ouve-se dizer que o capital não se coloca onde os outros o desejam, mas onde os seus detentores encontram melhores condições para o fazer.
Se o princípio for de aceitar em tempo de paz, não o é em tempo de guerra. E é tempo de guerra o que vivemos.
Por isso faço daqui um duplo apelo: aos detentores de capital - que na paz em que até há poucos anos vivemos encontraram óptimas condições de o acumular - para que meditem bem a situação presente, e que não substituam no nosso lema «Deus, pátria e família» alguns daqueles valores ou não coloquem outros à sua frente; ao Governo para que, no sentido de facilitar aquela tomada de posição, crie favoráveis condições de investimento nos sectores onde mais se faz sentir a falta de capitais, designadamente na construção de casas económicas.
Em suma: mostremos por obras que os capitais de portugueses têm pátria, são portugueses.
Feito este parêntesis, retomemos o fio das nossas considerações.
A par da redução que considero indispensável para que se possa encarar realisticamente a solução dó problema, preconizei que as atribuições em causa transitassem para as câmaras municipais.
Dir-se-á: se, como é do conhecimento geral, as câmaras lutam com enormes dificuldades financeiras, vamos ainda sobrecarregá-las com mais e dispendiosos encargos?
Há pouco referi que o caso em exame constituía uma excepção à regra do princípio orientador da repartição de competências para a prossecução de interesses gerais e locais.
Cabe agora referir algumas outras excepções, mas em sentido contrário. São estas: sobre as câmaras municipais do ultramar impendem os seguintes encargos - correspondentes a 8 por cento das suas receitas ordinárias -, que, a meu ver, correspondem a interesses gerais da Nação:
l por cento para o Instituto Ultramarino (Decreto de 11 do Janeiro de 1891 e Lei de 21 de Maio do 1896);
Ora, o que me parece é que deverão pôr-se as coisas no seu devido lugar, exonerando as câmaras de obrigações que não lhes competem e atribuir-lhes as que devem ter.
Contra esta sugestão opor-se-á, esquecendo a escassez das respectivas receitas e as enormes despesas, que antes de constituído o Fundo para a Construção de Casas - hoje Junta - as câmaras municipais se mostraram incapazes do solucionar o problema. A solução é simples: basta que se estabeleça na lei a obrigação de as câmaras despenderem anualmente, para o efeito, determinada percentagem das suas receitas ordinárias e se fiscalize o cumprimento da lei. Se essa percentagem fosse fixada nos mesmos 8 por cento que sugeri que as câmaras deixem do despender, teríamos que só por ano, a Câmara Municipal da Beira (faltam-me elementos das restantes) despenderia para a instalação de económicamente débeis cerca de 7500 contos.
Ora, se considerarmos que naquele concelho há necessidade de instalar 8000 famílias, pode estimar-se a correspondente despesa (dentro do raciocínio anteriormente feito) em 40 000 contos. Admitindo, realisticamente, que em menos de dez anos é, nas condições actuais, impossível solucionar o problema, teremos (ainda dentro do mesmo raciocínio.) que será de 8000 contos o dispêndio anual a efectuar. Há assim apenas uma diferença anual de 500 contos, que na prática, estou certo, se anularia.
E o que se diz para a Câmara Municipal da Beira julgo poder dizer-se para as restantes.
Fica aqui, portanto, outra sugestão: exonerar as câmaras da obrigação de contribuírem para as despesas gerais das respectivas províncias e obrigá-las, por outro lado, a promover a instalação efectiva dos económicamente débeis.
Objectar-se-á perguntando onde ir buscar o dinheiro que o Estado deixa de receber se a solução for adoptada. Responderei: parte ao que hoje despende através da Junta dos Bairros e Casas Populares. Para o restante só aumentando as receitas próprias ou incentivando a afluência de capitais. Ficou apontada uma sugestão quando afirmei que os capitais de portugueses são de portugueses.
Prossigamos nas apreciações das dificuldades apontadas.
O que se deverá fazer é providenciar para que o transporte para e dos locais de trabalho se faça ao menor custo possível.
Dificuldades na expropriação. - Embora os terrenos susceptíveis de aproveitamento sejam periféricos, a verdade é que a sua maioria, se não a totalidade, é propriedade de particulares que, geralmente, neles não introduziram a mais pequena benfeitoria. No tempo que se diz ter sido da «árvore das patacas» requereram a respectiva concessão, gastaram pouco mais que meia dúzia de escudos e ficaram proprietários de extensões razoáveis.
Assim, há necessidade de proceder a expropriações, sendo da maior conveniência que se estabeleça um processo simples e rápido quando o fim da expropriação for o que temos em vista.
Fica apontada, portanto, mais uma sugestão.
Planos de urbanização. - A sua falta impede a determinação dos terrenos adequados e vai-se passando o tempo. E simples: fixem-se prazos curtos, mas razoáveis, para que as câmaras elaborem os respectivos planos. Dir-se-á que a maioria das câmaras não dispõem de técnicos para o efeito. Nesse caso basta socorrerem-se da faculdade prevista no artigo 540.º da Reforma Administrativa Ultramarina, que lhes dá a possibilidade de requisitarem às repartições e serviços do Estado o pessoal técnico de que não carecem permanentemente.