Assim, pela Constituição, há um ensino público, que é o organizado pelo Estado, e um ensino particular, que é o ministrado ou feito ministrar por instituições particulares.

Um e outro, pela Constituição, constituem a educação nacional; consequentemente deveriam viver em plena igualdade, pois ambos contribuem, por igual, para o bem e a grandeza do povo e da Nação.

Mas a realidade é bem diferente.

O ensino, particular tem sido colocado numa situação de desfavor -e mesmo de desconfiança perante o ensino do Estado, inexplicável ante o inestimável serviço que tem prestado à Nação.

Tem sido considerado como uma empresa comercial, e não como uma empresa social de interesse público.

Contribuições e impostos sobrecarregam esses estabelecimentos, como se se tratasse de sociedades industriais, em vez de se favorecerem e subsidiarem, com prejuízo até para a liberdade de ensino, prescrita na Constituição, pois nem todos os pais são livres de escolher o ensino particular, mais caro por falta de protecção.

Contudo, eles têm aliviado, de uma maneira extraordinária, as finanças públicas e têm levado o ensino a concelhos onde o Estada ainda não chegou, nem poderá chegar nas décadas mais próximas.

Pelas suas características de maleabilidade e adaptabilidade, o ensino particular chega aonde o ensino oficial, o de nível secundário, não chega ainda e dificilmente chegará. Numerosas zonas rurais dispersas pelo País e que se têm mantido num estado atrasado de evolução sócio-económica só do ensino particular têm recebido estímulo. Dos 213 concelhos metropolitanos continentais que têm escola secundária, apenas em 67 essa escola é oficial, ao passo que em todos eles (e 146 só têm escola particular) existe escola particular. Deduz-se daqui que o ensino particular tem sido entre nós um factor de equilíbrio regional e social. Deste modo:, o ensino particular contribui para o equilíbrio regional da Nação.

Hoje, porém, a maior parte dos externatos particulares vivem da abnegação dos seus fundadores, movidos por um sentimento de bairrismo e pelo desejo de progresso da região onde se fixaram.

Muitos deles, para poderem sobreviver, não pagam os ordenados fixados por lei aos seus improvisados professores (sacerdotes, médicos, advogados, farmacêuticos), que colaboram, com sacrifício pessoal e espírito de cruzada, na tarefa comum da educação e instrução, na edificação da Pátria. E quantos deles chegam mesmo a suprimir algumas aulas (de Canto Coral e de Moral) para poderem suportar os encargos que lhes são impostos: despesas de pessoal, de funcionamento, amortizações, juros e encargos fiscais.

Contudo, verificamos a existência de ramos de actividade nacional sem a importância, nem mesmo sendo legítimo estabelecer paralelismo com o ensino particular, onde vigoram princípios de isenção fiscal, fundos de auxílio, taxas proteccionistas.

Estão certas estas disposições. Por maioria de razão devem ser criadas para o ensino particular. A grande maioria da Nação aceita-as com alegria.

Esta situação de desfavor leva os colégios a impor propinas relativamente elevadas e, por isso, a impedir que os habitantes de lugares onde não há ensino oficial, portadores de economia débil, mandem os seus filhos estudar- o que traz como consequência que, no País, apenas 30 por cento dos alunos que fazem a instrução

primária ingressem no ensino secundário. Mas há regiões onde essa percentagem é apenas de 5 por cento, sempre por impossibilidade económica.

E incompreensível esta discriminação entre escola pública e escola particular, porquanto, constitucionalmente, uma e outra são destinadas a apoiar e a continuar a educação familiar e, por isso, uma e outra são mandatárias das famílias:

Fundada directa ou indirectamente por esta, é especialmente a escola particular que está em condições de manter com ela um tipo de relações adequado à função de uma e de outra. É à escola particular que a família mais facilmente pode exigir o cumprimento do seu mandato. E também a escola particular que melhor pode contar com a colaboração confiante da família. Entre uma e outra tudo se passa naturalmente, em termos pessoais, os únicos que correspondem rigorosamente a uma obra comum de índole educativa.

E tanto é assim que as estatísticas, ainda há bem pouco, davam como frequentando o ensino particular 60 por cento dos alunos do ensino liceal em todo o País, mau grado a falta de protecção atrás apontada.

Na Europa ocidental e cristã só Portugal, Espanha e Itália oneram o ensino particular com impostos, e só Portugal e Itália não subsidiam esse ensino. E, na Itália, tal estado de coisas mantém-se unicamente por imposição do Partido Comunista e uma certa facção do Partido Socialista, que se têm oposto à lei de isenção e de subsídios ao ensino particular.

O Sr. António Santos da Cunha: -V. Ex. ª dá-me licença?

O Orador: -. Faz V. Ex.ª o obséquio.

O Sr. António Santos da Cunha: - Desejo interromper V. Ex.ª porque está tratando um problema que já mereceu algumas considerações da minha parte nesta Assembleia. Sem dúvida nenhuma, é completamente impossível resolver o problema da educação e da instrução neste país sem a colaboração do ensino particular. E, como V. Ex.ª muito bem disse, só nos países onde as forças anti-religiosas dominam ainda no governo é que o ensino particular não é ainda subsidiado, o que acontece por hostilidade para com a Igreja. Recordo que os bispos de Portugal, em pastoral publicada há três anos, lembraram ao Governo a obrigação de dar a todos o direito de frequentar as escolas católicas.

Folgo, por isso, que V. Ex.ª aqui venha reavivar o problema e quero prestar a minha homenagem a esses grandes servidores da causa nacional a que V. Exª. acaba de referir-se, e que suo os proprietários e os professores dos externatos, não das grandes cidades ...

O Sr. Fernando Matos: -... onde o ensino particular é muito caro.

O Sr. António Santos da Cunha: - ... mas das pequenas vilas e aldeias onde a sua altíssima acção benemérita quase passa despercebida. Que o Governo tenha um acto de inteligência e compreensão para com o seu esforço, despedindo-se do estatismo que domina o ensino em Portugal.