à ideia que o jovem de hoje faz de uma organização de juventude.

Salvo melhor opinião, creio que estamos a raciocinar mal, dominados, coagidos, por este estranho sentimento (que tem apenas algumas dezenas de anos na história da educação) e que a timidez e a vergonha do educador ante o educando. E estamos a raciocinar mal, porque a Mocidade Portuguesa, criada, como foi, por adultos para jovens, tinha, no entanto, as condições para ser uma perfeita organização de juventude, até no sentido em que a entendem os capazes de hoje. A sua estrutura hierárquica foi pensada para ser preenchida pelos próprios filiados logo que se distinguissem naturalmente e se aperfeiçoassem depois nos cursos de graduados.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Os adultos que a criaram iam cada vez mais ficando de fora e se no vértice da hierarquia está sempre um comissário, que não poderia ser um jovem de 18 anos, ainda nos bancos da escola, a verdade é que, inspirando e organizando as suas actividades, preenchendo os seus quadros de dirigente, podia e devia Circular o sangue novo dos rapazes que a organização ia formando Por isso a Mocidade Portuguesa era, em princípio, uma obra nacional, e não um serviço público, um ideal que se transmitia com um mínimo de aparato burocrático e um máximo de actividade e entusiasmo.

Vozes: -Muito bem!

A Oradora: - Os adultos hesitam Transigem com aquilo que supõem ser as aspirações da juventude de hoje.

Suponhamos que é esse o bom caminho Ponhamos, por agora entre parêntesis, neste caso particular, o intuito formativo inicial, a mística basilar da organização Admitamos que o educador pode realmente abdicar do direito de ser ele a defina as grandes linhas de condução dos jovens, para se deixar antes conduzir ao sabor das aspirações da juventude de hoje.

Mas que são, afinal, as aspirações da juventude de hoje?

Residências, cantinas, bolsas de estudo, fonas de graça?

Faço aos jovens deste tempo a justiça de crer que isso não lhes basta, e faço aos adultos responsáveis a justiça da acreditar que, acudindo a essas necessidades, eles sabem estar a obedecer apenas a um dever de justiça social, a um imperativo de época, mas não estar a satisfazer uma aspiração profunda da alma juvenil.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Ninguém, decerto, pode considerar como objectivo primário numa campanha de educação da juventude a obtenção do bem-estar material.

Vozes: -Muito bem!

A Oradora: - Pelo contrário os sociólogos denunciam como uma das raízes mais profundas da crise de juventude que lavra por esse mundo ocidental o excesso de facilidades, o conforto, a transigência dos adultos e a satisfação de todos os caprichos dos novos.

Vozes: -Muito bem!

A Oradora: - Os bandos de jovens delinquentes, histéricos e amorais que inquietam a Europa e os Estados Unidos recrutam os seus membros em duas categorias extremas - os filhos do vício, da miséria e da inadaptação social e os filhos-família das classes mais abastadas.

E se entre nós a chamada crise da juventude não assumiu ainda as formas inquietantes que tem la fora, isso não se deve apenas à solidez das nossas estruturas morais, mas também à estreita mediania económica em que ainda vivemos.

Escusado é dizer que não dei e deduzir-se daqui ser eu inimiga do progresso material e partidária de uma política de educação que mantenha os estudantes na pobreza e no desconforto. Seria absurdo. E de nada valeria, aliás neste caso como noutros, tentar travar a marcha inevitável para o bem-estar e a promoção social.

O que quero dizer é primeiro, que ninguém deve iludir-se a ponto de supor que a juventude se cala e se aquieta logo que tiver livros do graça, residência com chauffage central e auto-serviços modelo, mesmo que esses sejam pontos fundamentais do seu programa de reivindicações, e, depois, que importa não esquecei uma verdade muito antiga e hoje um pouco foi a de moda - a de que o jovem precisa de uma certa dureza e simplicidade de hábitos para se formar escorreito e forte.

Vozes: - Muito bem!

O Oradora: -E voltamos à pergunta deixada em suspenso quais são, afinal, as aspirações da juventude de hoje?

Lembro a propósito um caso que pude seguir de perto Na redacção de uma revista juvenil portuguesa, das raras que ainda se Aguentam com esforço contra a maré que nos invade de publicações estrangeiras especializadas - e especializadas sobretudo na mediocridade, no mau gosto e na exploração das baixas tendências (mas, perdão, que por pouco não enveredava pelos caminhos já por mim repisados das queixas e dos protestos contra a má imprensa juvenil . . ) - , na redacção de uma revista portuguesa para raparigas, dizia eu, houve, há poucos, anos, um movimento de autocrítica entenderiam os que trabalhavam ali que a revista, já com muitos anos do vida, se desactualizara, deixara de corresponder aos anseios do público juvenil a que se dirigia. Renovou-se a revista Arejou-se o melhorou-se a parte gráfica, e aí tudo correu pelo melhor, quanto ao texto, cortou-se pelos artigos de formação moral e de informação cultural . Abriram-se novas secções, mais fúteis e ligeiras, de decoração, de modas, de actualidades

Pois bem Passados meses, fez-se um inquérito entre ns jovens leitoras sobre o que desejai iam ler na sua revista. E - com surpresa e desorientação dos redactores - as jovens leitoras, quase sem excepção, pediam mais cultura e mais formação moral.

É que os adultos hesitam. E hesitam às vezes porque têm preconceitos errados sobre as aspirações da juventude de hoje.

Vozes: -Muito bem!

A Oradora: - Mas um pouco mais de atenção às palavras e até aos gestos dessa juventude talvez ajudasse a desfazer os esquemas estereotipados por que nos habituámos a pautá-la.

A juventude em crise que se agita por esse mundo não se revolta hoje tanto em nome da liberdade, nem do progresso, nem da justiça social (isso era o estilo de há 100 ou 50 anos), mas em nome da uma coisa vaga, que toma formas diversas e bastardas, mas que se encobre sob o mesmo rótulo, um rótulo que é uma palavra-