Quanto à Mocidade Portuguesa é difícil nesta ocasião, em face do condicionalismo que lhe vem sendo criado de há alguns anos para cá, e muito em especial o que resulta do Decreto-lei n.º 47 311, entrado em vigor há dias, formular uma opinião acerca do que na realidade se espera da sua acção.

Como sairia fora da orientação que estou procurando seguir se me propusesse fazer aqui a análise deste decreto-lei e da outra legislação anterior sobre a matéria, não o farei.

Mas entendo dever desde já, a propósito deste assunto, fazer dois simples comentários.

No trailler do decreto-lei atrás mencionado, que o titular da pasta da Educação Nacional fez publicar nos jornais do cia 10 de Novembro, afirmava-se que com aquele diploma se dava satisfação a uma aspiração de várias gerações, realizando uma reforma que há vários anos vinha sendo objecto de solicitações reiteradas.

Ora eu sinto necessidade de esclarecer que às aspirações da minha geração o presente diploma não pode dar satisfação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E a minha geração, e só por isso a refiro, é precisamente aquela que fez a Mocidade Portuguesa.

E; voluntária e gratuitamente, fê-la com dedicação, entusiasmo, muitos sacrifícios e notório idealismo.

E tanto se enriqueceu, na própria organização que fez nascer e ajudou a criar, que ainda hoje, decorridos 30 anos sobre a sua plena juventude, essa geração é capaz de lutar com o mesmo ardor para que se não perca o valioso capital do trabalho nela realizado e da experiência nela adquirida num espírito de renúncia e doação raramente atingidos entre nós.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Foi esta mesma geração, aliás, a que mais proclamou e mais se bateu pela indispensável adaptação da Mocidade Portuguesa aos tempos modernos, que continua a ser e extremamente necessária.

Mas a alteração de orgânica, de processos, de esquemas de trabalho, de motivos de interesse e de vida activa para os filiados, que há vários anos reclama, não afecta os princípios básicos da organização, cuia reafirmação ainda hoje a não intimida, nem obviamente elimina as características fundamentais a que tem de obedecer uma organização da juventude.

Há um abismo, meus senhores, entre uma organização de juventude e uma organização para a juventude.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para nós a questão da Mocidade Portuguesa está há muito, e continua, como no Hamlet, em ser ou não ser.

Mas a ser impõe-se um ser afirmativo, vertical e muito claramente definido. Respeitado e colocado no lugar que lhe compete na vida nacional.

Um ser, sem vergonha do passado, adaptado ao presente e projectado para o futuro.

A um ser tolerado ou consentido preferimos para bem da juventude um não-ser.

E para muitos seria esta a decisão desejada, mas por motivos diversos.

Mas o Governo, que há longos anos hesita entre o ser e o não-ser, medindo, por um lado, a responsabilidade pesada que qualquer das decisões lhe acarretaria e esquecendo, paradoxalmente, por outro, a maior responsabilidade que assumiu, protelando ano após ano a solução que lhe cabia ditar, aderiu agora a uma solução intermédia.

Intermédia e transitória, na qual sob o manto diáfano do ser se encontra a nudez forte do caminho aberto para o não-ser.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O Governo parece efectivamente ter entendido que devia passar a Mocidade Portuguesa à situação de reforma, e fê-lo com uma antecipação de dez anos em relação ao que é de uso para com os servidores do Estado e da Nação, provavelmente por reconhecer que os enormes sacrifícios que à organização foram exigidos durante os 30 anos da sua atribulada existência lhe davam jus a repousar mais cedo.

E vejo ainda que não foram esquecidas as justas homenagens que em circunstâncias semelhantes costumam ser prestadas: a condecoração e o louvor público: e naturalmente, no desejo de ir ainda mais longe nas suas homenagens, perpetuando na memória de todos tão prestimosa instituição, foi o seu nome dado à nova Direcção de Serviços agora criada no Ministério da Educação Nacional pelo Decreto-Lei n.º 47 311.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os que nunca conheceram ou entenderam o espírito da Mocidade Portuguesa; os que não acompanharam de perto a sua luta e a sua acção; os que nunca tiveram oportunidade de avaliar a espantosa força de voluntária dedicação em contraste com a fraqueza confrangedora da obrigatoriedade remunerada; os que nunca se aperceberam que a Mocidade Portuguesa era uma organização de rapazes para rapazes, não podem compreender a minha versão-síntese dos acontecimentos do corrente ano respeitantes àquela Organização Nacional e tomarão provavelmente por ironia despropositada o que é puro objectivismo.

Mas não pensem uns e outros que estou sequer apreensivo com os factos. A Mocidade Portuguesa tem vitalidade de sobra e nos seus quadros dirigentes e graduados de forte dedicação e rija têmpera.

Não será decerto aceite o repouso que generosamente lhe oferecem; e com o treino que ela já tem de lutar, a crise vencer-se-á, e, com a graça de Deus e a bem da Nação, a Mocidade Portuguesa retomará, no lugar que lhe compete, o desempenho cia sua alta missão.

Mas o problema da Mocidade Portuguesa é apenas mais um dos problemas, a considerar na educação da juventude, e, se foi referido aqui com mais relevo, isso deve-se apenas à circunstância de ser a única organização nacional de juventude para rapazes, existente no País, e que sérias experiências realizou, e notáveis resultados delas colheu, em muitos e variados aspectos da formação dos mesmos rapazes.

Ao incluir no esquema deste aviso prévio uma alínea intitulada Organizações da Juventude, o meu objectivo era realçar a importância da contribuição que estas organizações, e não só a Mocidade Portuguesa ou Mocidade Portuguesa Feminina, podem e devem dar à árdua missão dos educadores.

Nada substitui o poder de iniciativa dos jovens nem o interesse com que desejam pôr em prática as suas ideias.

Nada substitui o poder de penetração e de persuasão dos jovens nos seus próprios meios.