinião pública apaixonada. Nos hotéis, nos compartimentos dos comboios, nos autocarros, nas casas de espectáculo e, em regra, nos recintos onde se possam produzir aglomerações, a raça negra é inflexivelmente escorraçada para divisórias distintas, como um rebanho de pestíferos, ou como uma leva de gafos. Para combater as iniciativas generosas do negrofilismo, a campanha de propaganda negrófoba entra voluntariamente no caminho da violência e descamba mesmo acidentalmente no exagero ridículo.

Assim, Charles Carroll, num livro com o título sugestivo O Negro É Um Animal Irracional, declara muito formalmente que, pelo texto bíblico, se demonstra que os negros são animais irracionais, criados com mãos e linguagem articulada, para poderem servir os brancos seus donos; e, como argumento corroborativo, o autor acrescenta o seguinte inacreditável silogismo:

Os homens foram criados à imagem de Deus; ora Deus não é preto, ninguém o ignora; então o negro não é a imagem de Deus, logo, não é homem! ...

Os argumentos pseudocieutíncos que vulgarmente se encontram atestando a inferioridade negra são de molde u igualar, na balança demonstrativa, o peso desse «piramidal» argumento religioso que acima transcrevemos.

De resto, se, numa única geração, o branco internado no sertão, longe do convívio da sua sociedade, perde em pouco tempo toda a sua decantada superioridade, caindo numa espécie de marasmo moral e intelectual, que o nivela com os indígenas vizinhos, por que razão não admitir que a inversa também é verdadeira e que os pretos são susceptíveis de um grau de cultura idêntico ao dos brancos?

Da mudança de meio resulta incontestavelmente a alteração dos caracteres físicos e morais da raça, e a circunstância supradita do fenómeno da retrogradação ao estado primitivo, pela reintegração no seu meio inicial, de negros que receberam uma educação brilhante, apenas constitui mais uma iniludível prova da influência mesológica.

Nos Estados Unidos não têm faltado mil entraves, propaganda contrária, oposição tenaz e até mesmo verdadeiras violências por parte do elemento branco contra o ensino de negros daqueles Estados. Todos os meios serviam; à sociedade secreta Ku-Klux-Klan é imputada a responsabilidade dos numerosos incêndios de escolas negras, que tão frequentes se chegaram a tornar em Winston, na Geórgia e no Mississipi.

A repulsa pelo elemento negro ainda crescia e se tornava ostensivamente mais. odienta quando se tratava de indivíduos instruídos. Apesar das perseguições e impedimentos de toda a natureza criados para dificultar a instrução da raça negra, nem por isso esta deixou de progredir incessantemente e de elevar até ao alto nível actual a mentalidade que lhe é própria.

A mesma adversidade, essa forja sublime do carácter humano, lhes deu o ânimo e a coragem indispensáveis para arrostarem vitoriosamente contra todas as desgraças e perseguições originadas pelo ardor apaixonado e cego do preconceito da raça. Hoje, além de muitos milhareis de escolas primárias e secundárias, existem muitas universidades negras - e que podem comparar-se às universidades brancas mais evoluídas.

A lei moral, que, na realidade, representa o único traço característico e decisivo que separa o homem dos restantes animais, é, na sua essência fundamental, comum a todo o género humano. As ideias do bem e do mal, do justo e do injusto, são gerais no homem, seja qual for a cor da pele ou estado social. Se há sentimentos como a honra, o pudor, etc., que variam com a latitude, convém não esquecer que eles não são traço essencial do espírito humano, mas simples aluvião étnica amontoada pelos usos e costumes e fixada pela tradição e pela hereditariedade. Mesmo dentro da mesma raça e até da mesma nação essas noções evolucionam rapidamente.

Hoje, porém, a situação é já muito diversa e melhorada sob vários aspectos. A criminalidade diminui de ano para ano muito sensivelmente na população negra da América, e a constituição da família e a moral doméstica apresentam sintomas de profunda melhoria. Se os negros não apresentam ainda o nível moral que seria para dese-