O contributo que esta minha intervenção possa eventualmente ter para uma análise mais profunda do problema situa-se apenas na prática do que se tem seguido naquela província, quer por uma intervenção directa do Governo, quer, paralelamente, pela intervenção do sentimento consciente de cada um perante um problema que a todos interessa. E ainda mais se considerarmos que o nivelamento das condições sociais de uma maioria beneficia o todo. E o todo está na própria Nação.

O que se tem feito, seja em que paralelo for do território nacional, abre perspectivas futuras à consolidação dos espaços interterritoriais e à mensagem multirracial que vimos difundindo em louvor da igualdade dos homens, filhos de Deus.

Vou agora entrar propriamente na essência do problema e terei necessariamente de me tornar um tanto fastidioso na narração da forma como vem sendo encarado e resolvido o problema habitacional das classes economicamente débeis em Angola.

Mas se o não fizesse por .essa forma, afigura-se-me que trairia o fundamental em benefício do superficial, o que não é compadecente com o interesse e a importância do problema, que se reveste ainda de aspectos que transcendem o tecto para se situar na promoção social dos que sob ele se acolhem.

De facto, são tantos os factores predeterminantes da conveniência de uma ou de outra solução habitacional que quem avisadamente deseja proceder terá de obter um resultado que não fira ou imponha, em benefício do conjunto, uma solução negativa no aspecto particular.

Ocorre-me a este respeito que nem todos os tipos de habitação definitiva são aceites pelas massas rurais, e posso afirmá-lo, em obediência a uma experiência por mim vivida, porque há efectivamente fenómenos de ancestralidade tradicional que escapam, por todos os meios, à imposição de novos sistemas de convivência familiar. E tão importante é este aspecto do problema que o Governo da província determinou em 1962 um inquérito sobre a habitação, que foi levado a cabo pelo Instituto de Investigação Científica, e cujos resultados foram publicados. Como exemplo, apontarei que o estudo etnológico dos pescadores da ilha de Luanda impôs um tipo de construção definitiva adaptável ao seu tradicional viver.

Detenhamo-nos, pois, um pouco sobre os principais aspectos que o assunto reveste em Angola.

Embora em contraste com a tradição africana, a organização em cidades parece ser um dos fenómenos mais característicos da África de hoje.

Dadas as implicações sociológicas, políticas e económicas que reveste o movimento para as grandes cidades, o fenómeno assume no nosso ultramar particular significado perante a política de integração que se prossegue.

Este facto assume maior relevância se pensarmos que grande parte da população que se avoluma em volta das cidades é o produto de um desenraizamento tribal, com todos os seus problemas e ligado a formas primitivas de habitação.

O viver dessa gente representa um dos aspectos mais salientes da vida social das cidades, que o processo técnico do urbanismo não pode ignorar, dado o supremo objectivo nacional de simbiose racial e cultural em cidades plenamente integradas.

Dado que as nossas cidades no ultramar são plurirraciais pela natureza dos elementos em presença, há que tomar na devida conta o processo normal da transformação das cidades e proceder à sua estruturação, de modo que favoreça a evolução do grupo desenraizado, que, desligado do seu quadro de origem, carece de ser integrado em novo grupo social.

Em Angola o crescimento urbano só a partir de 1940 começa a tomar incremento, mercê de uma melhoria das condições económicas da província.

Entre 1940 e 1950 deu-se uma duplicação da população branca, acompanhada por um valor muito aproximado da população preta, tornando-se o aumento mais vigoroso a partir de 1950.

À medida que aumenta a massa branca, verifica-se um maior afluxo da população autóctone para as cidades, onde se acumula sem vigilância e engrossa o número de desempregados.

Das cidades de Angola, apenas em Sá da Bandeira o número de brancos excede o de africanos e em Moçâmedes há um certo equilíbrio, enquanto nas outras cidades a população preta ultrapassa fortemente a dos brancos.

Em 1940 a população urbana correspondia a 5,4 por cento do total e em 1960 a 11 por cento. Isto dentro do critério estabelecido pelo censo de 1960, que considerava como população urbana a que se constituísse em aglomerações de 2000 ou mais indivíduos, donde resultavam 29 aglomerações populacionais, das quais 16 são cidades, que reuniam 84 por cento da população urbana.

Luanda é a cidade onde o acréscimo populacional assume maior importância. De 1941 para 1960 a cidade teve um aumento absoluto de 163 512 habitantes, ou seja 267,9 por cento, o que corresponde a um aumento anual de 8170 indivíduos.

Em 1940 a cidade tinha 61 028 habitantes. Passados 10 anos atingiu 141 647. Em 1960 a população orçava por 224540 habitantes.

O tipo somático que tem tido maior comparticipação no volume global da população é o preto, cujo acréscimo na última década foi de .39,8 por cento.

No que diz respeito à população branca, que era de 15 por cento em 1940 e 1950, atingiu 25 por cento em 1960. Quanto aos mestiços, verifica-se que a comparticipação tem decaído, mas mesmo assim entre 1951 e 1960 o seu número aumentou 39,3 por cento.

A consulta do quadro seguinte, do qual consta a população de Luanda por tipos somáticos nos últimos três censos, dá-nos uma ideia mais completa do crescimento populacional da cidade como ponto de partida para o estudo dos problemas resultantes:

[...ver tabela na imagem]