Creio. Sr. Presidente, que as circunstâncias apontadas, e outras haverá, não são diversas, nem no tempo, nem no espaço. São imutáveis e, por consequência, permanentes. Julgo que provei não haver diversidade das circunstâncias.

Vejamos agora, Sr. Presidente, o que se passa com a natureza das coifas.

Entendo que as coisas, no caso vertente, só podem ser os produtos a transportar e os mesmos transportes utilizados. Ora os produtos a transportar têm natureza igual em todo o Mundo. O trigo, organito, a cortiça, o mármore, as palhas, os adubos, o vinho, os gados e tudo mais têm a mesma natureza- em Évora, em Macau, em Bissau e em Díli. Quanto aos meios de transporte sei, e sei de ciência certa, que" um camião, um reboque e um tractor têm a mesma natureza tanto no Norte como no Sul, tanto no Leste como no Oeste.

Parece-me que está provada a~ imutabilidade da natureza das coisas.

Se conseguir, e julgo que sim, Sr. Presidente, concluir pelas certezas que acabo de referir, surge, ao meu espírito de homem simples e despido de sofismas, a dúvida, a grande dúvida, sobre a legitimidade do decreto que taxou a camionagem a partir de círculos com raios quilométricos diferenciados, isto é, criando uma desigualdade para com os cidadãos que exercem actividade semelha/ate, igual até em locais geograficamente distanciados.

Diz a Constituição Política, § único do artigo 5.º:

A igualdade perante a lei envolve o direito de ser provido nos cargos públicos, conforme a capacidade ou serviços prestados, e a negação de qualquer privilégio de nascimento, nobreza, título nobiliárquico, sexo ou condição social, salvas, quanto à mulher, as diferenças resultantes da sua natureza e do bem da família, e, quanto aos encargos ou vantagens dos cidadãos, as impostas pela diversidade das circunstâncias ou pela natureza das coisas.

Não sei, Sr. Presidente, como se possa conciliar o preceito constitucional com o estabelecido quanto aos encargos impostos à camionagem particular.

Julgo que. com as medidas adoptadas, se foi longe de mais. O proprietário de um camião de carga particular sofre uma tríplice punição:

.1." O infortúnio da posição geográfica que o inibe de tirar rendimento igual, em carga transportada, em igualdade de tempo, ao seu concidadão que tem a sua exploração mais perto dos locais de consumo ou embarque.

2.º Maior despesa nos consumos de combustíveis, lubricamente e pneus, todos, como sabemos, passivos de pesados impostos.

3.º Desigualdade tributária expressa em maior imposto, quando, contra todas as regras e princípios, tem maior despesa e menor rendimento, isto é, maior desequilíbrio económico.

Sr. Presidente, creio, mas já com alguma dúvida, porque esta intervenção é a segunda feita por mim, que o Governo da Nação não deixará de atender ao que acabo de expor.

Mas há mais, infelizmente mais, que causa preocupações, despesas- inúteis e até injustiças.

Vou referir alguns factos:

Os chamados «economicamente débeis», e são, neste sector dos transportes particulares, algumas larguíssimas dezenas, centenas talvez, dão a faceta mais dramática e dolorosa. Refiro-me aos modestos vendedores ambulantes, aos feirantes e aos cinemas e circos, que levam alguma distracção e alegria aos que não podem deslocar-se aos meios urbanos que possuem esses atractivos. Por razões climáticas, por razões económicas, por razões geográficas, são obrigados a deslocações que se nos afiguram disparatadas, mas são, no fundo, determinadas por razões de sobrevivência.

Deslocam-se em períodos que não têm concordância com os que a lei determina para o pagamento dos impostos, utilizam os veículos em raios díspares, mas sempre, ou quase sempre, com quilometragens escassas nos finais das suas épocas de deslocação.

Não utilizaram, nem desgastaram, as rodovias senão em coeficientes mínimos, mas a lei é inexorável; pagaram, têm lutas com a burocracia e, no fim, acabam por perecer à míngua de réditos. Quem há por aí que os não conheça? ... Porque os ignora a lei que estou criticando? E que dizer, Sr. Presidente, quando o utente do camião tem a ideia de adquirir um reboque para aumentar as suas possibilidades de transporte? ...

Vou dizer:

Adquirido o reboque, e depois das indispensáveis formalidades burocráticas, o reboque fica passivo de taxa semestral, quando a taxa do camião rebocador é trimestral, primeira anomalia, como adiante explicarei.

Logo a seguir o utente verifica que o uso do reboque lhe reduziu a velocidade de cruzeiro em 25 por cento, de 40 km para 30 km por hora. O camião rebocador tem uma chapa que lhe marca a velocidade máxima de 40 km, mas o reboque, que lhe está absolutamente ligado, tem o limite máximo de 30 km. e esse limite é. por consequência, o limite máximo do- conjunto. Porquê?

Diz-se que por segurança!

Mas se o conjunto rodar na auto-estrada de Vila Franca, que, outra anomalia legal, pagou, pode circular a ... a não sei quantos quilómetros à hora. Os preceitos de segurança aí são diferentes?

Vale a pena pergunta, a quem possa responder, se é porque melhoraram as condições da unidade em circulação ou, o que eu creio, se por melhores condições da via utilizada? ...

Se a resposta, for positiva em relação à segunda condição, teremos de aceitar, sem contestação, que necessita revisão o sistema rodoviário.

Encaremos a hipótese de o proprietário de camião com reboque decidir suspender a exploração de uma tão «rentável» actividade.

Começa por requerer, nos termos do § 1.º do artigo 4.º do Decreto n.º 46 C66, de 7 de Dezembro de 1964, com a antecedência de 15 dias - há quem entenda que são 30 -, entregando, entre outros documentos, o livrete de circulação, pelo que o camião não poderá circular e, por isso, perde 15 dias, pelo menos, do período de licenciamento que já pagou. E quanto ao reboque? Como a licença é semestral, perde «somente» 15 e mais 90 dias, isto é, 105 dias.

Contudo, o utente tem o direito de reclamar.

Requer, expõe, espera e ... desespera.

Mas, aspectos diferentes abundam, vou passar a considerar duas situações dissemelhantes em circunstâncias c; naturezas iguais:

O utente de um camião que de Évora transporte mercadorias para o porto de Lisboa e um utente que da margem esquerda do Douro transporte mercadorias para Leixões.